Rock é Rock Mesmo

Repatriamento feliz

Lembranças de muito trabalho dos dias em que tudo, no mundo, foi rock; os erros e acertos da edição que marcou o retorno do Rock In Rio às suas origens, e que já se salienta para 2013

Meus amigos, o que é natureza. E o que é a Cidade do Rock, hein? Que coisa mais linda. Digo não o Rock In Rio em si, mas a Cidade do Rock, um parque espetacular em todos os sentidos, de uma lindeza só. Mesmo os que têm suas reservas em relação ao Rock In Rio – eu também tenho as minhas – precisam reconhecer a beleza da Cidade do Rock. Uma obra de engenharia, arquitetura e urbanismo de fazer inveja a qualquer bambambã de uma dessas áreas. O design das torres, a grama sintética verdinha, o piso com o bom e velho bloco de concreto 16 lados (será que foi fabricado pela uni Stein?), e o palco… Que palcaço, hein? Não sei se os amigos reparam no Palco Mundo, mas a iluminação utilizada ali eu nunca vi em lugar nenhum. Em vez dos tubos metálicos com as luzes, instalações discretas e muito mais eficientes, em cores e disposições. As bandas que souberam utilizar todos os recursos de iluminação arrebentaram. Lembro ao menos de duas: Coldplay, um esplendor, e System Of A Down, pautado pela simplicidade. E a tal Rock Street? Que coisa linda, pena que não dá pra ficar lá perambulando…

Mas não quero aqui, agora, falar de shows. Disse que a Cidade do Rock é uma maravilha e já volto atrás. Porque existiram, nesse Rock In Rio, ao menos, duas Cidades do Rock. Uma é essa maravilhosa que eu estava falando, e, a outra, a que encontrei quando saí da sala de imprensa para assistir ao show do Guns N’Roses, na alta madrugada de segunda, sob chuva. Parecia tudo destruído. As instalações, positivamente, não resistiram a uma chuva que nem foi tão forte assim - não cai chuva forte durante o início da primavera, só no verão. O palco estava completamente alagado e poderia, inclusive, causar a morte de um músico ou roadie, eletrocutado. Por isso disse que a banda de Axl Rose, notório chiliquento, fez o show na raça. E fez mesmo. Mas não quero falar de shows. Com a chuva, salientou-se um piso desnivelado e uma drenagem ineficiente. Por isso tudo, a vibe, ótima da outra Cidade do Rock, a ensolarada, era péssima no show de encerramento, que apontou para um amanhecer que era para ser resplandecente, mas foi melancólico.

Mais cedo, no mesmo domingão, com céu claro, uma salva de fogos foi detonada por trás do Palco Mundo. Era para comemorar que os patrocinadores masters, aqueles que colocam o dinheiro de verdade, haviam topado oficialmente fazer a edição de 2013 do Rock In Rio. Era pedra cantada, mas você sabe, enquanto alguém não aparece para coçar o bolso a coisa não é garantida. Parece que ali, dentro da área vip que recebeu 4 mil convidados por dia, começou a edição de 2013 e esqueceram que havia a de 2011 para terminar. Que nossos engenheiros e arquitetos pensem em saídas para a Cidade do Rock ser também à prova d’água, e que façam a manutenção direitinho, mesmo porque trata-se de uma instalação que pertence à Prefeitura, que investiu ao menos R$ 40 milhões, fora outros patrocínios e apoios de empresas municipais como a Comlurb, que recolheu 331 toneladas de lixo durante os sete dias.

A Cidade do Rock é, na verdade, o Parque Olímpico Cidade do Rock, um aparelho que faz parte do caderno de encargo das Olimpíadas. O primeiro deles a ficar pronto, aliás. Digo isso não como uma atitude denuncista, mas com orgulho de saber que o Poder Público está investindo no entretenimento, na diversão, na música e – por que não? – no rock. Não sei se os amigos sabem, mas está na Constituição. É obrigação do Estado promover políticas públicas para a cultura, onde a música e o rock se inserem, e muito me agrada quando isso acontece. Há os que argumentam que a prioridade deve ser investir em áreas básicas como educação, saúde e segurança, mas tem que ser tudo ao mesmo tempo. Como diz a música dos Titãs, “a gente não quer só comida, a gente que comida, diversão e arte”. Há também os que dizem que o fomento da cultura deve acontecer no dia-a-dia, e não num evento grandioso como o Rock In Rio, no que eu retruco: não pode ser as duas coisas juntas? Uma coisa não elimina a outra, meus amigos. Não, não vou votar no Eduardo Paes por causa disso, mas que ele acertou ao repatriar o Rock In Rio, não tenho a menor dúvida.

Disse que precisam resolver os problemas da drenagem da Cidade do Rock, assim como, da primeira semana para a segunda, resolveram o dos banheiros. As corredeiras de xixi do primeiro final de semana faziam lembrar os abundantes lençóis freáticos de urina do pioneiro Rock In Rio de 1985. Reparei também no despreparo das atendentes que demoravam séculos para passar o cartão ou dar o troco nas filas para comprar chope e comida. É preciso automatizar e treinar mais esse pessoal, afinal, são 13 mil funcionários temporários que trabalham em sete dias só. Achei graça de quem colocou a boa no trombone ao receber um dos 448 mil hambúrgueres vendidos durante os sete dias de festival com o recheio frio. Quantas vezes estamos num restaurante e pedimos para o garçom dar “uma passadinha a mais” no bife? E isso lá é notícia? Se todos os problemas fossem esse, estaria tudo resolvido.

E os furtos, hein? Na última notícia que vi, totalizaram 860, nos sete dias. Ora, meus amigos, num universo de 700 mil pessoas (fora 28 mil convidados e 13 mil funcionários), isso significa 0,12%. Convenhamos que não é representativo. Proporcionalmente, a Cidade do Rock teve menos mãos leves do que o comum numa cidade como o Rio de janeiro. Admito que é fácil falar isso quando não fui eu um dos que teve carteira ou celular furtado, mas o fato é o fato. Zero vírgula doze por cento é um índice a ser comemorado e deveria ganhar manchete como uma boa notícia, mas jornalista nunca foi bom em números mesmo, né? E é bom lembrar que não aconteceu uma briga sequer – nem no show do Red Hot, lotado de playboys – e que, de acordo com dados oficiais, 99% dos 8,6 mil atendimentos médicos foram resolvidos in loco. Digo isso porque fui cobrado, durante a cobertura-de-um-homem-só (com a ajuda preciosa de Luciano Oliveira, o fotógrafo número 1 do Rock em Geral) que fizesse esse tipo de verificação. Aí não dá, né meus amigos?

Estou dizendo isso e parece coisa de imprensa chapa branca, mas não posso ignorar os fatos. A lupa que procura falhas, se não as encontra, deve revelar o que achou. O Palco Sunset, por exemplo. Na maioria das vezes os tais encontros não funcionaram. Ou as bandas não ensaiavam o suficiente ou sequer faziam o encontro, com cada artista tocando separadamente. Fora a falta de organização que não conseguiu cumprir os horários a ponto de alguns shows do Palco Mundo acontecerem junto com os do Sunset, uma vergonha. E fora que o som, uma perfeição quase todo o tempo no Palco Mundo, era terrível na maior parte do tempo no Sunset. O dia do metal foi o pior deles, queimou filme de grandes artistas sem dó – veja mais aqui. Por isso eu proponho o fim do Palco Sunset, e que ele passe a ser um palco de artistas nacionais de nível intermediário, sem essa patacoada de “encontros”, e com boa estrutura técnica, para não virar o patinho feio que foi esse ano.

Falo do Rock In Rio e já sinto falta do festival. Nem me recuperei das noites seguidas dormindo de duas a três horas - e olhe lá - e já quero outra primavera de rock. Ligar a TV na segunda à noite e ver uma repórter ordinária falando por quase cinco minutos de Motörhead, Slipknot e Metallica não tem preço. Porque, assim como em Copa do Mundo só se fala em futebol, durante o Rock In Rio só se falada de rock, do chiclete à coca-cola, do Jornal Nacional à Igreja evangélica. Chega logo, 2013, chega!

Até a próxima, e long live rock’n’roll!!!

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Comentários enviados

Existem 3 comentários nesse texto.
  1. Dimitri Alcantara em outubro 8, 2011 às 15:40
    #1

    Belo texto, só acredito que algumas falhas na execução do projeto de engenharia causaram alguns problemas. Mas o projeto, a idéia, está muito boa sim, mas se você não executa bem esse projeto… Por exemplo: 1) Rock Street, você viu a quantidade de poças de água por causa da chuva? Um caimento adequado no piso levando para um dreno evita aquilo. Eu gostei muito da experiência de ir no meu primeiro Rock in Rio, e estarei lá novamente em 2013! Grande abraço!

  2. Jullian Ventura (@jullianventura) em outubro 8, 2011 às 16:40
    #2

    Mais um puta texto seu Marcos! Sinto falta de matérias assim onde o escritor ora se envolva e ora seja imparcial (cada um tem sua hora). Estive no dia do metal no Rock in Rio e vi vários problemas os quais você citou, o palco Sunset estava uma vergonha no começo, era impossível ouvir o Jimmy (Matanza), no show do Korzus ficou descente o som, no show do Angra ficou ruim ao ponto de eu me interessar em comer um hamburguer e encarar um fila de 1 hora e 40 minutos pra comer um hamburguer que parecia ser um hot pocket! Na fila do Bob’s tinham poças gigantes (no dia nem choveu! ãh?), mas sinto falta de por um dia estar em um mundo que só existia Rock, sinto falta também dos perrengues pra chegar, da fila pra entrar e pra comer, das dores nas pernas por ficar em pé e no final ser presenteado com o show do Metallica (quem dera que meus fins de dia fossem assim)… que venha 2013!

  3. Lana Ramôa em outubro 9, 2011 às 8:37
    #3

    Bom texto, Marcos.

    Só tem um detalhe que pra mim, em termos logísticos do evento, não pode ser desconsiderado: o transporte.

    O transporte piorou muito da última edição para essa.
    Na edição anterior, os ônibus saiam de diversos bairros, por um preço totalmente acessível, e deixavam todos no mesmo estacionamento.
    Nessa edição, um ônibus por R$35, saindo de alguns poucos bairros, que não teve mais passagem para comprar em poucos dias…
    Quem não conseguiu esse luxo? Que ande, ande e ande, pegue um ônibus pra Alvorada e se vire por lá…
    Muito desrespeitoso com quem não pagou menos do que R$ 95 em um ingresso…

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