O Homem Baile

Tradição e renovação

Fates Warning e Swallow the Sun mostram passado, presente e futuro em diferentes vertentes do heavy metal no Overload Music Fest. Fotos: Daniel Croce.

Ray Alder solta a voz para aplacar a saudade dos mais antigos de John Arch, que deixou o posto em 1987

Ray Alder solta a voz para aplacar a saudade dos mais antigos de John Arch, que deixou o posto em 1987

A escolha para o desfecho do bis com a música “Still Remains” não chegou a ser um golaço dos caras do Fates Warning. Explica-se que trata-se de uma peça do prog metal de encher os olhos, mas ontem, ante a um público mirrado no Teatro Rival, no Rio, a coisa não funcionou muito bem, convertendo a boa apresentação em uma despedida um tanto melancólica. Era a segunda noite da edição carioca do Overload Music Fest (veja como foi a primeira), com uma programação menos post rock e mais metal, que teve a abertura do grupo finlandês Swallow The Sun. O fraco comparecimento da plateia expõe como o Fates Warning se apequenou nos últimos anos, com muitos intervalos sem lançar material inédito seguidamente. Uma pena.

Fato que, em princípio, pouco parecia importar para aqueles que, sim, foram ao Rival ver o grupo na primeira passagem pelo Rio em tantos anos; dá para acreditar? O início, com a boa “One Thousand Fires”, uma das três do álbum mais recente, “Darkness in a Different Light”, que saiu em 2013, levanta a plateia de cara, como aquele encontro sonhado e por fim realizado. “Vamos tocar tudo o que pudermos de cada álbum”, avisa o vocalista Ray Alder (foto), ostentando um bigodão de filme de faroeste (barba também, mas discreta). Há inda os órfãos de John Arch, que deixou o posto no longínquo ano de 1987, mas não há o que reclamar da boa performance de Alder, incluindo o gogó afinado e a interação com os fãs, quase um petit comité que se estenderia, inclusive, nos bastidores.

O guitarrista Jim Matheos agita no palco, com o baixista Joey Vera e o batera Bobby Jarzombek ao fundo

O guitarrista Jim Matheos agita no palco, com o baixista Joey Vera e o batera Bobby Jarzombek ao fundo

Há, também, os que sonham com o grupo tocando a íntegra do álbum “A Pleasant Shade of Gray”, disco tipicamente progressivo de faixa única que cede quatro das 12 partes ao show, sendo a “Part V” a que é melhor recebida. Ao fundo, é impossível não notar a pegada precisa de Bobby Jarzombek, que já tocou com Deus e o mundo e circulou pelo Brasil com a turnê de Rob Halford que passou pelo Rock In Rio de 2001, e com Sebastian Bach em 2005 (veja como foi). Aniversariante da véspera, o batera dá uma nuance mais pesada e diferenciada ao show do Fates, mas fica devendo um solo – exercício obrigatório no prog metal -, ainda mais em um set de hora e meia.

Entre as novas, “Firefly”, com ênfase no peso e repleto de guitarras melódicas, é a que mais cativa um público, ao que parece, mais interessado nos sons “das antigas”; e nada dos quatro primeiros discos foi resgatado para esse show. Ao vivo, Jim Matheos e Michael Abdow enfileiram duelos de guitarra de despertar o menos animado dos fãs, numa das melhores músicas da noite. “Precisamos voltar mais vezes ao Rio”, disse o generoso Alder, antes de a música começar. Outras músicas que ficam muito bem ao vivo são “Pieces Of Me”, bem porrada, com espécie de riff guia que permeia toda a canção; “Point Of View”, com mais exibição explícita de guitarras associadas ao bom gosto; e “The Eleventh Hour”, que até desencadeou um corinho junto ao público. No fim das contas, um bom show de uma banda muito esperada no Rio, que teria sido melhor se realizado sob outras circunstâncias e se mais músicas bem do início tivessem sido tocadas.

A pegada precisa de Bobby Jarzombek, que já tocou Rob Halford e com Sebastian Bach, entre outros

A pegada precisa de Bobby Jarzombek, que já tocou Rob Halford e com Sebastian Bach, entre outros

Na abertura, o Swallow The Sun fez um bom papel, em que pese a casa quase vazia. Sem se importar muito com isso, o grupo soltou as guitarras pesadas e distorcidas – são duas – associadas a um teclado cuja função é mostrar o lado sombrio da alma. Sim, porque o sexteto faz um doom metal de alto teor depressivo, com forte inspiração no pós punk inglês, só que com um peso monumental. Ou, por outra, alternando momentos mais calmos, atmosféricos, com outros extremos. E aí sobressai a versatilidade do vocalista Mikko Kotamäki, rodado na cena finlandesa, com um visual de vocal de banda de hardcore de Nova York. Por vezes, parece sussurrar como Ian Curtis; noutras, solta o vocal rasgado das profundezas do inferno, identificado duplamente com o metal extremos e com o Fields Of The Nephilim. Tá bom pra você?

A citação a Ian Curtis não é ao acaso. Em “Night Will Forgive Us”, por exemplo, a alternância entre climas introspectivos à Joy Division e esporrentos é latente. Gela a alma de um lado e faz explodir para fora do corpo os demônios intrínsecos ao Mal que reside em cada um. Em “The Giant” é o drama que se salienta, bem antes de o instrumental descambar para a agressividade, sempre, contudo, num limiar sensível cujo alvo é difícil de acertar; e o próprio sexteto se perde em algumas passagens durante o show. Mas a evolução de guitarras em contraponto ao teclado de cabeça baixa dessa música é emblemático do som da banda. No frigir dos ovos, em uma horinha só e oito músicas, percebe-se que estamos diante de algo realmente renovador nos indigestos intestinos da música extrema. É para ficar de olho no Swallow The Sun.

Swallow The Sun em ação: doom metal de alto teor depressivo, com forte inspiração no pós punk

Swallow The Sun em ação: doom metal de alto teor depressivo, com forte inspiração no pós punk

Set list completo Fates Warning

1- One Thousand Fires
2- One
3- Life in Still Water
4- A Pleasant Shade of Gray, Part III
5- A Pleasant Shade of Gray, Part V
6- A Pleasant Shade of Gray, Part VI
7- Pieces of Me
8- I Am
9- The Eleventh Hour
10- Point of View
11- Firefly
12- Through Different Eyes
13- Another Perfect Day
14- A Pleasant Shade of Gray, Part XI
15- Monument
Bis
16- Jam instrumental
17- Still Remains

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