O Homem Baile

Cara e coragem

Titãs mantém estrutura que enfatiza músicas novas, CJ Ramone mostra repertório próprio e Raimundos tem desfecho consagrador no Porão do Rock. Fotos: Divulgação Porão do Rock.

Paulo Miklos e Branco Mello: sem medo de mostrar o repertório novo, mesmo em um festival diversificado

Paulo Miklos e Branco Mello: sem medo de mostrar o repertório novo, mesmo em um festival diversificado

Em um festival como o Porão do Rock, em que se salienta o apelo da vários artistas para seduzir a plateia de grandes proporções tocando ao menos um cover, chama a atenção a entrada de cinco mascarados tocando músicas praticamente inéditas. Os menos antenados conferiam o horário da programação e duvidavam que eram realmente os Titãs em cima do palco. Depois de meia dúzia de músicas do novo álbum, “Nheengatu”, o disfarce, inspirado no clipe do single “Fardado”, que puxa o disco e abre o show é tirado e mesmo em se tratando de um grande festival, o quarteto + 1 não abre mão de mostrar ainda mais novidades.

O artifício não chega a ser inédito, uma vez que a estreia dessa nova turnê, no final de semana passado, no Circo Voador, teve a cobertura de toda a mídia escrita, falada e conectada (veja como foi). Na ocasião, o grupo mandou 30 músicas, sendo 12 das 14 de “Nheengatu” (resenha aqui). Ontem, em um dos palcos principais do Porão, com o tempo menor por e tratar de um festival, foram nove dessas 12, e não houve quem reclamasse. Porque, sim, o material novo é bom, o melhor já produzido pelos Titãs em muitos anos, e as músicas a ele associadas carregam uma identidade como se fossem todas amigas íntimas. Imagine que, depois de seis novas, “Polícia” é que vem para passar por cima do público sem dó.

CJ Ramone mostrando muito mais que Ramones, com o guitarrista Dan Root, do Adolescents, de boné

CJ Ramone mostrando muito mais que Ramones, com o guitarrista Dan Root, do Adolescents, de boné

Não por acaso é o momento em que a área que abriga o festival, no entorno do belíssimo Estádio Nacional Mané Garrincha, tem seu melhor público no domingão. Como se sabe, as músicas que contornam as novas também não caem ao acaso tampouco respeitam apenas a premissa do sucesso fácil (nada de “Epitáfio”, “Marvin” ou música de Roberto Carlos), mas da identificação com o peso e nos temas que também permeiam “Neenhgatu”: “Desordem”, “Diversão” e “Vossa Excelência”, agora tão próxima do lugar que a inspirou. A versão abreviada no novo show do Titãs nada fica a dever a mais completa, mesmo diante de plateia tão diversa, em quantidade e segmentação. Permanece a ousadia e o compromisso com o novo, o que, vamos e venhamos, é muito bom e faz o grupo sair do PDR como um dos destaques dessa edição.

Se alguém no elenco do festival tem permissão para tocar covers, além dos irmãos Cavalera (veja como foi o show), esse alguém é CJ Ramone. Oras, se ele que é um Ramone não puder tocar Ramones, quem poderá? CJ, contudo, tem um olhar menos óbvio e lança mão de um repertório que inclui músicas de seu disco mais recente, “Reconquista”, e até do próximo, uma vez que ele assinou contrato recentemente com a cascuda gravadora punk “Fat Wreck” (saiba mais) e já lançou o single “Carry Me Away”, prontamente tocada na noite deste domingo. E juntinha com “Last Chance to Dance”, a faixa-título desse mesmo álbum, que também já vem sendo tocada na turnê pelo Brasil.

Festança: Digão e Canisso 'Suicidal', os integrantes remanescentes da formação original do Raimundos

Festança: Digão e Canisso 'Suicidal', os integrantes remanescentes da formação original do Raimundos

CJ, que nessa turnê volta a tocar baixo como nos tempos dos Ramones, tem a companhia luxuosa dos guitarristas Steve Soto e Dan Root, ambos do Adolescents, e o baterista Michael Wildwood, do D Generation. O trio assimila bem o papel de coadjuvante, fazendo inclusive bons vocais de apoio. Embora solte a cada intervalo o grito de “Hey, ho! Let’s go!”, o público curte bastante a face não ramônica do show. Mas a diversão explode mesmo quando o um, dois, três, quatro vem de Wildwood, mesmo que por vezes as músicas escolhidas nem sejam tão óbvias. São elas “Straight to Endure”, cuja gravação original, no álbum, “Mondo Bizarro”, tem os vocais de CJ; “Commando”, no Brasil consagrada pelo Ratos de Porão; e “I Wanna be Your Boyfriend”, entre outras. O bom show teve o tamanho reduzido porque, segundo consta, CJ não se sentia bem no palco. Acho bom melhorar para o show do Rio, nesta terça, dia 2.

O que para ser apenas um show para arrematar essa edição do Porão do Rock, já na madrugada de segunda, se tornou uma festança daquelas. Porque Raimundos em Brasília é Raimundos em Brasília, e uma quantidade de público gigante se divertiu com músicas de todas as fases da banda como se o dia não fosse amanhecer. A cantoria ecoava por Brasília na medida em que as rodas de pogo se multiplicavam, sendo que até as músicas mais recentes, do álbum “Cantigas de Roda” (oito, incluindo “Baculejo” e “BOP”) brilharam com boa resposta do gogó afiado da plateia. Imaginem então na hora de “Eu Quero é Ver o Oco”, “Nega Jurema” e “Palhas do Coqueiro”… O set teve as participações do baterista Fred, da formação original, em três músicas (saiba mais); de Marcelo D2, mais agitando que cantando; e de Érika Martins, fazendo o lindo dueto com Digão em “A Mais Pedida”. No final, palco lotado de músicos amigos da banda agitando ao som de “Puteiro em João Pessoa”. Mais clássico impossível.

O charme de Erika Martins com as micro castanholas: show intimista em festival de grandes dimensões

O charme de Erika Martins com as micro castanholas: show intimista em festival de grandes dimensões

Mais cedo, Erika Martins fez o show “Modinhas”, contemplando várias fases de sua carreira, que vem lá de trás, da banda feminina Penélope. De caráter intimista, contudo, e com as músicas entremeadas por “causos”, o show não funciona tão bem em um festival de grandes proporções como o Porão do Rock. Além de mostrar um repertório variado (que inclui compositores como Tom Zé e Renato Barros) na interpretação peculiar de Erika, o show vale para relembrar musicas como “Namorinho de Portão”, dos tempos da Penélope, e “Kung Fu”, uma paulada dançante do clã do Acabou la Tequila, quando e Erika solta mais a voz, da metade para o final do set. O show tem a participação de Nevilton em uma das músicas. Foi a chance de o músico realçar seu trabalho, já que antes, em formato de duo com um baterista, o show dele próprio deixou a desejar. Compositor de mão cheia, Nevilton precisa de uma banda completa pra chamar de sua e/ou alguém que grave suas músicas com certa frequência. Valeu pelo esforço e pelo repertório, mas o potencial é pra algo bem maior. Avante!

Set list completo Titãs

1- Fardado
2- Pedofilia
3- Cadáver Sobre Cadáver
4- Baião de Dois
5- Chegada ao Brasil (Terra à Vista)
6- Senhor
7- Polícia
8- Fala Renata
9- Bichos Escrotos
10- Mensageiro da Desgraça
11- Flores
12- 32 Dentes
13- AA UU
14- Desordem
15- Vossa Excelência
16- Diversão
17- Televisão
18- Cabeça Dinossauro
19- Lugar Nenhum
20- Eu Me Sinto Bem
21- Sonífera Ilha
Bis
25- Homem Primata

Público lotando o show do Titãs no domingão; ao fundo a bela arquitetura do Estádio Mané Garrincha

Público lotando o show do Titãs no domingão; ao fundo a bela arquitetura do Estádio Mané Garrincha

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Marcos Bragatto viajou à Brasília à convite do festival.

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