Destoou
Noite de domingo do Abril Pro Rock não repete o sucesso de público do festival, mas também não tira o brilho da boa 20ª edição. Fotos: Rafael Passos/Divulgação.
Outro bom show, mas com poucas testemunhas, foi o do Strobo, um estranho duo de Belém com um baterista e um guitarrista que não se faz de bobo como Jack White e esmerilha o instrumento o tempo todo. Léo Chermont é o sujeito das seis cordas e milhares de efeitos sampleados, que, no entanto, não subtraem a pegada rock do projeto. Rock o modo der dizer, já que o duo e envereda pelo fusion, jazz e world music, mas discretamente. Chermont bebe em fontes que vão de Joe Satriani a Dick Dale; só falta ele meter a mão na cumbuca da guitarrada pra ver no que dá.
Coube ao Mundo Livre reunir a maior quantidade de público, num show repleto de referências ao aniversário de 20 anos do Abril Pro Rock. Assim como o de Otto, já que eles estavam lá quando tudo começou. Nos intervalos, um vídeo da primeira edição do festival mostrava Otto batendo tambor nos shows de Chico Science e de Mundo Livre. Com o show do novo álbum, Fred 04 tenta se afastar um pouco da sonoridade do Jorge Ben (sem o Jor) com uma nova banda cuja ênfase está numa interferência maior dos teclados. Funciona bem, embora o grande trunfo da banda ainda sejam a verve e as boas sacadas de 04. Não é qualquer um que tem a manha de compor uma música chamada “Ela é Indie” impunemente.Num caminho diverso, Otto, embora tenha uma banda numerosa, tem o show calcado nas estripulias do guitarrista Fernando Catatau e em sua performance sexy deprê de cabaré, que – incrível – costuma seduzir as moças. “Tem o Paul, tem o Chico e tem o Otto”, disse o cantor, para um público mirrado, numa referência aos outros dois grandes shows do domingo no Recife. Esperto, o músico joga os dados em vários flancos: no reggae/ska “Ciranda de Maluco”, levanta o público, e, em “Cuba” (aquela do verso “malandro que é malandro”) tem a participação de Gilmar Bola 8, na Nação Zumbi, grande ausência nos 20 anos do APR.
O palco ficou lotado com os americanos do Antibalas, que investe pesado no afrobeat de Fela Kuti. Uma mistura de músicos latinos com outros de origem africana – ou, no mínimo, descendência – garante o suingue cuja base é o funk de raiz americano. O super grupo revive os bons tempos dos bailes funk que foram ofuscados nas últimas duas décadas pela música de baixo nível que acabou levando o mesmo nome, nos morros do Rio. Uma verdadeira aula de bom gosto e música bem feita, quase o tempo todo instrumental. O elegante Ska Maria Pastora, do Recife, tem lá suas semelhanças, mas a matéria-prima é o rock steady. Formado por músicos cascudos de outras bandas/artistas, foi outro que sofreu com a falta de audiência.Mais uma invenção sem razão de ser da Rua Augusta, Leo Cavalcanti tocou por cerca de uma hora sem mostrar uma única composição interessante. Se esforçando para “parecer artista”, o cantor sobreviveu mais pelos devaneios de seu guitarrista do que pela música insossa e sem importância que faz, numa apresentação terrível. Só não foi o pior da noite por causa do final melancólico proporcionado pelo Buraka Som Sistema, que, já na madrugada de segunda, encontrou reflexo em alguns gatos pingados. Um grupo de discoteca como esse (tanto faz se é kuduro, funk…) deve se confinar ao vazio das tendas eletrônicas, jamais no palcão de um festival de duas décadas como o Abril Pro Rock.
Marcos Bragatto viajou ao Recife à convite do festival.
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