O Homem Baile

De volta ao clube

Independente outra vez, Dead Fish mostra a força do novo álbum no Festival Dosol; Confronto também se destaca e performance do AK-47 chama a atenção. Fotos Divulgação Dosol: Diego Marcel (1) e Rafael Passos (2, 3, 4, 5 e 6).

O vocalista Rodrigo Lima solta a voz à frente do Dead Fish, num dos melhores shows do Dosol 2015

O vocalista Rodrigo Lima solta a voz à frente do Dead Fish, num dos melhores shows do Dosol 2015

Os produtores do Festival Dosol fizeram de tudo para que o domingo fosse o mais diversificado dos dias nessa edição de 2015. Criaram meia dezena de palcos paralelos, chamaram trocentas bandas, mantiveram o preço acessível, marcaram o início para bem cedo e por aí vai. Só que o público que foi à Rua Chile, na Ribeira, em Natal, tinha hora marcada e endereço certo: o Palco Petrobras, 21h30. Foi ali que o Dead Fish mandou um dos melhores shows do festival, numa relação quase íntima com uma plateia das mais inquietas e disposta a tudo para participar. O que se desdobra em trânsito frenético do piso para o palco e do palco para o aquele vôo sobre a massa que só um show de hardcore pode proporcionar.

Quando um bem asseado Rodrigo Lima surge no paco trajando uma camisa florida de turista – afinal estamos em Natal -, como se fosse um personagem de filme praiano, não parece que o bicho vai pegar na próxima hora. O vocalista, único remanescente da formação original do grupo capixaba, é quem costura o bem-estar possível com os intensos moshs da plateia. Isso porque não basta subir no palco e pular no meio do povão, há quem queira cantar, abraçar, sarrar(!), dançar agarradinho… E Rodrigo se sai bem, com habilidade e simpatia, em todas as ocasiões, ainda por cima ouvindo o sempre incomum grito de guerra dos fãs amados que diz mais ou menos assim: “Ei! Dead Fish! Vai tomar no cu!”, numa cruel piada interna alastrada em todo o lugar que o grupo toca.

O guitarrista do trio sueco The Fume sola em uma das músicas no bom show do Festival Dosol

O guitarrista do trio sueco The Fume sola em uma das músicas no bom show do Festival Dosol

O show é o de lançamento do novo álbum da banda, “Vitória”, lançado este ano, que marca uma nova fase, novamente livre de gravadoras. E que começou muito bem, com o grupo batendo recorde de velocidade para atingir a meta em um processo de crowdfunding para bancar a gravação. São seis as músicas novas inseridas no show. A que mais chama a atenção é “Sem Sinal”, um rock dos bons, distante do hardcore da banda e com um colante sotaque pop, sem abrir mão de linhas de guitarra melodiosas. “Jogojogo”, que abre a noite, é outra grande composição para ficar na cabeça da gente, mesmo com o som anda sofrendo ajustes finais. Contrapontos interessantes, “Vitória”, que fala da cidade onde a banda nasceu, e a porrada “’Selfegofactóide” (grande sacada) têm maior aceitação ante ao público, ao que parece, já conhecedor do material mais novo.

Não é preciso ser fã de hardcore, tampouco conhecedor profundo das músicas: um show do Dead Fish é diversão garantida. Além da interação com os fãs, Rodrigo ainda canta aboletado sobre as costas do baixista Alyand, em “Queda Livre”, e não se espanta quando recebe um boné de um fã e vê uns dos integrantes da banda francesa Dot Legacy se acabar no mosh generalizado. A dobradinha final com “Afasia”/“Sonho Médio”, a cantoria de “Bem-vindo ao Clube” e “Mulheres Negras”, com Rodrigo se acabando no final, são ouros grandes momentos do show de uma banda necessária ao rock nacional. Só falta começar a bolar um set list maior para abranger mais fases da já longa carreira. Uma horinha só é muito pouco, pessoal.

Confronto em ação: grupo superou a concorrência dos palco paralelos no último show do festival

Confronto em ação: grupo superou a concorrência dos palco paralelos no último show do festival

Diferentemente de outras edições em que nomes como Exploited e Marky Ramone (relembre aqui, em 2009 e aqui, em 2010) foram atrações de destaque, dessa vez o Dosol trouxe bandas internacionais, sim, mas pouco conhecidas. Além do português Ermo, que tocou no sábado, o domingo teve o francês Dot Legacy e o sueco The Fume. Se saiu melhor a primeira, no Palco Dosol, mais pela performance de palco do que som meio amalucado. Seja nos efeitos do baixo de seis cordas do vocalista Damien Quintard, na webcam presa na cabeça do guitarrista John Defontsine ou nos saltos do tecladista Arnaud Merckling, espécie de sósia de Dee Snider, do Twisted Sister. O show acaba os dois últimos subindo perigosamente nas caixas de som na lateral do palco. Já o trio The Fume mantém a tradição do bom rock sueco (The Hives mode on) e se mostra bem mais acessível, pop até. O guitarrista/vocalista Lil’ Phil canta bem, tem boa presença de palco e se arrisca em bons solos, com exata dose de virtuose. No fim das contas, contudo, as duas devem cair no rol das bandas esquecíveis dos nossos tempos. Ou não?

O que obviamente não é o caso do Confronto, que sofreu um bocado com a simultaneidade dos shows desse ano. Tanto que a coisa só começou a ficar boa no Palco Cabo Telecom depois que Dead Fish e Girlie Hell terminaram suas respectivas apresentações. O vocalista Felipe Chehuan tratou de tirar o proveito possível: “Esse é o último show do festival, então vamos terminar bonito!”. E foi o que aconteceu quando “Santuário das Almas” arrematou a noite, com as participações dos vocalistas Paulo Seqüela e Felipe Gembroso, das bandas locais I.T.E.P. e Psicomancia, respectivamente. Antes, as músicas em que o público mais agitou foram “Meu Inferno” e “1 Hora”, sendo que o quarteto manteve a boa vibe, mesmo tocando em condições bem adversas.

Performance: o 'monstro' que sai de dentro de uma betoneira direto para o palco, no show do AK-47

Performance: o 'monstro' que sai de dentro de uma betoneira direto para o palco, no show do AK-47

Um sujeito com um corpanzil daqueles surge de dentro de uma betoneira praticamente sem roupa, com máscara e de salto alto, no meio da rua, e vai direto para a abertura do Palco Petrobras. É assim que começa o show do AK-47. O grupo, que de certa forma, pouco tem a ver com o vocalista Juão Nin, já que a música mistura metal e hard rock pesado na maior parte do tempo. Mas letras cantadas em bom português aproximam um lado do outro e a coisa funciona muito bem. Azar de quem não chegou cedo para ver essa pérola do cancioneiro rock’n’roll de Natal. De Mossoró, interior do Rio Grande do Norte, o trio thrash metal Monster Coyote fez um ótimo show no Palco Dosol, tocando só clássicos. O grupo, de formação enxuta, tem uma boa pegada, músicas com bons riffs e peso a dar com o pau. Mais tarde, eles ainda iriam tocar a íntegra do disco novo, “Neckbreaker”, no Palco Estúdio Petrobras, aquele simpático container montado no meio da rua.

Chamou a atenção o bom punk rock do Water Rats, de Curitiba, no Palco Petrobras, não só por ter o baterista Renê Bernuncia, do lendário Boi Mamão, ou pelo figurino nada a ver do baixista Bi Coveiro. Mas pelas vocalizações da dupla de guitarristas Alex Capilé e Pedro Gripe, e pelo quarteto mandar um punk rock, digamos de raiz, identificado com o punk 77 britânico. Eles já tinham tocado na véspera no container e mostraram certa intimidade com o publico, até na hora das “cirandas punk”. No final, uma referência à fase reggae do Clash rolou, numa boa performance como um todo. Ainda mais cedo, o mesmo palco viu o Lost In Hate, de Brasília, fazer um show movimentado, com o vocalista Rodrigo Gama descendo no meio da plateia o tempo todo. O grupo, calcado no hardcore nova-iorquino, transita bem pelo post hardcore e tem musicas realmente furiosas. Com quase 10 anos das costas, merecia uma posição melhor na programação. Ou, quem sabe, uma promoção para 2016.

De Mossoró, o trio Monster Coyote apavorou com músicas ultrapesadas, em dois shows no mesmo dia

De Mossoró, o trio Monster Coyote apavorou com músicas ultrapesadas, em dois shows no mesmo dia

Set list completo Dead Fish:

1- Jogojogo
2- Não
3- Zero e Um
4- Venceremos
5- Noss Sommes Les Paraibe
6- Sem Sinal
7- Bem-vindo ao Clube
8- Selfegofactóide
9- Revólver
10- Mulheres Negras
11- Autonomia
12- Destruir Tudo
13- Tão Iguais
14- Você
15- 912 Passos
16- Molotov
17- Queda Livre
18- Asfalto
19- Vitória
20- Afasia
21- Sonho Médio

Mais Festival Dosol:

Os shows da sexta, dia 6/11

Os shows de sábado, dia 7/11

Punk rock de raiz: o baterista Renê Bernuncia e o guitarrista/vocalista Alex Capilé, do Water Rats

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