O Homem Baile

Três não é demais

Sem material inédito, Metallica volta ao Rock In Rio pela terceira vez seguida e segue mostrando renovação intramuros a custa de um repertório raro, farto e repleto de possibilidades. Fotos: Glaucio Burle/Estácio/Divulgação Rock In Rio.

O sorridente James Hetfield faz pose para os fotógrafos no início do show do Metallica no Rock In Rio

O sorridente James Hetfield faz pose para os fotógrafos no início do show do Metallica no Rock In Rio

Na alta madrugada de sábado para domingo em uma região ainda erma em que pousa a Cidade do Rock, um música dispara uma avalanche de emoções que contagia cada poro das 85 mil pessoas que persistem depois de mais ou menos umas 12 horas de música e outras estripulias. Não daquela música feita pra tocar no rádio, de vocação simplória e imbecilizante. Mas de puro, bom e alto heavy metal em várias de suas subcorrentes. A tal canção, contudo, é praticamente de domínio público, em um país igualmente ermo justamente na universalidade cultural na qual o tal metal é rei. Assim, nem o mais cansados dos corpos resiste a “Enter Sandman”, tocada no talo – o som mais alto do festival – no espetacular desfecho do show do Metallica. Sim, de novo.

Sem lançar quase nada de novo desde 2008 (“Death Magnetic”), o quarteto segue na estrada inventando moda com o que tem nas mãos. E, no caso, é muita coisa. Na terceira vez seguida no Rock In Rio carioca (veja como foi em 2011 e 2013), por exemplo, quatro das 18 músicas apresentadas não haviam sido tocadas por aqui. Pela ordem: “King Nothing”, da polêmica fase “Load”/”Reload”, reinserida no repertório este ano; a chata, mais eficiente “The Unforgiven”; “Turn the Page”, cover de Bob Seger; e “The Frayed Ends of Sanity”, que também volta a ganhar espaço em 2015. Ao mesmo tempo, uma mexida no formato do set list (um achado da banda, repita-se), que inclui a troca de “Seek & Destroy” pelo final com “Enter Sandman” já citado não deixa que tudo pareça um reles refogado com as sobras do almoço pra matar a fome da madrugada.

Combustível: o eficiente baixista Robert Trujillo interage com o guitarrista James Hetfield

Combustível: o eficiente baixista Robert Trujillo interage com o guitarrista James Hetfield

No palco, também, mudanças. A principal delas é a instalação, na parte de trás, de uma arquibancada que recebe integrantes selecionados de fã clubes que assistem ao show ali mesmo, a dois passos do paraíso. Fato que reforça que o Metallica é uma das bandas mais conectadas com seu público, revelando que o lamentável “episódio Napster” serviu de grandioso aprendizado. Assim, com a bateria de Lars Ulrich praticamente no mesmo nível, saem do palco as escadas, os sobe e desce e o foco nos músicos. No lugar, os telões – os maiores e de melhor resolução dos últimos tempos – recebem vídeos renovados, como os dos soldados sem rumo de “One” e as infinitas cruzes cravadas no solo de “Master Of Puppets”. Sim, as explosões, os raios laser, os jatos de chama movidos a querosene e as bolas lançadas ao público continuam lá.

A festa, contudo, quase é interrompida. Durante “Ride The Lightning”, a quinta e uma das mais contagiantes da noite, o som que saía das caixas cai, deixando a Cidade do Rock em silêncio. No palco e nos monitores de ouvido dos músicos, contudo, o som prossegue, causando a cena constrangedora de eles continuarem tocando sem saber do que estava acontecendo. O guitarrista Kirk Hammett ainda faz um número, e todos deixam o palco durante cerca de cinco minutos, o que resulta em vaias por parte do público. De volta após a solução do problema, a banda não se pronuncia sobre o assunto e o show transcorre normalmente até o final, com cerca de 2h20 de duração. Em nota oficial enviada à imprensa ainda durante a apresentação, a organização do Rock in Rio informa que o problema se deu “pela desconexão da linha de saída de som entre a mesa da banda e a do festival”.

Fôlego: o baixola Lars Ulrich segue mandando muito bem na bateria, depois de todos esses anos

Fôlego: o baixola Lars Ulrich segue mandando muito bem na bateria, depois de todos esses anos

Usando o colete objeto de desejo salpicado de patches de bandas clássicas da juventude, James Hetfield segue o roteiro com os questionamentos quase filosóficos, ainda mais em se tratando de um ícone do universo metálico. “Vocês estão conosco?”, “Vocês sentem isso?” e “Vocês querem peso?”, senha para o início da – de fato – ultrapesada “Sad But True”, são alguma do repertório. A Kirk Hammett cabe se desdobrar em solos sobre solos, e, a despeito de boa parte deles ter sido criada em épocas de maiores complexidades musicais, ele está ali para reproduzir tudo, timtim por timtim, rápido ser for rápido, pesado se for pesado, paulada se for paulada, ou tudo isso junto em uma só música. Há quem reclame do vigor do baixola Lars, mas é difícil apresentar uma música em que ele comprometa o andamento, depois de todos esses anos. O que, vamos e venhamos, não é fácil.

As melhores da noite são a devastadora “Battery”, um arraste distorcido sem dó; a estupenda “Master Of Puppets”; a recente “Cyanide” e seu poderoso riff tocado alto pra dedéu; e a já citada “Sad But True”, sempre arritmizadora dos corações maltratados dos headbangers, entre outras. No fundo, no fundo, a verdade é que, mesmo sem lançar um disco novo há sete anos, mesmo omitindo essa ou aquela música mais recente, mesmo sendo tratado como banda residente do Rock In Rio e mesmo (adicione aqui o seu porém ou reproduza a queixa do seu amigo virtual), o Metallica, na soma de repertório e performance, segue com uma das melhores bandas em cima de um palco de que se tem notícia. Palavra de que quem já viu uma dezena de vezes nos últimos 26 anos.

Novidade: banda de costas para o público, tocando para os sortudos em uma arquibancada no palco

Novidade: banda de costas para o público, tocando para os sortudos em uma arquibancada no palco

Set list completo:

1- Fuel
2- For Whom the Bell Tolls
3- Battery
4- King Nothing
5- Ride the Lightning
6- The Unforgiven
7- Cyanide
8- Wherever I May Roam
9- Sad But True
10- Turn the Page
11- The Frayed Ends of Sanity
12- One
13- Master of Puppets
14- Fade to Black
15- Seek & Destroy
Bis
16- Whiskey in the Jar
17- Nothing Else Matters
18- Enter Sandman

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Comentários enviados

Existem 2 comentários nesse texto.
  1. Frederico em setembro 20, 2015 às 12:31
    #1

    A competência de sempre… Faltou ‘Blackned’ e ‘Unforgiven II’, mas tá valendo.

  2. Fabio em setembro 21, 2015 às 11:37
    #2

    Rapaz, o Metallica num dia não tão bom, é bem melhor que quase tudo que tem por aí…
    Eu vi 5 shows dessa interminável tour do “Death Magnetic”, o show de 2015 foi o pior deles.

    Não gostei do set list desse show, também não gostei da galera no palco e dos lasers.
    Senti falta das labaredas e dos estouros. “One”/”Fuel” que costumam ter essas pirotecnias, não tiveram nada disso.

    Revendo pela TV, percebi que o show deu uma boa esfriada depois da queda do som. O que deve ter interferido também foi o set, que colocou algumas “lentas” tipo “Unforgiven”, “Turn the Page”…

    A coisa só pegou de novo lá pelo fim, com “Puppets”, “Seek”, e no final com “Sandman”.

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