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Vivos e mobilizando multidões

Tom “chapa branca” de “Pearl Jam Twenty” não subtrai a emoção da trajetória da mais representativa banda revelada no grunge de Seattle. Fotos: Divulgação.

pearljam20-2Um tímido vocalista canta, de cabeça baixa, a música “Alive”, trajando uma calça xadrez e um blazer sobre uma camiseta do The Cramps, num show de rock que acontece naquele dezembro de 1990. Ele enviou uma fita cassete gravada depois de pegar uma série numa praia da costa californiana, ainda com os pés cheios de areia. Quando viu, tinha se mudado para a isolada Seattle, onde o improvável aconteceria: ele iria se tornar o líder de uma das maiores bandas de rock em todos os tempos. A cena registra um sem jeito Eddie Vedder, no segundo show do Pearl Jam, e aparece na parte inicial de “Pearl Jam Twenty”, documentário passa a limpo os 20 anos de carreira do grupo.

O filme, dirigido por Cameron Crowe, que na época do estouro do grunge era repórter de música e de certa forma viveu o período de perto, tem roteiro bem elaborado e, apesar da tendência “chapa branca”, revela passagens das mais interessantes da carreira do grupo, sem abdicar da emoção inerente ao rock e suas histórias de bastidores. Crowe, o mesmo do brilhante “Quase Famosos”, deixa Vedder emocionado quando, no meio de uma das entrevistas feitas para o filme, lhe devolve a fitinha cassete que mudou o rumo das coisas. O diretor sabe muito bem como captar a emoção dos integrantes da banda, sem ser piegas.

Só que a história de Vedder e do Pearl Jam não deveria mesmo ter sido assim. A figura central do rock de Seattle era Andy Wood, líder do Mother Love Bone, banda da qual faziam parte Jeff Ament e Stone Grossard, respectivamente baixista e guitarrista fundadores do Pearl Jam. O filme mostra Wood como um rockstar vocacional, carismático e que desejava, segundo ele próprio, tocar para grandes arenas. Ele aparece em cenas de rock’n’roll explícito usando uma indumentária identificada com os medalhões do hard rock da época (antes do termo grunge ser criado, as bandas de Seattle eram chamadas de “novo metal”). O vocalista, no entanto, morreria precocemente após uma overdose de heroína, em março daquele mesmo ano, depois de passar alguns dias em coma, instalando um baixo astral geral na embrionária cena. O que era sonho dele, Vedder, com o Pearl Jam, conseguiu: mobilizar multidões.

pearljam20Inevitavelmente o longa esbarra no grunge e na cena de Seattle. Primeiro com Chris Cornell, o vocalista do Soundgarden que, arrasado com a morte de Andy Wood, desanda a fazer músicas que seriam gravadas sob o nome Temple Of the Dog, com os ex-integrantes do Mother Love Bone e futuros Pearl Jam. Cornell é apontado no filme como a cara local que recebeu o forasteiro Vedder e o fez se sentir à vontade para liderar o Pearl Jam. Depois, com o estouro mundial do grunge, é Kurt Cobain que aparece falando de uma rivalidade pouco levada a sério entre Pearl Jam e Nirvana. Kurt espinafra o PJ e depois volta à trás, e sua morte, também precoce, é motivo de consternação geral. A alternância de depoimentos gravados por integrantes da banda para o filme, com declarações de época, dá uma boa dinâmica ao filme, coisa de Cameron Crowe. O guitarrista Stone Grossard é o que se sai melhor contando as entranhas do grupo, contrastando com o tom de guru/hippie/transcendental de Eddie Vedder.

Passagens marcantes da carreira do PJ refrescam a memória dos mais antigos e servem de verdadeira aula para os mais jovens. A campanha de boicote à Ticketmaster, empresa que monopolizava a venda de ingressos para shows nos Estados Unidos, para conseguir preços mais em conta; a tragédia com mortos durante o festival de Roskilde, na Dinamarca; a tentativa de invasão da casa de Eddie Vedder, por uma picape em alta velocidade, que se esborrachou no muro; a impagável animação em que o vocalista do Creed, Scott Stapp, briga com Eddie Vedder sobre a propriedade da voz deles, que seria uma só… está tudo em “Pearl Jam Twenty”.

Como documentário “chapa branca”, entretanto, falta o outro lado. Não há, por exemplo, depoimentos da crônica musical que expliquem os motivos do sucesso do grupo e o situe num contexto histórico-musical. Do imbróglio com a Ticketmaster, não é mostrado o legado, não se arrisca dizer quem tem razão ou se o Pearl Jam, hoje, continua adotando a mesma postura de exigir que preços justos de ingressos sejam cobrados em seus shows, incluindo aí outros países. O roteiro também passa batido pela enxurrada de álbuns ao vivo lançados pelo grupo em 2000, no intuito de competir com a crescente pirataria. Será que deu certo?

Fatos que não obscurecem os méritos do filme. Para os fãs, então, nem se fala. São muitas as imagens raras e outras de DVDs já editados pela banda. A fase mais recente é passada com mais rapidez, mas temas como a aversão ao sucesso, o desgaste na mídia, o quase fim do grupo e a atividade nesses 20 anos apontam o Pearl Jam como uma banda “imprevisível” e “singular”. A intensidade da sequência final, espécie de síntese do longa, ao som da mesma “Alive”, que acanhava Eddie Vedder no início, não deixa dúvidas. Eles permanecem vivos.

“Pearl Jam Twenty” estreia será exibido nos cinemas brasileiros no próximo dia 20. Clique aqui para ver a lista de cinemas que exibirão o filme.

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