No Mundo do Rock

Cabeça de chave

Única banda brasileira a ocupar posição de headliner em um festival com atrações internacionais, Planet Hemp comemora sucesso de turnê de reunião e planeja gravação de DVD. Foto: Divulgação.

planet2012Prometida há mais de três anos, a turnê de retorno do Planet Hemp está saindo melhor que a encomenda. Quando o grupo entrar no Palco Butantã do Lollapalooza no domingo, dia 31 estará, como se diz no jargão jornalístico pouco criativo, fazendo história. É a primeira vez que um artista brasileiro vai tocar como headliner em um dos palcos principais de um festival repleto de atrações internacionais. É o tal tratamento em igualdade de condições reivindicado desde o primeiro Rock In Rio, no nascedouro de eventos do gênero no Brasil. De quebra, o Planet ainda vai participar da edição americana – a original do festival – em agosto, em Chicago.

Não é só o desfecho do giro, entretanto, o motivo de comemoração. Por onde passou, desde a estreia, num Circo Voador abarrotado, no Rio (veja como foi), o Planet Hemp arrastou multidões, descobriu que tinha uma coleção de hits e viu um público renovado cantando músicas que já fazem parte do cancioneiro da música brasileira. Serviu, ainda, como reconhece Marcelo D2, o mais bem sucedido integrante em carreira solo, para acabar com as brigas entre eles, fruto de farpas soltas aqui e acolá. Foi o que ele acabou revelando nessa entrevista exclusiva.

Prestes a lançar um novo álbum solo, “Nada Pode Me Parar”, o primeiro com músicas inéditas desde “A Arte do Barulho”, de 2008, D2 espera arrematar a turnê do Planet com a gravação da íntegra de um show para o lançamento de um DVD. As cenas de bastidores ele já tem, por conta do equipamento adquirido para gravar um clipe para cada uma das músicas de “Nada Pode Me Parar”. A turnê subsequente ao lançamento começa em São Paulo e vai carregar uma loja temática do álbum para todos os cantos do Brasil. E chega de mpb: o disco novo, segundo o animado D2, é “rap, rap, rap!”. Leia abaixo a íntegra da entrevista:

Rock em Geral: Como tem sido a turnê do Planet Hemp? Melhor do que você esperava?

Marcelo D2: Foi demais, agora já estamos nos finalmentes, tem os dois Lollapalooza, o do Brasil e o de Chicago. Foi demais voltar a tocar hardcore depois de tanto tempo. O engraçado é que, na minha cabeça, o Planet não era tão pesado. Ficar sem tocar essas músicas tanto tempo – 10 anos – especialmente as do primeiro disco, e tocar isso tudo de novo e ver o sorriso de satisfação na cara da galera foi maneiro pra caramba.

REG: E que galera é essa? É gente mais nova ou o pessoal das antigas?

Marcelo D2: Depende muito do lugar, mas eu acho que em média 80% do público nunca tinha visto o show. Em São Paulo acho que 90%, porque fizemos Estância (Alto da Serra, em São Bernardo do Campo), num dia deu 13 mil pessoas e no outro oito mil, foram mais de 20 mil pessoas em dois dias, parecia até festival. Lá era muita molecada mesmo. No Recife já acho que tinha muita gente que já tinha visto. Mas basicamente 80% da galera que foi nos shows nunca tinha visto o Planet Hemp, só no youtube.

REG: Você acha que a galera vai mais pelo som ou pra poder acender um baseado e ter essa onda de liberdade?

Marcelo D2: Na época do Planet Hemp era mais isso. Fazendo uma análise de longo tempo eu acho que o Planet representava muito mais que o ato de fumar maconha. Era contravenção, xingar a polícia, mandar logo se foder todo mundo, fumar maconha, botar o dedo médio pro alto. Eu acho que com essa galera nova teve a mesma coisa de antigamente, mas tinha mais a curiosidade de ver. Eu vi muita gente assustada também, por causa das rodas abrindo, gente com cara de “o que é isso?”. Tocamos no Planeta Atlântida entre Ivete Sangalo e Michel Teló e foi foda. Não poderia ser melhor. Podiam ter botado a gente no outro dia, que era Charlie Brown, O Rappa, só que o Bernardo (BNegão) não tinha data. Como foi cancelado por causa da parada de Santa Maria, mudou a data. Foi engraçado pra caralho, depois daquela parada axé da Ivete a porradaria do Planet Hemp, e depois o Michel Teló, que eu aproveitei para sair fora.

REG: Em geral o pessoal conhece as músicas?

Marcelo D2: Eu fiquei impressionado como o Planet Hemp tem hit. Eu sempre achava que o Raimundos e O Rappa, principalmente, tinham muito mais hit que o Planet, mas eu vi a galera cantando. Uma coisa engraçada é que musicas que não eram tão hit, tipo “Raprockandrollpsicodeliahardcoreragga”, que é a maior porrada, todo mundo cantando. Eu não sabia que o pessoal cantava assim, que conhecia. Fui ver no youtube e tem view pra caralho. A coisa mais legal de tudo foi a gente voltar a se falar…

REG: Quem estava brigado na banda?

Marcelo D2: Basicamente todo mundo, ou melhor, basicamente eu com todo mundo (risos). Na verdade era eu e o Bernardo. Nem estávamos mais brigados, nos encontrávamos por aí e falávamos um “e aí, beleza?”, um “olá, tudo bem?”, mas tava distante. E agora voltamos a falar.

REG: Foi fácil lidar com isso?

Marcelo D2: Foi fácil. Primeiro me deu um receio, porque o Bernardo não foi nos primeiros ensaios, aquele jeito do Bernardo, todo enrolado com datas… Ele tava no Nordeste, sei lá, aí fomos ensaiando. Primeiro ensaiaram os três, sozinhos, o Formigão (baixo), o Rafael (guitarra) e o Pedrinho (bateria), não tinha o que eu fazer lá. Depois fomos eu e eles três, e aí quando Bernardo chegou foram dois ensaios só. Tiramos todas as músicas e quando chegou no show do Circo Voador (estréia da turnê, veja como foi), ensaiamos dois dias antes de novo para dar um gás. No ensaio já tava tudo certo, falei para o Bernardo que tava tudo certo, se tivesse algum problema pra ele falar comigo. A nossa briga foi uma besteira fodida, no final nem lembrávamos porque brigamos. Tudo isso é besteira, ainda mais quando você vai ficando mais velho.

REG: E como rolou de colocar os vídeos em todas as músicas?

Marcelo D2: Fica mais legal em lugares maiores. No Barra Music (no Rio) ficou irado, porque o telão é gigante. Como diz o Wilson (Power, DJ que abre os shows da turnê), foi a primeira roda de pogo de camisa pólo com a gola levantada (risos). Ele foi importante pra caralho, botou musicas da época que tinham a ver, uns raps no inicio, no final era Dead Kennedys. Escrevemos as músicas que iríamos tocar, e com essa lista decidimos dividir em atos, um para cada disco. O primeiro ato foi “Usuário”, o segundo, “Os Cães Ladram Mas a Caravana Não Para”, e o terceiro “A Invasão do Sagaz Homem Fumaça”. Depois até mudamos, colocamos o primeiro ato como “O Usuário e a Luta Pela Legalização da Maconha”, só pra ficar um nome maior (risos). Decidimos fazer um cenário, mas é caro pra caramba, então optamos pelo vídeo, porque nunca tínhamos feito turnê com vídeo. Foi interessante porque ajudou a contar um pouco da história. Eu já tinha trabalhado com o Apavoramento (Sound System), o Joãozinho, ele coordenou tudo, chamou a maior galera do Rio. São 27 musicas, não dava tempo de ele fazer 27 vídeos.

REG: Dessa vez teve problema de show cancelado, mandado da justiça, essas coisas?

Marcelo D2: Nada de polícia dessa vez (os integrantes do grupo foram presos em 1997, em Brasília, acusados de apologia ao uso de drogas e passaram algumas noites na cadeia). Tivemos um problema em Salvador, porque o produtor de lá não era muito confiável. Não tava indo bem as vendas, teve discussão e o show foi cancelado. Em Curitiba ia ser num festival, mas o festival foi cancelado, mudou para São Paulo e aí não rolou. Só esses.

REG: Se não teve nada de polícia é porque melhoram as coisas…

Marcelo D2: Acho que sim. Foi foda porque em cada cidade apareceram os amigos das bandas da época. Em Porto Alegre os caras o Ultramem, do DeFalla. No Recife os caras do Devotos, Mundo Livre. Os caras foram aparecendo, foi legal pra caramba reencontrar todo mundo.

REG: Vocês vão lançar alguma coisa desses shows?

Marcelo D2: Vamos gravar um DVD, sim. Devemos fazer uma data extra em São Paulo e fazer um DVD. Eu tenho coisas gravadas, comprei um equipamento porque nesse meu disco novo eu fiz um clipe para cada música, e aí eu chamei um cara para fazer um documentário da turnê. Agora precisamos de um show bem gravado, e estamos com a proposta de uma produtora de São Paulo de gravar lá, só para fechar a tampa de novo. Para ter material, senão depois você esquece o que rolou, porque não tem nada. Música nova vai ser difícil…

REG: Não rola?

Marcelo D2: Ia rolar, mas vai dar um trabalho do caralho (risos). Nego não tá muito a fim também, é meio fora de timing. O mais legal, quando nós voltamos, foi ver que tínhamos parado na hora certa, porque tem banda que começa a ficar velha que fica cover de si mesmo. Essa volta foi maneira pela amizade, a maneira de vermos que não tem essa de “acabou, nunca mais”. Vamos fazer esse DVD, esses dois shows do Lollapalooza e vamos ver qual vai ser daqui a dois, três anos, se der vontade… A nossa meta é a seguinte: cada ano que o Formigão for arrebentando, vamos fazendo um show pra ele (risos). Agora foi o rim, vamos fazer o rim do Formigão. A próxima é o fígado… (mais risos).

REG: No Lollapalooza vocês vão tocar como banda principal do Palco Butantã, depois de duas bandas internacionais e antes do Pearl Jam, no outro palco. É a primeira vez que isso acontece com uma banda nacional em um grande festival, cheio de bandas estrangeiras. Como você vê isso?

Marcelo D2: Quando começaram a nos chamar para tocar… Nós fazendo a nossa turnê, enchendo, botando 13 mil pessoas em São Paulo, para que vamos querer tocar no festival?

REG: Quando eles chamaram já tinha começado a turnê?

Marcelo D2: Não, estávamos começando a fechar as datas e não foi só o Lollapalooza que chamou. Dissemos que não íamos fazer. Aí o Planeta Atlântida fez a proposta de um bom cachê, com o respeito que tem que ser dado a banda, tudo direitinho, e decidimos fazer. O Lobão mesmo reclamou do Lollapalooza no ano passado, que não queria tocar cedo (entenda o caso). Quando o (Marcello) Lobatto (empresário) falou que o Lollapalooza estava nos chamando, todo mundo ficou amarradão, mas vamos tocar lá por quê? Só porque é o Lollapalooza? Desde a década de 90 todo mundo ouve falar no Lollapalooza, desde que começou com o Jane’s Addiction achamos a ideia do caralho. Quando o Lobatto falou com os caras, disse que queria um tratamento de banda grande, não o que é dado para banda nacional, de tocar ao meio-dia. Mesmo no Rock in Rio, eu toquei à noite (veja como foi), mas antes das bandas gringas. Muitas vezes bandas que ninguém conhece, como o Queens Of The Stone Age, que na época (2001) ninguém conhecia, tocam no melhor horário, e uma banda brasileira que tem um público do caralho toca às seis da tarde. Tipo o Black Keys, que é do caralho, eu adoro, mas falando em público, não tem. E eles toparam, fechamos e vamos encerrar um palco. Acho que é a primeira vez que acontece isso. É do caralho ver o anúncio na TV (imita a locução): Black Keys, Pearl Jam e Planet Hemp! Parece até uma banda gringa, já que o nome é gringo. E é do caralho fechar a turnê do Planet no Lollapalooza.

REG: E o lance de tocar em Chicago, era a ideia desde o começo da conversa?

Marcelo D2: Logo no começo eles falaram e nós achamos mais negócio ainda. O Planet fez pouca coisa fora do Brasil, só Estados Unidos e Portugal.

REG: E lá já sabe em que horário vai tocar?

Marcelo D2: Lá deve ser ao meio-dia e tá bom (risos). Deve ter um Planet Hemp local que tá dizendo: “não vai trazer esses caras do Brasil pra tocar no horário bom, não”.

REG: Se não fosse fechando um dos palcos, vocês não tocariam?

Marcelo D2: Não tocaríamos mesmo, queríamos ter o tratamento de banda principal, porque a projeção é outra. Queremos fazer parte do festival desse jeito, que aí vale à pena. Mas tem sido excepcional o tratamento dos caras (da produção do Lollapalooza) até agora, estão de parabéns, todo mundo legal pra caramba. Tô louco para chegar o festival, tanto aqui quanto em Chicago.

REG: A polêmica que o Lobão causou no ano passado acabou ajudando vocês a serem o headliner esse ano…

Marcelo D2: Talvez… Se ele não tivesse exigido um horário melhor… Acho que ele teve mais espaço arrumando essa confusão do que se tivesse tocado. Se ele não tivesse feito essa bagunça ninguém nem ia lembrar, caso ele tivesse tocado. Se bobear você toca num festival e ninguém lembra.

REG: O show vai ser o mesmo da turnê ou vai ter novidades?

Marcelo D2: Vai ter que ser um pouco menor, mesmo porque o nosso show tem quase duas horas, são 27 músicas. Nem dá duas horas, de show mesmo é uma hora e meia, mas dependendo do teor alcoólico acaba dando 1h45, por aí. Acho que no festival vai ser uma 1h15, vamos montar o set list no camarim, é só editar os vídeos.

REG: E o que se pode esperar do seu novo disco solo?

Marcelo D2: Esse é um disco de rap, rap, rap! Até tem música brasileira, tem até um samba, tocado, diferente dos outros discos. Mas tem bastante rap, eletrônico pra caralho, são 14 músicas com quase nada tocado, uma só tocada, o resto é tudo sampler. Deu uma trabalheira fodida para gravar essa porra toda.

REG: É uma prova de fogo, porque você vem de uma onda de misturar samba, rap e mpb…

Marcelo D2: É, não da para ficar parado, não gosto de ficar no conforto, senão acaba caindo na armadilha. Eu não posso acabar com o Marcelo D2 como acabou com o Planet. O Marcelo D2 tem que durar para o resto da vida. Então tem que se reinventar, voltar lá atrás, fazer aqui, fazer ali.

REG: Tá animado com o disco, hein?

Marcelo D2: Tô animadaço, inclusive com o momento do rap também. Estamos em um momento legal, passou um pouco daquela coisa de bandido e tal, um momento mais musical, tem muita gente ouvindo rap, tô amarradão. O disco se chama “Nada Pode Me Parar”, que é uma música do Thaíde, de 88. To vindo com gás, com vontade, quero fazer turnê nova com esse disco porque o “A Arte do Barulho” é de 2010 (na verdade é de 2008) e tô tocando esse disco até hoje. Teve o do Bezerra em 2011 (“Marcelo D2 Canta Bezerra da Silva”, 2010), toquei samba pra caralho, fiz uma turnê praticamente de samba.

REG: A turnê desse álbum vai ser com banda?

Marcelo D2: Com banda, é isso que eu tô a fim de voltar, com a minha banda. Eu vou abrir uma loja, que é o conceito do disco para receber a galera, lá em São Paulo. Vou ficar um mês em São Paulo com essa loja e depois vou viajar com ela na turnê, vai ficar uma semana em cada cidade. É loja do disco, camisa, boné, a loja “Nada Pode Me Parar”. Vou vender bottom, adesivo, moletom, relógio, roupa, tudo série limitada. Mas a loja é para mostrar o disco. Eu estou empenhado nisso, quero que as pessoas ouçam o disco. No “A Arte do Barulho” o que me decepcionou muito foi que ninguém liga mais para o álbum, então eu vou me empenhar para que ouçam o álbum. Por isso tem um clipe para cada música, para ouvir o disco inteiro, não só a música de trabalho. Eu tô montando a loja para o dia 26 de abril, que é a data que estamos pensando em lançar o disco, mas só vamos ter a data certa nessa semana.

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Comentários enviados

Apenas 1 comentários nesse texto.
  1. Natalia Antunes em março 19, 2013 às 20:07
    #1

    Ótima ideia a da loja, não vejo a hora. É uma pena porque disco “A Arte do Barulho” eu ouço todos os dias, é um dos melhores! Marcelo D2 eu espero que não acabe nunca mesmo, eu te amo muito!

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