O Homem Baile

Um, dois, três, quatro!

Depois da apresentação delirante do Rock In Rio, Marky Ramone volta à cidade e faz show completo para um Teatro Odisseia lotado. Foto: Daniel Croce.

markyramone14Se você achou que por ter sido um dos sortudos que chegou cedo para ver Marky Ramone no Rock In Rio do ano passado, não precisava conferir a volta do baterista do Ramones à cidade, estava totalmente enganado. Para um Teatro Odisséia com lotação máxima, ontem, Marky, o ex-vocalista do Misfits, Michale Graves, e dois coadjuvantes argentinos fizeram a apresentação completa com nada menos que 34 petardos do repertório do grupo que inventou o punk, uma homenagem ao eterno Joey Ramone e duas cançõezinhas acústicas (é mole?) para satisfazer o ego do vocalista. Ok, não se pode ser punk para sempre.

Para a massa que se estapeava ante ao palco diminuto da casa, pode, sim. E como pode. Não houve quem ficasse parado diante de clássicos e mais clássicos daqueles que todo mundo – todo mundo mesmo – conhece e/ou sabe cantarolar um pedaço. Como em um legítimo show do Ramones – do Canecão sob bomba ao Circo Voador coberto de graxa – o público não é do tipo que abre a roda hardcore, mas fica se empurrando de lado a outro e abusa de fantásticos body surfings, incluindo cambalhotas, mulheres sem medo de ser feliz e algumas subidas indesejadas ao palco. Tal procedimento desagrada o guitarrista Marcelo Gallo, que vê o som cair a ponto de ele fazer biquinho e ameaçar deixar o show. Lá no alto de seu praticável, Marky devia pensar: “esse jamais tocaria no CBGB’s”.

Mas, no início, os problemas técnicos, sim, desanimam. Porque não se pode ter um show com repertório ramônico sem ser uma paulada atrás da outra, no ritmo do “um, dois, três quarto” sem parar. Por isso, quando a coisa engrena, são cerca de 16 músicas no talo, direto e sem que ninguém se dê conta do que está acontecendo do lado de fora, no cada vez mais insensato mundo real. Ah, o punk rock… Entre elas, a emblemática “I Don’t Care”; “Commando”, que o Ratos de Porão fez de sua no Brasil; a insofismável “Beat On The Brat”; e a sensacional dobradinha – se é que dá pra chamar assim – “I Believe In Miracles”/“The KKK Took My Baby Away”. Deu pra sentir o drama?

Nem dá para acreditar, para aquele que nunca viu essa formação, que Michale Graves é capaz de tocar um show assim: é muito gogó, respiração e preparo físico. Ele não pode voar como faz em um palco maior como o do Rock In Rio (veja como foi), mas faz das suas: acalma o guitarrista irritadiço, sacaneia um popular que, no meio da muvuca, troca mensagens de texto no celular e – ok – recebe o direito de fazer seu indesejável sarau. É possível que ninguém ali no meio da multidão preste atenção se tem música demais, se falta uma ou outra, mas alguém precisa fazer o trabalho sujo e anotar que falta coisa do naipe de “We Want The Airwaves”, “Somebody Put Something In My Drink”, “Poison Heart”, da fase “menos punk”, e – por que não? – “Spider Man”.

A segunda parte começa com o hit dos hits “Pet Sematary” e nem precisa ser do ramo para cantar a música que toca até na Rádio Cidade, de volta ao dial carioca e ao saudável apoio aos shows. “Chinese Rock” e “I Wanna be Sedated”, uma das que provoca maior agitação na plateia, e “Pinhead” estão entre as que encerram a primeira parte com uma hora redondinha no relógio. O bis curiosamente traz uma caída no show, apesar de porradas como “I Just Want To Have Something To Do” e “R.A.M.O.N.E.S.”, que o Motörhead fez em homenagem ao grupo, devidamente apropriada por Marky, que o público adora. Depois do anticlímax acústico de Graves, é a vez da melancolia da perda de três dos quatro Ramones clássicos, que inclui “Life’s a Gas” (seria o sopro de vida de Oscar Niemayer?) e “What a Wonderfull World”, que marcou a fase final, já solo, de Joey Ramone. O desfecho com “Blitzkrieg Bop”, que afinal, dá nome ao grupo, converte em alegria de ser punk rocker as lágrimas de tristeza. Acima de tudo, uma bela noite de rock.

A abertura coube ao Nardones, que investe em um bom horror punk cantado em português e cheio de (boas) referências. Tanto que, separadamente, muitas músicas lembram subgêneros do rock distintos, mas, no fundo, interconectados. Assim, black metal (“Dor, Demência e Desespero”), psychobilly (“Caos e Destruição”) e pós punk (“O Chamado”), entre outros, se encontram no show de cerca de meia hora, mas não se misturam tanto assim, o que, de certa forma, reflete na maquiagem desconexa do quinteto. Embora não detone a participação do público, no final o Nardones sai aplaudido, com o reconhecimento de quem causou uma boa impressão. Curioso foi ver, no meio do show dos caras, o próprio Marky Ramone lá atrás ajeitando o kit de bateria. Lindo.

Set list complete Marky Ramone:

1- Rockaway Beach
2- Teenage Lobotomy
3- Psycho Therapy
4- Do You Wanna Dance?
5- I Don’t Care
6- Sheena Is a Punk Rocker
7- Havana Affair
8- Tomorrow She Goes Away
9- Commando
10- I Wanna Be Well
11- Beat on the Brat
12- 53rd & 3rd
13- Now I Wanna Sniff Some Glue
14- Gimme Gimme Shock Treatment
15- Rock ‘N’ Roll High School
16- Oh Oh I Love Her So
17- Judy Is a Punk
18- I Believe in Miracles
19- The KKK Took My Baby Away
20- Pet Sematary
21- Chinese Rock
22- I Wanna Be Sedated
23- Loudmouth
24- I Don’t Wanna Walk Around With You
25- Pinhead
Bis
26- Do You Remember Rock ‘N’ Roll Radio?
27- I Just Want to Have Something to Do
28- She’s the One
29- California Sun
30- Have You Ever Seen the Rain?
31- Cretin Hop
32- R.A.M.O.N.E.S.
33- Dig Up Her Bones
34- Saturday Night
35- Life’s a Gas
36- What a Wonderful World
37- Blitzkrieg Bop

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