O Homem Baile

Caos total

Vinte anos depois, Exploited volta ao Rio, encontra mazelas semelhantes e transforma o Teatro Odisséia em pub britânico dos bons. Fotos: Mauro Pimentel (1) e Daniel Croce (2, 3 e 4).

Wattie Buchan canta para a plateia ensandecida no início do show caótico do Exploited no Rio

Wattie Buchan canta para a plateia ensandecida no início do show caótico do Exploited no Rio

Quem superou a tempestade que se abateu sobre o Rio de Janeiro, mas chegou atrasado no Teatro Odisséia, ontem (5/12), não deve ter entendido muita coisa. Em cima do palco, uma turba de punks clamava por sexo e violência. Era o início do bis do show do Exploited, que retorna à cidade exatos 20 anos depois da primeira e – até então – única apresentação. Com o vocalista Wattie Buchan nos bastidores, o baterista Willie, irmão dele, tratou de convocar o público para subir no palco e cantar o clássico “Sex And Violence”, cuja letra se resume ao próprio título, realçado pelas mudanças de andamento típicas do punk rock. Zorra total comandada pelo público que encheu o local, com destaque para uma moça mais atirada que fazia movimentos pélvicos ao monopolizar o microfone. Nada mal.

Nunca é fácil. Há 20 anos o Circo Voador encarou uma inesperada greve de ônibus exatamente na madrugada do show, e, dessa vez, o caos espalhado pela cidade retardou – e muito – a volta para a casa, entre ruas alagadas ou imundas, com o lixo espalhado para tudo o que é lado. Se os ingleses achavam que o caos era Margareth Thatcher no poder, viram coisa pior por aqui, hoje e há 20 anos. “Let’s Start a War”, de título copiado de um discurso da Primeira Ministra, clássico absoluto do punk rock mundial, é que abre a noite detonando de imediato rodas de pogo sem fim até o final da apresentação e sem nenhum registro de brigas entre os fãs do grupo, muitos de idade avançada, remanescentes de outras épocas, assim como a banda.

Mudanças: o guitarrista heavy metálico Matt Justice e Wattie na linha de frente do Exploited

Mudanças: o guitarrista heavy metálico Matt Justice e Wattie na linha de frente do Exploited

Acontece que o Exploited tem escalação renovada – apenas Wattie é da formação original e Buchan é das antigas – e hoje o guitarrista Matt Justice empresta um sotaque heavy metal – acredite – a muitas das músicas da banda. Vale lembrar que antes da “unificação” promovida pelo thrash metal, no final da década de 80, punks e heavies pareciam feitos para destruírem uns aos outros. Coisa que neste século não faz o menor sentido, ainda que Justice enfileire riffs e solos (numa banda punk!) o tempo todo. É o que acontece, por exemplo, em “Noize Annoys” e “Was It Me”, ambas do disco mais recente, “Fuck The System”, lançado há 10 anos. Ou ainda na própria faixa-título desse disco, o que prova que até uma banda de punk clássico como o Exploited pode dar suas escapadelas.

Interferências que não abalam o comportamento do agitado público, que parecia o de ingleses beberrões dentro de um pub no interior da Inglaterra. Até o som do Odisséia, em geral claudicante, estava no talo e com boa qualidade, como deve ser em um show de rock. A festa só não foi maior porque ao que parece o quarteto não está mais interessado em deixar o púbico subir ao palco para dar os tradicionais moshs; o primeiro só foi acontecer na ótima “Beat The Bastards”, gritada aos berros. Por isso o início do bis com o placo cheio causou surpresa. Sem mosh, a plateia se garantiu em um body surfing bonito de se ver lá de cima, mesmo numa casa de dimensões modestas, nada melhor ou pior que um Garage, um CBGB ou um Marquee.

Além de bater com o microfone na cabeça raspada, Wattie coloca o público para cantar o tempo todo

Além de bater com o microfone na cabeça raspada, Wattie coloca o público para cantar o tempo todo

Não pode mais ficar parado é a ordem natural das coisas, ainda mais com clássicos inerentes á história do punk e de cada um ali dentro. O refrão de “Dogs Of War”, vomitado com raiva; o deboche em forma de hino militar de “Army Life”, que todo mundo reconhece de imediato; o brado “Punk’s Not Dead”, repetido até hoje pelos quatro cantos do planeta, já no bis; e mesmo a monocórdica “Sex And Violence”, tocada uma segunda vez, sem o público, realçam momentos de puro fascínio que só o punk rock pode proporcionar. Afinal, não é sempre que se pode ficar frente a frente com um sujeito cujo perfil é a representação do crânio punk que faz parte do inconsciente coletivo do rock desde sempre.

Set list completo:

1- Let’s Start a War (Said Maggie One Day)
2- Fight Back
3- Dogs Of War
4- UK 82
5- Chaos Is My Life
6- Dead Cities
7- Alternative
8- Noize Annoys
9- Troops Of Tomorrow
10- Never Sell Out
11- Mucky Pup
12- Rival Leaders
13- Anarchy
14- Beat The Bastards
15- Fuck The System
16- Cop Cars
17- Porno Slut
18- Fuck The USA
19- Army Life
Bis
21- Sex And Violence
22- A confirmar
23- Punk’s Not Dead
24- Was It Me
25- Sex And Violence

Wattie é a representação do crânio punk do Exploited que permanece no inconsciente coletivo do rock

Wattie é a representação do crânio punk do Exploited que permanece no inconsciente coletivo do rock

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Comentários enviados

Apenas 1 comentários nesse texto.
  1. Victor em dezembro 9, 2013 às 13:09
    #1

    Texto sensacional! Narrativa muito bem construída e com muito conhecimento sobre a banda. Excelente forma de introduzir as músicas no contexto. Eu não conhecia o site. A partir de hoje posso me considerar um fã!

    Fui ao show em São Paulo e posso dizer que um ctrl+c ctrl+v serviria para a apresentação que eles fizeram na cidade cinza, com exceção das dificuldades para chegar por conta da chuva.
    O único ponto fraco foi o preço dos ingressos. Os R$ 80 cobrados antecipadamente e os absurdo R$ 120 da porta fizeram do Via Marques uma casa de shows cheia de espaços vazios. A Ataque Frontal e a The Firm vacilaram em cobrar esse preço. Também acho que os fãs mereciam esse show no Hangar 110.

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