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De volta ao Rio, Slash mostra novo repertório, consolida banda solo e revive grandes momentos do Guns N’Roses. Fotos: Luciano Oliveira.

Slash empunha a guitarra em sua posição mais característica, no primeiro show dessa turnê pelo Brasil

Slash empunha a guitarra em sua posição mais característica, no primeiro show dessa turnê pelo Brasil

Parece replay, mas não é. Pouco mais de dois anos depois de uma arrasadora apresentação (veja como foi), Slash e sua banda, a Myles Kennedy & The Conspirators, doravante chamada apena de Slash, voltam a lotar a Fundição Progresso, no Rio, para uma noite daquelas de se anotar no caderninho. Não é repeteco porque a) O grupo está com um novo álbum na praça, e dele saem sete das 17 (!) músicas do repertório; b) A banda segue sem alterações de lá para cá, e está, depois de mais de 200 shows, redondaça; c) Slash, além de compositor de mão cheia, está mais guitarrista que nunca, debulhando a guitarra em intervenções inspiradíssimas; e d) A interação com o público é tão grande que um bônus só para os cariocas é reservado para o final. Foi a primeira de seis apresentações do grupo pelo Brasil (saiba mais).

Como se fosse possível, até Myles Kennedy melhorou. O vocalista, um verdadeiro achado – repita-se – como compositor e intérprete do cancioneiro de Slash em todas as suas andanças, está com a cabeça e a voz no lugar e cada vez mais descobre o meio termo entre cantar e gritar exageradamente. Suas duas provas de fogo na noite são “Double Talkin’ Jive” e “You Could Be Mine”, ambas do Guns N’Roses, inseridas nessa turnê. Na primeira, pela velocidade de locutor de corrida de cavalos, passa bem, e, na segunda, no trecho mais puxado, precisa poupar os agudos para não perder a rítmica, mas nada que comprometa. É um dos pontos altos do show, dividindo o pódio, no quesito Guns, com “Sweet Child O’Mine”, provavelmente a mais bela canção já escrita, arranjada e executada nesse mundão do rock’n’roll, e que emociona até a cônjuge mal humorada que acompanha o guitarrista empolgado no salão.

Feitos uma para o outro: Myles Kennedy, excelente cantor e intérprete é um achado para a banda de Slash

Feitos uma para o outro: Myles Kennedy, excelente cantor e intérprete é um achado para a banda de Slash

Porque diferentemente do Guns N’Roses de Axl – e a comparação soa inevitável – Slash tem material novo para mostrar e consolida hits de seus discos anteriores. Por isso “You’re a Lie” enlouquece o público não só porque abre os trabalhos, mas é hit nato que vai ser tocado para todo o sempre em um show do Slash. Assim como “Anastasia”, reconhecida nos primeiros acordes, quase no final do show. Quem lota a Fundição não está de bobeira e sabe que Slash tem sete discos lançado fora do Guns contra um do Guns N’Roses de Axl. Por isso músicas do disco novo como “The Dissident”, com bela introdução de guitarra, repetida no meio antes de um solo espetacular, e “Beneath the Savage Sun”, com poderoso riff, se saem tão bem ao vivo. Ambas caem sobre o público em forma de um cantarolar cúmplice do rock propriamente dito. Em “Wicked Stone”, é a guitarra grooveada que Slash tanto usou no Guns o destaque, além de outro solo grudento.

A coisa anda tão boa que até quando Kennedy precisar beber uma água nos bastidores, o baixista Todd Kerns assume os vocais e manda muito bem em duas músicas, incluindo excelente versão “Welcome to the Jungle”, desta feita com uma variação vocal ampliada em relação à versão de 2012. Myles Kennedy também descansa bem no meio de “Rocket Queen”, quando Slash lidera uma jam com um solo excepcional. Sim, já fora assim da última vez, mas a evolução imposta agora parece superar tempos idos. O número se divide em no mínimo quatro partes, com Slash percorrendo o braço da guitarra de cima para baixo até atravessar o corpo inteiro, em busca de acorde após acorde, num delírio, no mínimo, encantador; não soa chato nem técnico demais como acontece por aí. No retorno à música, ao menos duas cordas da guitarra vão para o espaço, como num espasmo final. Se fosse um golaço numa partida de futebol, o narrador mandaria sair do estádio e comprar o ingresso de novo.

O baixista Todd Kerns, que também se sai bem como vocalista, agita ao lado do titular Myles Kennedy

O baixista Todd Kerns, que também se sai bem como vocalista, agita ao lado do titular Myles Kennedy

Uma pena que o público, emburrecido pela tecnologia, prefere manipular aparelhos de qualidade duvidosa em vez de acompanhar tudo em tempo real. Na já citada “Anastasia”, talvez para que a guitarra mais usada sofra reparos, Slash reaparece com um modelo double neck verde e, sem firulas, toca nos dois braços. Se a imagem lembra um certo Jimmy Page, no bis vem o bônus citado lá em cima. Anunciada como “música extra” pelo próprio Slash, o grupo manda “Communication Breakdown”, do Led Zeppelin, e Myles Kennedy se converte em um inesperado Robert Plant afiadíssimo. A cover não era apresentada, segundo consta, há uns cinco anos. Antes, a lembrança do Velvet Revolver, com o blockbuster “Slither”. Esperado mesmo é o final, com papel picado jorrando para cima ao som de “Paradise City”. Encerramento óbvio, mas eficaz, que já disputa com o “Rock And Roll All Nite”, do Kiss, como o momento mais feliz de um final de show de rock. Vai, Slash. Voa solto com essa guitarra em punho.

Set list completo:

1- You’re a Lie
2- Nightrain
3- Avalon
4- Ghost
5- Back from Cali
6- Wicked Stone
7- 30 Years to Life
8- Double Talkin’ Jive
9- You Could Be Mine
10- Doctor Alibi
11- Welcome to the Jungle
12- The Dissident
13- Beneath the Savage Sun
14- Rocket Queen
15- Battleground
16- World on Fire
17- Anastasia
19- Sweet Child O’ Mine
19- Slither
Bis
20- Comunication Breakdown
21- Paradise City

O simpático Myles Kennedy, que interage com a plateia o tempo todo, expressa satisfação com o show

O simpático Myles Kennedy, que interage com a plateia o tempo todo, expressa satisfação com o show

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Comentários enviados

Existem 3 comentários nesse texto.
  1. Salomão Rodrigues em março 15, 2015 às 12:39
    #1

    Slash é o cara! Resenha foda!

  2. Patrícia em março 18, 2015 às 10:32
    #2

    Um grande agradecimento ao autor desta resenha, já me fez ganhar o dia! Eu estive lá, sim, e acompanhei tudo em tempo real, sim! Foi demais!
    Mas andava até meio tristinha porque “todo o mundo” tinha fotos dele (ok, e dos outros também), só que eu não levei máquina fotográfica nem celular (estou de passagem pelo Rio e tive receio, sabe como é, Lapa tarde da noite, fui sozinha e por isso nem um amigo para tirar uma foto minha lá…)
    Agora, sabem o que mais? Depois de ler este artigo eu sei que os outros podem até ficar com umas fotos lindas de recordação, mas eu vibrei com um concerto memorável do início ao fim, sem perder nem um segundo olhando o palco através de uma telinha minúscula ou twitando “estou aqui” com os amigos que não estavam lá…
    Foi como nos bons velhos tempos da minha adolescência, em que nem ainda havia foto digital ou celular (sim, eu já sou fã de Slash há + de 20 anos…), e os concertos eram vistos e ouvidos a 100%, e as únicas recordações eram o ingresso e talvez uma T-shirt ou bandana comprados no local. Senti-me adolescente de novo. Acho que vou repetir!

  3. Dinho em março 22, 2015 às 12:14
    #3

    Parabéns pela resenha! Foi no mesmo sentimento que me ocorreu! A pegada da banda está demais! Todos evoluíram desde a ultima turnê! Sensacional! Vi em Curitiba!

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