Festival de riffs
Sem visual berrante, Ratt enfatiza a força das guitarras do hard rock oitentista no Monsters Of Rock; Buckcherry mostra renovação no gênero e Dokken, cansaço. Fotos Divulgação XYZ: Stephen Solon.
Não está no vocalista Stephen Pearcy o melhor do show. Não que ele esteja com a voz detonada a ponto de prejudicar a apresentação, mas parece fisicamente debilitado e com um shape de morto vivo que impede uma performance mais arrojada. É aí que entram as guitarras, reforçando que, por trás do visual colorido e andrógino hoje só adotado pelos fãs mais novos, o Ratt é uma banda de guitarras. Por isso o palco é montado com uma muralha de amplificadores e o show tem – de longe – o volume mais alto de todo o festival, a ponto de distorcer e embaralhar os tímpanos até de que ficou lá atrás. E nesse contexto realça a guitarra do por vezes subestimado Warren DeMartini, já que Carlos Cavazo, o outro guitarrista, com passagem pelo contemporâneo Quiet Riot, abraça as bases das músicas com certa resignação.
Em “Nodody Rides For Free”, por exemplo, DeMartini já entra solando loucamente, impingindo um peso que a música, famosa por fazer parte da trilha do filme “Caçadores de Emoção”, não possuiu em sua versão de estúdio. Na boa “You’re In Love”, o destaque é o riff ameaçador e o andamento cadenciado que se torna irresistível, marcando a música do início ao fim. O repertório do show é todo baseado no álbum de estreia do grupo, “Out Of The Cellar”, mas de certa forma passeia por várias fases do Ratt, embora não inclua nenhuma música do bom disco “Infestation”, lançado em 2010 (veja a lista das músicas no final do texto).Se fosse uma apresentação individual, muito provavelmente o show não reuniria nem um décimo do público, prova que o Ratt é mesmo uma banda de arena, que cresce em festivais como o Monsters. É o que acontece com a maioria das bandas de rock pesado que têm estofo e repertório consagrado. O desfecho do fim de tarde se dá com a sensacional coreografia de guitarras empunhadas em “Back For More”, quando Pearcy usa o título para prometer voltar logo ao Brasil, e na colante “Round And Round”. Como se não bastasse a música ser um grude daqueles, Di Martini e Cavazo partem para um sensacional duelo de guitarras na beirada do palco. Não poderia mesmo ser melhor.
Mais cedo, ainda com um público pequeno, o Dokken não teve mesmo vigor. Se o baterista “Wild” Mick Brown, com quase 60 anos, faz jus ao apelido e destrói uma caixa da bateria logo na segunda música, o líder do grupo, Don Dokken, decepciona. Com uns quilões a mais e cordas vocais de menos, não consegue cantar mais de quatro músicas sem perder a voz. Nesse contexto, é o arisco guitarrista Jon Levin que bota pra quebrar, com solos em cima de solos em quase todas as músicas. Na sensacional “Breaking The Chains”, suas intervenções rivalizam com riffs certeiros que botam a plateia pra banguear. Outras que fizeram o público ainda pequeno vibrar foram “Into The Fire” e “Kiss Of Death”, que abriu o show.Única banda com trabalho contemporâneo consistente no domingão, o Buckcherry fez um show completo, mas parecido com o da abertura para o Mötley Crüe, em 2011 (veja como foi). O vocalista matusquela Joss Todd, mistura de Scott Weiland e Axl Rose, é um bom frontman e conduz o show muito bem, muito embora o guitarrista Stevie D. roube a cena com boa performance de palco. Em “All Night Long”, ele se acaba na beirada, junto à plateia, e, em “Dead”, chama o outro guitarrista, Keith Nelson, para um belo duelo que chama a atenção do público, aparentemente pouco familiarizado com o repertorio do quinteto. Também é notável a camisa azul da seleção brasileira do batera Stevie D., mas o que o público curte mesmo são às citações à Rolling Stones (”Miss You”) e AC/DC (”Big Balls”), no arremate da boa apresentação do Buckcherry.
Geoff Tate, por sua vez, não está mesmo com sorte. Primeiro, que tocou bem cedo com a sua versão do Queensrÿche (entenda o imbróglio aqui), sob um sol de deserto do Saara. Depois, sofreu para ajustar o som, oscilante, durante todo o show. E, ainda, o repertório, entre o power metal e progressivo, não caiu no gosto do público, visivelmente interessado na pegada hard rock das outras atrações. Por isso mesmo só músicas como “Silent Lucidity” caíram no gosto, sendo que só a música “Cold”, um pop rock de refrão colante, não é do repertório do Queensrÿche, digamos, original. O que também pega para Tate é que os integrantes de sua banda, incluindo bambambãs como o baixista Rudy Sarzo e o baterista Simon Wright, pouco têm a ver com o som praticado pelo Queensrÿche, resultando em uma notável falta de interação recíproca, entre ele e os demais. Ou seja, Tate está com um problemão no colo.Encarando o sol dos sóis, o Dr. Sin tocou por cerca de uma hora, 19 anos depois de ter participado do mesmo Monsters Of Rock; o festival ficou 15 anos em acontecer no Brasil. O show teve músicas do novo álbum, “Animal”, como “Lady Lust”, e clássicos como “Fire” e “Emotional Catastrophe”, esta com Edu Falaschi, do Almah, nos vocais. Outra participação foi a do guitarrista Demian Tiguez, do Symbols, em “No Rules”, promovendo altos duelos com Edu Ardanuy. Com tanta bagagem, a banda bem que poderia pleitear um lugar melhor nas próximas edições do festival, para tocar para um público maior. Fora de festivais, uma turnê com a íntegra do álbum “Brutal”, de 1995, também cairia bem.
Set list completo Ratt:1- Wanted Man
2- I’m Insane
3- In Your Direction
4- You Think You’re Tough
5- Way Cool Jr.
6- Nobody Rides for Free
7- Lack of Communication
8- Lay It Down
9- You’re in Love
10- Body Talk
11- Back for More
12- Round and Round
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