O Homem Baile

Satisfação garantida

Fãs escolhem o repertório que o Metallica escolheria e grupo faz mais uma apresentação matadora, a quinta no Brasil em cinco anos; novidade é a única música nova, “Lords Of Summer”. Fotos: MRossi/Divulgação T4F.

Gana a mais: o baixista Robert Trujillo e o vocalista/guitarrista James Hetfield interagem sob chuva

Gana a mais: o baixista Robert Trujillo e o vocalista/guitarrista James Hetfield interagem sob chuva

Depois de ver o Metallica tocar ano sim ano não no Rock In Rio, o povo de Além Dutra não decepcionou. Cerca de 65 mil pessoas esgotaram toda a carga de ingressos e encheram o Estádio do Morumbi, neste sábado (22/3) para o show da turnê “By Request”. E isso debaixo de uma chuva que se não era um toró daqueles passou longe da garoa característica da região. Aí, quem não decepcionou foi o Metallica, que subiu no palco com uma gana de chamar a atenção, como se a chuva fosse motivo adicional para o quarteto botar pra quebrar com o palco, incluindo os instrumentos completamente encharcados. Para se ter uma ideia, a cada batida de Lars Ulrich em um dos pratos, espirrava água de chuva para cima. A expressão de reencontrar o público paulistano e dos arredores, depois de quatro anos de ausência, deixa o vocalista/guitarrista James Hetfield com um sorriso que é puro orgulho e satisfação. A quinta apresentação da banda no Brasil em cinco anos teve como plus involuntário a imagem nos telões dos pingos caindo bem na frente dos músicos. Coisa bonita de se ver.

O Metallica é o tipo de banda que entrega o que promete. Repertório conhecido, som de alta qualidade e num volume ensurdecedor – como deve ser num show de rock e mais ainda em se tratado de heavy metal – e transmissões ao vivo em telões gigantes de altíssima definição, fator ainda mais necessário em um estádio das dimensões do Morumbi. Dessa vez, talvez por causa da chuva ou por uma falha da produção de palco, faltaram os efeitos pirotécnicos e as explosões de que tanto causam impacto. No final de “Welcome Home (Sanitarium)”, um único espocar aconteceu, e, antes da música seguinte, “Fuel”, cujo título já sugere foguetório, outro pipoco disparou no meio da fala de Hetfield, que, embora bem humorado, esbravejou mandando cortar o efeito. Um único senão em uma produção impecável.

A vibração do baterista Lars Ulrich, que deixou um fã iniciar 'Seek and Desroy' com quatro pancadas

A vibração do baterista Lars Ulrich, que deixou um fã iniciar 'Seek and Desroy' com quatro pancadas

A novidade da “By Request” é que o púbico é quem escolhe, por antecipação, via internet, as músicas a serem tocadas. Embora a atitude seja das mais simpáticas, na prática, a coisa não funciona muito bem para uma banda gigante e de fãs tão heterogêneos como o Metallica. A escolha acaba não trazendo novidades ou músicas do tipo “lado b”, recaindo sobre os grandes sucessos, que, de uma maneira ou outra, já seriam obrigatoriamente tocados pelo quarteto. E o grupo anda promove, durante o show, uma última votação, via SMS, para decidir qual é a derradeira canção contemplada. Deu “The Day That Never Comes”, deixando “Ride The Lightning”, que havia sido escolhida via web, de fora. O público vaiou a escolha na hora.

É de se desconfiar que o artifício tenha sido usado justamente para colocar uma música do disco mais recente, o bom “Death Magnetic”, assim como é suspeita a inclusão de “… And Justice For All”, desconhecida do grande público, e que só voltou aos shows para ajudar a promover o filme “MetallicaThrough The Never” (resenha aqui), grande fiasco financeiro. “Auditoria!”, grita um fã mais desconfiado. Ademais, Hetfield fazendo as vezes de apresentador de reality show entre uma música e outra, ao pedir para o público votar é algo deveras desagradável. Assim como deve ser reavaliado a colocação de um punhado de fãs em cada lateral do palco. Ora, lugar de público é no pit; lugar de banda é que é no palco. Três desses fãs são chamados para apresentar músicas, mas seguem um texto padrão decorado, provavelmente imposto pela produção, e um dá quatro porradas com a baqueta no prato da bateria de Lars, no início de “Seek and Destroy”. Outra boa iniciativa, mas cujo resultado, no meio do show, soa desnecessário.

Os cabelos brancos do guitarrista Kirk Hammett, que debulhou a guitarra na novata 'Lords Of Summer'

Os cabelos brancos do guitarrista Kirk Hammett, que debulhou a guitarra na novata 'Lords Of Summer'

Novidade de verdade mesmo é a inclusão de uma única música nova, “Lords Of Summer”, que antes deste sábado só havia sido tocada três vezes, nos shows da Colômbia, Equador e Peru, por onde a “By Request” já passou (veja mais). A música remete ao Metallica das antigas, dos tempos do thrash metal de raiz, com paradas, mudanças de andamento e muitos riffs e solos reunidos em uma única peça. Ao mesmo tempo, com cerca de oito minutos de duração, tem conexão com as estripulias do álbum “… And Justice For All”, no qual a banda exagera em longas passagens instrumentais. Contudo, se colocada no repertório do disco anterior, “Death Magnetic”, seguramente seria um dos destaques, ao lado de “Cyanide”, “The Day That Never Comes” e “My Apocalypse”, entre outras. Quem deita e rola é o guitarrista Kirk Hammett ao fazer um belíssimo duelo com Hetfield num solo de encher os olhos. Se “Lords Of Summer” for uma pista de como será o novo álbum do Metallica que – dizem – já está sendo gravado, a coisa vai bem. Mas, ao apresentar a música no show da Colômbia, Hetfield nada garantiu. Clique aqui para ver o vídeo oficial do show da Colômbia, e aqui para escutar a gravação de estúdio.

Também pode-se considerar uma conquista da “By Request” a inclusão de “Whiskey in the Jar”, consagrada pelo Thin Lizzy, que não era tocada há uma pá de tempo, numa sábia decisão – aí, sim - do público. Considerações à parte, e honra seja feita, o set list apresentado está longe de ser ruim. Primeiro porque segue o esqueleto que o Metallica vem executando há anos com sucesso, com substituições cirúrgicas de modo que dificilmente um show é igual a outro. Depois, porque a performance da banda, ao vivo, permanece matadora. É admirável perceber que o Metallica ultrapassou as fronteiras do metal sem ceder um milímetro de peso, atitude e agressividade: é metal impiedoso até hoje. Pense, por exemplo, que a abertura é com “Battery”, uma das músicas mais porradas da história do metal; que as três primeiras músicas saem do álbum “Master Of Puppets”, o mais querido dos fãs das antigas; que “Creeping Death” é cantada a plenos pulmões e converte o mais indiferente sujeiro do lado de dentro do Morumbi em headbanger de longa data com punhos cerrados ao ar; que “One” prossegue com uma barulheira dos infernos; e que, por fim, uma “Enter Sandman” só não faz verão. Ou seja: declara-se oficialmente aberta a lista de melhores shows de 2014.

Um nível acima, James Hetfield aparece ao lado de Lars Ulrich, tendo o gigantesco telão ao fundo

Um nível acima, James Hetfield aparece ao lado de Lars Ulrich, tendo o gigantesco telão ao fundo

Set list completo:

1- Battery
2- Master of Puppets
3- Welcome Home (Sanitarium)
4- Fuel
5- The Unforgiven
6- Lords Of Summer
7- Wherever I May Roam
8- Sad But True
9- Fade to Black
10- …And Justice for All
11- One
12- For Whom the Bell Tolls
13- Creeping Death
14- Nothing Else Matters
15- Enter Sandman
Bis
16- Whiskey in the Jar
17- The Day That Never Comes
18- Seek and Destroy

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