Fazendo História

Cássia Eller
Veneno Antimonotonia
A entrevista

Matéria sobre o lançamento do álbum-tributo a Cazuza. Publicado no Jornal Nação Brasil número 101, de setembro de 1997. Foto: Marcos Bragatto.

cassiaellerCássia Eller apareceu no cenário pop nacional em uma época em que muitas outras cantoras também surgiram. Mas, desde o primeiro álbum, no qual aparece literalmente chutando o balde, ela se diferencia por uma postura voltada essencialmente ao rock.

Fã do rock brasileiro dos anos 80, ficou conhecida pela regravação de “Por Enquanto”, de Renato Russo, gravada originalmente pela Legião Urbana. Depois se seguiram outros três álbuns, sendo o de maior sucesso um acústico, e novas versões para RPM, Paralamas, Barão Vermelho, etc.

Agora, lança “Veneno AntiMonotonia”, uma espécie de tributo só com músicas de Cazuza, metade com o Barão e metade sem ele. Mais rock do que nunca, Cássia imita quem ela sempre quis ser, sem, porém, perder o seu próprio estilo. Sucesso garantido, com mais de cem shows antecipadamente agendados, Cássia Eller conversou com Marcos Bragatto, do Jornal Nação Brasil.

Como foi que você resolveu que seria cantora, e que associação, no início, você teve com o rock?

Eu comecei cantando lá em Brasília. Trabalhei com o Oswaldo Montenegro, com ópera, como corista, fiz backing vocals, trabalhei com grupo de forró… já fiz de tudo. Depois formei uma banda de rock, mas não deu muito certo. Quatro anos depois eu resolvi fazer um repertório, uma banda para cantar em bar. Porque lá em Brasília, os bares não aceitavam nada que não fosse bossa nova, e eu não tenho muito jeito pra isso. Comecei a cantar música de Arrigo Barnabé e Itamar Assunção. “Por Enquanto” é uma música que eu canto desde essa época.

Onde estava a Cássia Eller quando o Barão Vermelho começou a carreira, no início dos anos 80?

Gostava demais do Barão, era a maior fã. Todas às vezes que eles iam tocar lá em Brasília eu assistia aos shows. Eu cantava principalmente os blues do Cazuza, “Eu Não Amo Ninguém”, “Blues do Iniciante”. Foi o jeito de cantar do Cazuza que me deu coragem. A primeira vez que eu ouvi ele cantando “Down Em Mim”, eu falei: “Pô, esse cara canta que nem eu, gritando. Se ele pode eu vou parar de estudar e vou gritar também!”

Como rolou de fazer esse álbum, que podemos chamar de um tributo a Cazuza/Barão Vermelho?

É, é bem um tributo mesmo. Quando eu conheci a Lucinha (Lúcia Araújo, mãe de Cazuza), uns quatro anos atrás, ela me deu a música “Malandragem” e falou, de bobeira: “Por que você não grava um disco só do Cazuza?”. Eu não levei aquilo muito a sério, era uma coisa que eu sempre quis fazer, mas achei que não ia dar certo. Aquilo ficou na minha cabeça, até que eu conheci o Waly Salomão (diretor do projeto) no início do ano, e ele disse que tinha lido que eu queria gravar um disco só do Cazuza. Ele deu força e daí a poucos dias dessa conversa, a gente já estava dentro do estúdio gravando; foi tudo muito rápido.

Como foi a seleção das músicas? Ficou alguma coisa de fora?

O meu primeiro critério ao fazer uma lista de prováveis músicas foi exatamente o de não colocar hits, porque seria muito fácil. Aí mostrei para o Waly Salomão, e ele perguntou logo: “Cadê ‘Bete Balanço’? Cadê ‘Brasil’? Não senhora, não é assim, não, você está sendo radical”. Aí eu fiz outra lista só de hits, depois outra com coisas da época do Barão, uma outra da fase Cazuza solo… no final misturei tudo até chegar a essas 14 do disco. “Só Se For a Dois” e “Trem Para as Estrelas” nós gravamos, mas não entraram.

Você não pensou em convidar alguém do Barão para participar do CD?

A princípio eu pensei no Frejat para produzir o disco, mas eu não queria nada que fosse muito próximo do Cazuza, para não ter nenhuma ligação com ele que não fosse a minha. Eu na verdade nem conheci o cara, mas eu queria ser ele, queria me transformar nele. Antes mesmo de ele ter morrido ou ficado doente, eu já sentia uma afinidade muito grande com ele. Eu achava que o meu jeito de cantar era parecido com o dele, e eu ainda procurava imitá-lo cantando. Também, eu achava divertida a forma como ele levava a vida, e o imitava até nisso. Ele era um cara que eu admirava pra caramba. Eu queria muito conhecê-lo. Teve uma vez em que eu estava hospedada no mesmo hotel que ele, lá em Belo Horizonte. Eu fiquei andando pelo corredor, no andar do quarto dele, pra ver se ele passava, mas nada aconteceu. Teve um dia que, em um show da Ângela Ro Ro no Morro da Urca, eu pedi para um cara me apresentá-lo. Mas não aconteceu nada; falou: “E aí, tudo bem?” e foi só. E esse trabalho também é uma homenagem ao Barão Vermelho, não só ao Cazuza, e não tinha a ver o Frejat participar.

Depois de fazer um trabalho acústico, esse álbum pode ser considerado a volta ao bom e velho rock’n’roll?

Na época eu tinha conhecido o Serginho Serra, e gostei muito do jeito de ele tocar violão. Eu larguei a turnê do terceiro álbum só com dez shows e resolvi fazer um show com o Serginho e com o Walter Villaça, que desde então é quem está comigo, e deu certo pra caramba. Eu fiquei quase três anos fazendo esse show, e começou a me dar saudade de banda, de rock. Eu fui convivendo muito com o Waltinho, grande roqueiro e guitarrista, aliás, o melhor com o qual eu já toquei. A gente ia muito a shows e tal, e ele tem uma banda que se chama A Bruxa. Resolvemos montar uma banda de rock, e depois que conhecemos o Waly, resolvemos trabalhar em cima da obra do Cazuza.

Você não temeu uma repulsiva dos fãs de longa data do Barão?

Eu sabia que estava formando uma bela banda de rock. Quando decidimos que era Cazuza, a gente já estava mais ou menos ensaiando em casa. Quando eu falei que seria Cazuza, todo mundo gostou. Nós fomos fazendo os arranjos sem a preocupação de fazer dessa ou daquela maneira – a coisa foi saindo. Nós tivemos só cinco ensaios pra gravar o disco, tirando e arranjando as músicas. Foi super rápido, não teve dificuldade nenhuma, porque a banda, na realidade, é muito boa.

Você tem outros projetos semelhantes a este?

Eu já pensei no Renato Russo, Luiz Melodia. Fazer um disco ou um show só com coisas da Marina, são pessoas que eu gosto pra caramba. Eu to descobrindo um monte de coisas bacanas do Lobão

Você acha que pode seguir essa linha e só fazer tributos desse tipo?

É tão difícil a gente montar um repertório novo. Eu sou muito preguiçosa pra trabalhar. Na maioria das vezes eu só trabalho sob pressão. Então, quando tá chegando perto da época de entregar um trabalho para a gravadora é que eu começo a ligar para as pessoas para pedir música. Acaba rolando só umas duas ou três, e o resto é uma correria só. Agora eu tô escolada, já estou prevendo um disco pra o ano que vem só com músicas inéditas, já estou com seis músicas prontas, já pedi pro Nando Reis, Frejat, Lulu Santos. Vou pedir uma para o Itamar Assunção também; o Arnaldo Antunes já me deu uma… Esse negócio de fazer um disco de uma obra já pronta, por um lado é muito mais fácil pra mim. Eu gosto também de fazer arranjos novos para músicas já conhecidas, eu acho que esse é o meu forte.

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