Fazendo História

Mark Knopfler
Simplicidade e volta ao passado

O dia em que o guitarrista do Dire Straits foi entrevistado com um copo de uísque na mão. Matéria publicada na Dynamite 76, de setembro de 2004. Foto: Marcos Bragatto.

markknopflerEle não é mole, não. Durante cerca de 18 anos, esteve à frente do Dire Straits, uma banda cujo nome até virou motivo de piada no underground, mas que aparece no topo de todas as votações de artistas preferidos pelo público nas três edições do Rock in Rio, em 1985, 1991 e 2001. Em 84, o Dire Straits foi eleito a banda do ano pela saudosa Flu-FM, que na época era quem dava as cartas no pop rock nacional. Ainda na banda, compôs trilhas sonoras para diversos filmes, e, depois, em carreira solo, lançou dois discos e esteve no Brasil em 2001, onde fez apresentações lotadas no Rio e em São Paulo. Isso além de ter fundado o grupo Notting Hillbillies, em 89. Estamos falando – você já percebeu – de Mark Knopfler.

A propósito do lançamento de “Shangri-la”, seu terceiro trabalho solo, conversamos com o guitarrista por telefone, direto de Londres, numa chuvosa manhã no inverno brasileiro. “Me desculpe pelo atraso, estive falando sobre guitarras com outras pessoas”, ele se explica quando o repórter atende, com uma voz arrastada que dá a entender que Knopfler tem um copo de scotch ao alcance.

O disco sai no Brasil agora me setembro, mas a Dynamite teve acesso a uma (única) audição do material, cuja atmosfera lembra, e muito, o álbum homônimo que marcou a estreia do Dire Straits, lançado em 1978. “Não tinha pensado nisso, mas eu entendo o seu ponto de vista”, responde o guitarrista sobre a comparação. “É porque são só os caras tocando e nada mais, uma coisa bem simples. Gravamos tudo só com um set de bateria, um baixo, uma guitarra acústica, um só microfone, um órgão Hammond e alguns teclados. Essas foram as nossas armas: nenhum sintetizador, nenhum overdub”, conclui.

Além de simples, “Shangri-la” é um disco calmíssimo, com levadas das mais leves, quase nenhuma distorção e bem lento. Mas o estilo inconfundível de Mark Knopfler está lá, aquele dedilhar de guitarra que parece surf music, country, new wave, ou tudo isso junto. O disco leva o nome do estúdio onde foi gravado, em Malibu, Califórnia, o mesmo usado no passado por Bob Dylan. “Há uma música no disco com esse nome, que é sobre viver um presente nostálgico. Quase todo o tempo nós ficamos projetando o futuro, mas decidimos olhar um pouco para o passado com esse projeto”, explica Knopfler.

Algumas músicas tem certa “latinidad”, como “Postcards From Paraguay” e “Don’t Crash The Ambulance”, que parece ter saído do documentário “Buena Vista Social Club”, de Win Wenders (“na verdade lembra pessoas como Hank Morton”, músico jazzista, discorda Knopfler). Outras são mais densas e soturnas, como “Boom Like That”, e há uma terceira parte que remete diretamente ao início do Dire Straits. “The Trawlerman’s Song”, por exemplo, é a nova “Water Of Love”, e “Sucker Row” não destoaria se tivesse sido gravada em 1978.

Logo a conversa descamba para as belezas naturais do Rio, e Mark Knopfler quase vira o entrevistador, querendo saber de tudo e se decepcionando com o frio carioca. Mas por que, então, o Dire Straits foi convidado tantas vezes para tocar aqui e ele só veio com a banda solo? “Eu sei lá porque isso nunca aconteceu. Eu adoro a cidade e vou voltar aí, só não sei quando”, garante.

Quanto às trilhas que compunha, Mark Knopfler não parece muito animado: “Eu não sei se posso fazer isso de novo, talvez eu sinta como se não fizesse esse tipo de trabalho muito bem. Eu provavelmente seja melhor fazendo novas músicas, não uma trilha”. O que dizer então das ótimas trilhas para os filmes “Local Hero” e “The Princess Bride”?

Falar sobre si próprio também é difícil, mas ele arrisca definir o típico som que há anos tira da guitarra: “É só empurrar e tocar as cordas com os meus dedos e tudo acontece. Eu sempre faço isso erado, é assim que eu toco, quase sempre errado. Se eu tivesse um professor de guitarra e ele dissesse ‘você está fazendo errado’, eu estaria no caminho certo”. Já pensou se ele fosse certinho?

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