O rei do rock
Em noite indigesta, Marcelo Nova usa o peso das guitarras para converter plateia enxuta do Circo Voador em multidão vibrante. Fotos: Bruno Eduardo.
Por isso, com as vestes pretas de sempre, ele subiu no palco disposto a honrar a alcunha mandando, de cara, “Ninguém Vai Sair Vivo Daqui”, ressalto da máxima consumação do rock pelo rock. Não se sabe se a animação da plateia é que atingiu o ex-lider do Camisa de Vênus, ou se foi ele que incendiou o público, mas a vibração parecia a de um Maracanã lotado, tudo por causa do rock. Depois de “Eu Não Matei Joana D’Arc”, Marcelo engata músicas de sua carreira solo e mostra um desprezo lobônico pelos anos 80, ao rejeitar pedidos do público; com pouca gente sob a lona, a coisa ganhou ares de intimidade. “Se a sua vida hoje está pior do que nos anos 80, você é que está muito mal”, bradou para uma incauta.
O trio que acompanha Marcelo Nova é dos bons, e o filho dele, o guitarrista Drake, impinge peso e sola feito um bebê. Em algumas músicas, pai e filho mostram um entrosamento dnático, caso de “A Ferro E Fogo”, cuja longa versão ao vivo é puro rock, e dos bons. Em “Quando Eu Morri”, outro final alongado traz evoluções instrumentais de tirar o fôlego, muito embora Marcelo amaldiçoe os “punheteiros”, numa referência a músicos virtuosos que têm mais técnica do que feeling. Na banda dele, as duas coisas parecem se fundir na medida certa, e o resultado, como atesta o próprio, é bom. “Me desculpe quando a gente se empolga, mas é que a gente é bom pra caralho”, diz, comemorando 32 anos de estrada.
A verve do músico baiano é um de seus maiores trunfos, seja em tiradas entre as músicas, ou em letras impagáveis, como a de “Ela Me Trocou Por Jesus”, quando promete dar um chute na bunda de um Jesus Ricardão. O deboche à religião está também no grande sucesso dele com Raul Seixas, “Pastor João e a Igreja Invisível”, na qual o músico revela ser ele o verdadeiro Padre Marcelo, não “aquele bunda mole da TV”. É essa música, no encerramento, depois de quase duas horas de um empolgante show de rock, que Arnaldo Brandão participa tocando baixo. Marcelo não perde a oportunidade de distribuir “água benta” para fãs que se jogam atrás da dádiva alcançada na beirada do palco. Azar de quem não foi.Na abertura, Arnaldo Brandão mostrou músicas de sua carreira solo e sucessos que se tornaram hits com outros artistas. Mesmo sofrendo com um público ainda mais reduzido que o de Marcelo Nova, cascudo, não se intimidou, em uma banda sem guitarras e com o tecladista The Alberto segurando as pontas. Brandão compensou muito bem a falta do instrumento em um solo espetacular em “Ideologia”, aquela mesmo de Cazuza. No repertório mais recente, passeia por várias correntes da música, como, aliás, sua carreira é pautada. “O Ano do Dragão” é um rock tenso; “Assistindo TV”, um reggae; e a boa “Dinheiro” tende para o ska. O show termina com a intervenção performática dos poetas Tavinho Paes, parceiro de longa data de Arnaldo, e de Bia Provasi. Boa abertura.
Set list completo Marcelo Nova
1- Ninguém Vai Sair Vivo Daqui
2- Eu Não Mateu Joanna D’Arc
3- Faça a Coisa Certa
4- Hoje
5- Cocaína
6- O Mundo Está Encolhendo
7- Século XXI
8- Bomba Relógio Ambulante
9- Old Man Blues
10- A Ferro e Fogo
11- Quando Eu Morri
12- Ainda Não está Escuro
13- Ela Me Trocou Por Jesus
14- Rock N’Roll
15- Simca Chambord
16- Pastor João e a Igreja Invisível
Tags desse texto: Arnaldo Brandão, Marcelo Nova
Pobres daqueles que apesar de votarem em Freixo preferem música de gosto duvidoso!