O Homem Baile

Bem-acolhido

Com formação possível, Queen emplaca com Adam Lambert nos vocais e volta a encantar o público do Rock In Rio 30 anos depois. Fotos: Divulgação Rock In Rio.

Só alegria: o vocalista Adam Lambert e o guitarrista Brian May agitam logo no início do show do Queen

Só alegria: o vocalista Adam Lambert e o guitarrista Brian May agitam logo no início do show do Queen

O sujeito sentado num banco na plataforma que sai do palco e vara a multidão está visivelmente emocionado. Com um violão ele comanda aquela que era a única certeza da noite: a emoção em tocar uma música tão emblemática para a ocasião que, segundo ele, a canção pertence ao público. É o metódico Brian May, guitarrista do Queen, com os olhos marejados antes, durante e depois do coro de 85 mil pessoas para “Love Of My Life”. Ele quase não acredita que está revivendo um momento tão lindo como que aconteceu há 30 anos, bem ali do outro lado da rua. É a parte inicial do show de encerramento da primeira noite de um Rock In Rio contemporâneo, com um Queen ajudado por Adam Lambert, “um cara de sorte escolhido por ícones do rock”, nas palavras dele mesmo.

Se o Queen fosse uma one hit band carregada pelo sucesso que invadiu a publicidade oficial, a história já seria boa, mas repertório é o que não falta e nada menos que 23 músicas são tocadas com um impressionante vigor. E isso sem contar um duelo de bateria entre Taylor, 66, e o filhão Rufus, e um impressionante solo de May, 68, que ultrapassa os 10 minutos de pura técnica, apelo e alma, tudo isso durante aproximadamente as duas horas que dura a apresentação. O palco tem um telão em forma de círculo no fundo no estilo Pink Floyd (aguarde dezembro para ver David Gilmour usar um idêntico) que contribui com imagens ao vivo e só desliza ao inserir Freddie Mercury fazendo um desagradável dueto do além. Numa noite comemorativa e repleta de tributos, é ele, um dos maiores frontman de todos os tempos, o homenageado.

O performático Adam Lambert faz a ponte entre gerações separadas por mais de 30 anos

O performático adam Lambert faz a ponte entre gerações separadas por mais de 30 anos

Com esse discurso Brian May e Adam Lambert ganham o público e colocam um ponto final da eterna discussão “Queen sem Freddie Mercury não é Queen”. Nem precisava. Adam Lambert não cai no lugar comum de imitar Freddie. Poderia fazê-lo de várias maneiras, desde o figurino arrojado, até as danças consagradas em cada música, passando pelo jeito de segurar o mini pedestal do microfone. Esperto, apóia-se em sua própria performance, numa boa movimentação de palco, com carisma e approach que o posto merece. Ademais, com tatuagens, figurinos andróginos, unhas pintadas e afins, realça a uma larga diferença entre gerações, a dele para a de Brian May e Roger Taylor. Tem boa voz e sabe cantar como intérprete, não é um reles clone, muito embora ainda carregue os vícios do programa de calouros que o revelou, incluindo aí malabarismos vocais inúteis que nada contribuem com o espetáculo.

O repertório é mais ou menos o mesmo da turnê “Don’t Stop Them Now”, que já teve outros 68 shows ao redor do globo, e tem duas músicas a menos que o show de São Paulo, na última quarta (veja como foi), mas nada de causar maiores aborrecimentos. O início, contudo, soa um pouco frio, muito por causa do público, muito menos do tipo “die hard” e mais para turistas em uma tarde ensolarada. Era difícil até encontrar alguém vestindo uma camiseta de banda. Por isso, nas primeiras músicas são os efeitos cenográficos como jatos de fumaça, raios laser e até um sofazão roxo retrô para Lambert deitar e se abanar que atraem a plateia. No duro, ela reage a partir da ótima “Don’t Stop Me Now”, que serve de ponte para o blockbuster “I Want To Break Free”, e aí a Cidade do Rock vem abaixo.

O preciso Brian May e o baterista 'hipster' Roger Taylor: duplinha veterana segura a onda do Queen

O preciso Brian May e o baterista 'hipster' Roger Taylor: duplinha veterana segura a onda do Queen

Quando o assunto é hit, a performance do grupo supera a de 2008, com o veterano Paul Rodgers nos vocais (relembre). Com Lambert, a movimentação é maior e aerobicamente mais adaptada ao show em si. Antes de cair na reta final dos sucessos irremediáveis, um generoso Brian May dá um extraordinário up grade em “Ghost Town”, única música da carreira solo de Adam Lambert incluída na noite, para o frenesi dos fãs de boy bands espalhados no meio do público. Em “Radio Gaga”, uma das poucas músicas do universo que já vem com palmas instantâneas, Lambert desce no fosso para um tête-à-tête com o pessoal da grade. A outra é “We Will Rock You”, que abre o bis com o dom da imediata universalidade: quem é capaz de escapar da adesão?

Ressalva-se que, apesar de um show de grandes sucessos, a banda é enxutíssima, com um baixista oculto e Rufus Taylor na percussão, o que salienta ainda mais como a duplinha Roger/May segura a onda. Os dois ainda cantam em quase todas as músicas, reforçando o élan operístico das raízes do Queen. Os efeitos pré-gravados estão ali para todos verem, sem dublagem ou enganação semelhante, sobretudo na improvável “Bohemian Rhapsody”, que encerra a primeira parte do show. Se os fantasmas do rock jazem no Circo Voador, seguramente o de Freddie Mercury plana no palco do Rock In Rio é dá um like num momento desses. Daí o arremate com “We Are The Champions” fornecer ao pronome “nós” uma força metafisicamente extraordinária que só rock pode abrigar. Grande noite, grande noite.

Agito: lambert e May no centro das atenções do Palco Mundo na primeira noite do Rock In Rio

Agito: lambert e May no centro das atenções do Palco Mundo na primeira noite do Rock In Rio

Set list completo

1- One Vision
2- Stone Cold Crazy
3- Another One Bites the Dust
4- Fat Bottomed Girls
5- In the Lap of the Gods… Revisited
6- Seven Seas of Rhye
7- Killer Queen
8- Don’t Stop Me Now
9- I Want to Break Free
10- Somebody to Love
11- Love of My Life
12- It’s a Kind Of Magic
13- Duelo bateria
14- Under Pressure
15- Save Me
16- Ghost Town
17- Who Wants to Live Forever
18- Solo guitarra
19- The Show Must Go On
20- I Want It All
21- Radio Ga Ga
22- Crazy Little Thing Called Love
23- Bohemian Rhapsody
Bis
24- We Will Rock You
25- We Are the Champions

Lindeza: um dos maores ícones da guitarra no rock em todos os tempos, Brian May ainda se emociona

Lindeza: um dos maores ícones da guitarra no rock em todos os tempos, Brian May ainda se emociona

Tags desse texto: ,

Comentários enviados

Existem 4 comentários nesse texto.
  1. Lisiane Olsson em setembro 19, 2015 às 12:26
    #1

    Sensacional! Não estive lá, mas consegui ver este show entre as linhas desta matéria. Obrigada!

  2. Mal em setembro 20, 2015 às 13:52
    #2

    I translated your review–I watched the stream back in the states. I thought your review was fair and complete. Thank you for being open-minded. I saw Queen and Adam Lambert live in the US–the best concert I ever attended. Lambert was born to front Queen (after Freddie of course) and sing those iconic songs. He is one of the few who can. Those who still complain will always be stuck in the past. It is ok to love Freddie and also love Adam Lambert fronting Queen. Many of us want to hear this music performed live and this is our chance.

  3. Marcos Bragatto em setembro 21, 2015 às 10:34
    #3

    Thanks a lot, Mal. Did you post the review on the web? Could you send us the link?
    Thanks again.

  4. Fabio em setembro 21, 2015 às 11:54
    #4

    Também gostei bastante desse show.
    Tava meio com pé atras pelo Adam… mas me surpreendi. O garoto tem carisma.
    Quando vi o show na Arena, tinha gostado muito da performance do Paul, que já conhecia do Free, BadCo…
    Mas esse show do RIR foi melhor.

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado