O Homem Baile

Universo paralelo

Em show de lançamento de novo EP, Capital Inicial derrapa no repertório mal ajambrado e termina como banda de animação de baile. Foto: Divulgação/Site oficial.

capitalinicialEra para ser uma noite fantástica e no início parecia que ia ser, mas o Capital Inicial fez tudo o que podia – e muito mais que isso – para estragar o show de lançamento do EP “Viva a Revolução”, distribuído gratuitamente na entrada. Isso porque, da metade para o final do show, neste sábado, no Citibank Hall, no Rio, o grupo abriu mão de tocar um repertório próprio cheio de boas (e conhecidas) músicas para cair na esparrela do cover, incluindo Raimundos e uma terrível versão acústica de “Otherside”, do Red Hot Chili Peppers, que encerrou a noite em clima de apresentação de barzinho. Com uma carreira de mais de 30 anos e muitos hits radiofônicos - convenhamos - o Capital pode muito mais que isso.

Do EP “Viva a Revolução”, com seis músicas, três são tocadas, e a faixa-título, inspirada nos movimentos de junho de 2013, não entrega o que promete: falta-lhe peso e contundência. Nesse quesito, o Titãs foi bem melhor com “Fardado”, mas o Capital não é o Titãs e a origem punk/pós punk parece esquecida em um passado irrecuperável. Mesmo quando canta músicas da época como “Veraneio Vascaína” falta ao grupo a verdade conservada por contemporâneos como Ratos de Porão ou Plebe Rude, só para citar dois. As outras duas músicas novas são a boa “Tarde Demais”, que guarda algum peso e a balada do mal “Melhor Que Ontem”, essa já cantada por uma plateia na maior parte do tempo com as letras decoradas de cor e salteado. Muito pouco em um show de lançamento numa época em que artistas do mesmo porte que o Capital tocam a íntegra (ou quase) de discos recém-lançados.

Não é essa economia em ralação ao novo, no entanto, que estraga o show. O que pega é que o grupo abre mão do bom repertório próprio para tocar covers, mesmo considerando que o embrião da Legião e do próprio Capital está ali no palco, na figura do baixista Flavio e do baterista Fê Lemos. Ora, sabe-se que o Capital Inicial foi salvo (é Dinho quem diz) pela entrada do guitarrista Yves Passarel (ex-Viper, em 2002) e, sobretudo, pelo poder de composição pop de Alvin L, revelado no Rapazes de Vida Fácil e no Sex Beatles, intensificado a partir do álbum “Gigante” (2004) para cá. Ora, só desse disco e do seguinte de inéditas, o bom “Eu Nunca Disse Adeus” (2007), já dá para tirar um show completo, e isso sem falar nos recentes “Das Kapital” (2010) e “Saturno” (2012), quem tem boas músicas, ou da sempre eficaz ancestralidade oitentista.

Ocorre que o Capital Inicial parece viver dentro de uma lógica específica, um universo paralelo no qual ignora seu próprio trabalho a custa de atender a uma demanda de fãs que, de seu lado, não são fãs da carreira da banda, mas do entorno midiático que a sustenta. Fã de banda de rock quer disco novo com músicas novas e quer ver como essas músicas novas são tocadas ao vivo, nos shows. Os do Capital, não. Se embalam com os covers que subtraem da banda toda a personalidade que ela apresenta – ressalte-se – lançando bons discos frequentemente. Por isso todos se divertem e acham “demais” pular ao sim de “Mulher de Fases”, na versão bizarra para uma música do RHCP ou na resposta descerebrada ao hino “Que País é Esse”, da Legião Urbana, algo duramente constrangedor. Está posto, então, o círculo vicioso que precisa ser rompido.

Ademais, o repertório é ainda mal ajambrado. Imaginem que o bis, que deveria arrematar o show com um mínimo de animação, vira espécie de sarau universitário. À exceção de “Como Devia Estar”, o bloco é totalmente sem pressão. As melhores partes, nas duas horas e 15 cronometradas com satisfação por Dinho, estão na primeira metade do show, com “Quatro Vezes Você”, a primeira a levantar o público; em “Independência”, que ganha peso extra e boa omissão dos teclados; e “Depois da Meia noite”, que inaugura oficialmente a cantoria coletiva sem fim. Na boa “Eu Nunca Disse Adeus”, o caricato, mas eficiente Dinho chega a se emocionar com a interação com a plateia, e a dobradinha “Natasha”/“A Sua Maneira”, espremida entre uma tonelada de blockbusters e o bis de baixo impacto, incluindo a sempre bem-vinda “Fátima”, fornece o último suspiro de rock dos bons à noite. É uma pena que entre as bandas remanescentes dos anos 80 o Capital, justamente a que mais renovou o público, seja a mais desorientada. Uma pena mesmo.

Na abertura o Stellabella aproveitou para lançar o “Rock in der Vene!” (saiba mais), mas acabou fazendo um show morno para o público que ainda chegava para o show do Capital. O trio custou a sacar a receptividade da plateia e no início o som - abafado - pouco ajudou, tanto que foi só o guitarrista/vocalista André Stella erguer a guitarra e agitar um pouco mais para a resposta aparecer em palmas e gritos. No final, ele acabou nos braços do povo, se jogando do palco para a grade. O público – é óbvio, mas não custa reforçar – se divertiu com as músicas mais pesadas, como na derradeira “O Que Eu Quiser”, verdadeira ode à liberdade juvenil. Fez cantar ainda a boa versão de “Vambora”, de Adriana Calcanhoto, mas aí não conta, né pessoal? Mais música própria e menos repetição, por favor!

Set list completo Capital Inicial

1- Respirar Você
2- Quatro Vezes Você
3- Independência
4- Viva a Revolução
5- Depois da Meia Noite
6- Eu Nunca Disse Adeus
7- Tarde Demais
8- Como se Sente
9- O Bem, o Mal e o Indiferente
10- O Cristo Redentor
11- Algum dia
12- Melhor do Que Ontem
13- Olhos Vermelhos
14- Música Urbana
15- Veraneio Vascaína
16- Geração Coca-Cola
17- Que País é Esse?
18- Fátima
19- Mulher de Fases
20- Natasha
21- A Sua Maneira
Bis
22- O Lado Escuro da Lua
23- Fogo
24- Não Olhe Pra Trás
25- Belos e Malditos
26- Como Devia Estar
27- Primeiros Erros
28- Otherside

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Comentários enviados

Existem 4 comentários nesse texto.
  1. Rafael Moreira em setembro 28, 2014 às 13:45
    #1

    Cara, admiro muito seu trabalho mas esse artigo foi muito ruim. Pouco embasamento. Não pode falar assim de uma banda que permanece na ativa (leia-se fazendo shows e lançando inéditas) com 30 anos de estrada. Não se pode julgar um trabalho por causa de uma noite. Assim como não vou julgar seu trabalho por um artigo ruim. Continuo apreciando esse site. Vida longa ao rock!

  2. Marcos Bragatto em setembro 28, 2014 às 15:06
    #2

    Pode ser ruim, mas embasamento tem. E muito. Abraço e obrigado!

  3. Alexandre em setembro 28, 2014 às 20:31
    #3

    Concordo com a análise crítica sobre o Capital, Achei esse EP fraco. Esperava pelo menos que eles mantivessem a linha do ‘Saturno’, último álbum. A música que eu tava esperando que fosse boa desse EP, “Viva a Revolução”, era justamente a faixa título e mesmo assim não ficou boa. Concordo integralmente com sua análise sobre o repertório do Capital. Quem é fã da banda, sabe que os caras tem ótimas músicas dos anos 80 que ficaram esquecidas e que poderiam ser tocadas nessa turnê do ‘Saturno’.

    PS: Belos e Malditos rolou mesmo? Desculpe a minha pergunta tola (porque tá escrita aí no final do texto), é que é a primeira vez que vejo o Capital resgatar uma música esquecida dos anos 80 e era uma das queria que tivessem resgatado… hehe

  4. Rafael Moreira em outubro 1, 2014 às 13:23
    #4

    Cara, rolou mesmo “Belos e Malditos”, essa eu nunca vi ao vivo, ela ficou fora do set final do acústico. Era pelo menos pra ter entrado na turnê daquela época.

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