O Homem Baile

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Mais death que melódico, Amon Amarth recupera o tempo perdido no Rio com apresentação concisa e marcada pela interação com o público. Fotos: Daniel Croce.

Talhado para liderar banda de death metal, o vocalista Johan Hegg solta o vozeirão sobre a massa

Talhado para liderar banda de death metal, o vocalista Johan Hegg solta o vozeirão sobre a massa

O sorrisão estampado no rosto do vocalista Johan Hegg vale mais do que mil palavras. Traduz o quanto o Amon Amarth deu mole de não ter tocado no Rio antes, em que pese duas vindas da banda ao Brasil em 2009 e 2012. Do outro lado do palco, uma plateia extasiada e com a garganta seca de tanto cantar tudo o que é música do grupo sueco, ao mesmo tempo em que se acaba em peculiares rodas de pogo e confrontos espontâneos do tipo “divisão do Mar Vermelho”. Por isso o Circo Voador nem precisa registrar a lotação máxima para que a panela de pressão sob a lona seja acionada em 90 minutos e mais três de acréscimos em cada tempo de pura interação entre público e banda.

Hegg é uma espécie de totem sueco de quase dois metros de altura revestido em jacarandá, mas seu grande trunfo é mesmo o gogó. Ele não é do tipo que fala com voz “normal” e canta forçando a barra. As cordas vocais do sujeito parecem arranhadas por natureza o tempo todo, e, portanto, talhada para cantar em uma banda de death metal, sobretudo na Suécia. No show, o fator melódico – sim, existe death metal melódico e já faz tempo – incorporado ao grupo não chega a ser crucial, de modo que o que prevalece é o peso absurdo, as idas e vindas do baterista (e animal) Fredrik Andersson, e as peripécias dos guitarristas Olavi Mikkonen e Johan Söderberg, que se revezam em solos nem sempre tão melosos como supõem os detratores do grupo, mas na maior parte do tempo em peformances individuais - ah, se essa duplinha descobrisse as twin guitars…

O baixista Ted Lundström, Johan Hegg e o guitarrista Johan Söderberg: show mais death que melódico

O baixista Ted Lundström, Johan Hegg e o guitarrista Johan Söderberg: show mais death que melódico

O fator melódico, de fato, aparece mais quando as composições ganham o capricho de conseguir cativar os fãs com irresistível cantarolar quase de modo inconsciente. É o que acontece logo de cara, na abertura, com “Father of the Wolf”, que reúne as duas coisas, solo melódico e aquele “ôôô”, e “Deceiver Of Gods”, faixa-título do disco mais recente, que realça os punhos cerrados levados ao ar como aconteceria em boa parte da noite; e ainda no outro extremo do show, na ultima música, “The Pursuit of Vikings”. A canção é espécie de hino do grupo, tem um quê de ogro-beberrão (a banda faz um vira-vira com uma bebida de origem desconhecida), é talhada para o acompanhamento vocal da multidão e a que mais aproxima o Amon Amarth do chamado viking metal, subgênero do metal ao qual, definitivamente, não pertence, em que pese às referências da cultura nórdico-europeia que lhe são peculiares.

Isso porque o prato principal da noite é o peso indelével do grupo, seja de forma mais lenta, quando tem um élan de evolução sabbathiana, ou em músicas mais velozes, para o público se acabar pra valer. No primeiro apanhado, salientam-se “Free Will Sacrifice”, cuja vocação é impulsionar a bateção de cabeça; e “Runes to My Memory”, uma ode aos punhos cerrados valorizada por um refrãozão dos bons e por uma guitarra sem fim que mina a canção em segundo plano. No segundo punhado, cabem “War Of The Gods”, que encerra a primeira parte do show com a plateia acompanhando com fúria semelhante; e “Destroyer of the Universe”, que reserva solos realmente nervosos. O repertório cobre seis dos nove álbuns do grupo, mas a ênfase – corajosa, diga-se - é em “Deceiver Of The Gods”, lançado há quase um ano, que comparece com nada menos que meia dúzia das 10 faixas.

Destaque na apresentação, o baterista Fredrik Andersson envolve o peso do AA com batidas poderosas

Destaque na apresentação, o baterista Fredrik Andersson envolve o peso do AA com batidas poderosas

A banda ainda tem como peculiaridades músicas com sutis referências não comuns ao meio da música extrema. Como explicar a sequência de riffs chicletes da ótima “Warriors of the North”, realçada ao vivo, senão com uma citação à música eletrônica, que faz da peça de uns oito minutos de duração, quase um hit de pistas de dança? “Death in Fire”, de seu lado, tem um timbre de bateria com um quê da fase tribal do Sepultura, sobretudo em “Chaos AD”, característica de todo o álbum “Versus The World”, de 2002, só que disfarçada, ao vivo, por Andersson. Ressalta-se que essa formação permanece a mesma há mais de 15 anos e oito discos, o que não é pouco e resulta num entrosamento pleno em cima do palco. Talvez seja essa a razão principal, entre tantas componentes, que mantenha o Amon Amarth em um bom patamar no meio metálico, com exibições empolgantes como a de ontem. Eles seguramente não irão esquecer a noite de gala do Circo Voador.

Set list completo:

1- Father of the Wolf
2- Deceiver of the Gods
3- Death in Fire
4- Free Will Sacrifice
5- As Loke Falls
6- We Shall Destroy
7- Guardians of Asgaard
8- Blood Eagle
9- Warriors of the North
10- Runes to My Memory
11- Varyags of Miklagaard
12- The Last Stand of Frej
13- Destroyer of the Universe
14- Cry of the Black Birds
15- War of the Gods
Bis
16- Twilight of the Thunder God
17- The Pursuit of Vikings

Não vai esquecer: o 'iluminado' Johan Hegg se divertiu pra valer na primeira vez do grupo sueco no Rio

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