O Homem Baile

Em dia

Na abertura da turnê, no Rio, Guns N’Roses faz o melhor show no Brasil desde que a banda virou propriedade particular de Axl Rose. Foto: Luciano Oliveira.

Boa voz: Axl Rose canta na parte de cima do palco do Guns N'Roses, na frente do baterista Frank Ferrer

Boa voz: Axl Rose canta na parte de cima do palco do Guns N'Roses, na frente do baterista Frank Ferrer

“Deus ajuda quem madruga, mas dormir não é pecado” deveria ser o mantra do latino americano, segundo Zé Rodrix, mas o ditado cai muito bem para Axl Rose. Mesmo com todo o cuidado da produção para que não houvesse atrasos, como sempre acontece em um show do Guns N’Roses, a banda entrou no palco da HSBC Arena ontem, no Rio, cerca de 1h45 depois do horário previsto para o início. Curiosamente, muitos dos fãs também chegaram em cima do laço, como num acordo tácito com o cantor, e coube aos que madrugaram soltar vaias nos intervalos das músicas que eram mecanicamente repetidas. Apupos que seguramente se converteram em aplausos e muita – muita mesmo – emoção, saldando a dívida da banda que quase sucumbiu ao toró que caiu no show o Rock In Rio de 2011 (veja como foi). De acordo com os produtores, cerca de 13 mil pessoas compareceram ao show.

Em 2h20 com muitas explosões, iluminação generosa, pirotecnia e o arremate com papel picado laçado ao ar, o Guns tocou tudo aquilo que o público queria ouvir. São hits da era de ouro da banda, antes de o megalômano Axl pirar e tomar o grupo para si, e as músicas do álbum “Chinese Democracy”, aquele mesmo que demorou uns mil anos para ser lançado e até hoje, seis anos após o parto, ainda é tido como “novo” por muita gente boa por aí. No caso do Guns N’Roses, o tempo segue outra lógica. O repertório é baseado na residência que a banda fez em Las Vegas em 2012, comemorando o aniversário de 25 anos do álbum “Appetite For Destruction”, o clássico primeirão, e o de quatro anos de “Chinese Democracy”, que resultou no DVD “Appetite For Democracy”, a ser lançado em abril (detalhes aqui).

Vista geral do palco, com baterista e tecladistas na parte de cima e os telões gigantes na laterais

Vista geral do palco, com baterista e tecladistas na parte de cima e os telões gigantes na laterais

A novidade é a inclusão de duas músicas cantadas por outros integrantes: “Teenage Kicks”, pelo baixista Tommy Stinson, e “Abnormal”, pelo guitarrista Ron “Bumblefoot” Thal. Não que tenha sido a primeira vez que isso tenha acontecido, mas aponta para uma nova artimanha do grupo. Junta há cerca de oito anos, à exceção do guitarrista DJ Ashba, que entrou em 2009, essa formação hoje está muitíssimo bem entrosada, o que pode influenciar diretamente na composição e gravação de um novo álbum, se é que um dia isso vai realmente acontecer. Mas que promete, promete. Contraditoriamente, só o que pode estragar um show do Guns N’Roses hoje é a performance do único integrante da formação clássica do grupo, o encardido Axl Rose.

Ontem, ele estava bem, com a voz em dia, muito embora tenha passado por altos e baixos durante o show. E olha que a apresentação é planejada com várias intervenções instrumentais de modo que Axl tenha mini intervalos para – segundo consta – ir ali atrás do palco receber um pouco de oxigênio extra e, de quebra, trocar de jaqueta e de chapéu. Mas as idas e vindas, dessa vez, não parecem tão frequentes como nos shows de 2011, no Rock In Rio e no de 2010 (relembre). Nas inflexões de “Better”, no começo da noite; nas variações da belíssima “Sweet Child O’Mine”; e no final de “November Rain”, Axl manda muito bem e passa recibo de gogó de outro. Já na parte mais arrojada de “You Could Be Mine”, difícil mesmo na hora da gravação original, em estúdio, ele sofre um bocado. Com o tempo, Axl, 52, vai ter que encontrar um modo diferente de interpretar certas canções, como acontece com outros vocalistas mais maduros. Mas não é no posto de fiscal de vocalista que se aproveita um show de rock. O público sabe disso e se esbalda a cada hit, sobretudo os mais antigos e encravados implacavelmente na memória de cada mortal.

Próximo á beirada do palco, Axl Rose faz uma de suas típicas dancinhas e enlouquece a multidão

Próximo á beirada do palco, Axl Rose faz uma de suas típicas dancinhas e enlouquece a multidão

Os chamados solos dos guitarristas são na verdade momentos de música instrumental que soam como intervalos de luxo. Embora eles tenham fugido das citações óbvias do passado (ninguém mais aguenta o tema de “O Poderoso Chefão” consagrado por Slash), percebe-se em qual fonte cada qual bebe. O discreto Richard Fortus começa como o funk rock de Jeff Beck e termina no blues de lembrar Jimmy Page; nada menos que dois dos sucessores de Jimi Hendrix. DJ Ashba, o clone mais que perfeito de Slash, com cartola e tudo, vai na linha contemporânea mais identificada com Steve Vai e contribui muito no recheio das músicas. Bumblefoot, depois de passar por um pesado regime, abusa das guitarras double neck e, - aí, sim, solo - protagoniza um dos momentos mais emocionantes da noite ao tocar o Hino Nacional Brasileiro. O que parecia ser uma patacoada apelativa se transforma numa bela demonstração de orgulho quando a plateia canta a letra em uníssono. E ao baixista Tommy Stinson, que já foi do Replacements, coube o cover punk rock para a ótima “Teenage Kicks”, do Undertones.

Os destaques são óbvios para o show de uma banda com tanto blockbuster e poucas novidades no repertório, mas como não se emocionar com “Sweet Child O’ Mine” (a música que engorda a conta bancária de Slash), coladinha em “November Rain”, mesmo que Axl e o piano não sejam mais erguidos como no passado? E os arrepios com o solo de guitarra que introduz a bela “Estranged”, que voltou ao repertório depois do show do Rock In Rio de 2011? Em versões estendidas, “Don’t Cry” e “Knockin’ On Heaven’s Door”, essa num interessante dueto vocal de um inesperado gente fina Axl com o púbico, crescem um bocado na parte final do show. E até “This I Love”, uma das “novas”, com tons dramáticos, e “You Could Be Mine”, com Axl raspando o tacho da voz causam certa comoção no público. Sorte de quem pegou o apito e o microfone sem fio lançados ao povão em “Paradise City”, que, claro, foi reservada para o encerramento. Pode anotar aí: foi o melhor show do Guns N’Roses no Brasil desde que a banda virou propriedade particular do golpista Axl Rose.

Axl Rose ao lado do magro guitarrista Ron 'Bumblefoot' Thal e uma de suas guitarras double neck

Axl Rose ao lado do magro guitarrista Ron 'Bumblefoot' Thal e uma de suas guitarras double neck

Set list completo:

1- Chinese Democracy
2- Welcome To The Jungle
3- It’s So Easy
4- Mr. Brownstone
5- Estranged
6- Better
7- Solo guitarra Richard Fortus
8- Live and Let Die
9- This I Love
10- Teenage Kicks
11- Solo teclado Dizzy Reed
12- Catcher in the Rye
13- You Could Be Mine
14- Solo guitarra DJ Ashba
15- Sweet Child O’ Mine
16- November Rain
17- Abnormal
18- Hino Nacional Brasileiro (Solo Bumblefoot)
19- Don’t Cry
20- Knockin’ On Heaven’s Door
21- Nightrain
Bis
22- You Can’t Always Get What You Want
23- Patience
24- Paradise City

Agora, a turnê do Guns passa por Belo Horizonte, dia 22/3; Brasília, dia 25/3; São Paulo, dia 28/3; Curitiba, dia 30/3; Florianópolis, dia 1/4; Porto Alegre, dia 3/4; Recife, dia 15/4; e Fortaleza, dia 17/4. Clique aqui e veja todos os detalhes dos shows de cada cidade.

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