Som na Caixa

Sepultura

Kairos
(Nuclear Blast/Laser Company)

sepulturakairos1Talvez este seja o melhor momento do Sepultura na fase Derrick Green, já que o grupo conseguiu se cercar de boas condições: uma nova gravadora, de projeção mundial (Nuclear Blast); um bom estúdio (Trama, em São Paulo); e, sobretudo, um excelente produtor, Roy Z. Era preciso um sujeito de renome internacional (e capacidade) para dar ao Sepultura a sonoridade pesada contemporânea que outros grupos do thrash, como Destruction, Kreator e Exodus, vinham obtendo, mas o Sepultura, justo ele, não. Os discos mais recentes não tinham, positivamente, a pegada indispensável a um grupo de música pesada.

Nada teria funcionado, no entanto, sem um bom material a ser gravado. Ou seja, boas músicas. Não que as faixas estejam todas num patamar diferenciado – há altos e baixos no disco -, mas o chamado conjunto da obra funciona, e muito bem. Talvez o que emperre o processo criativo do Sepultura seja a insistência em fazer álbuns temáticos, com músicas fechadas num conceito inspirado em histórias épicas ou mesmo na dele próprio. É o caso deste “Kairos”, cujo título, que carece de explicação, não pega bem. Ademais, essa nunca foi uma característica do thrash metal, e, em vez de ajudar, pode aprisionar o modo de compor num único formato. Do lado de cá da vitrola, entretanto, não é necessária uma preocupação tão amiúde. O importante são os arranjos pesadíssimos, as guitarras lá em cima e uma pegada de bateria de impressionar que reforça bases igualmente pesadas em - repita-se – boas músicas.

Não é comum usar o adjetivo “pop” em se tratando de música extrema, mas como encarar uma canção grudenta como “Born Strong”, com refrão e solo colantes e um andamento de levantar defunto? A faixa é digna das composições clássicas do Sepultura, sem, no entanto, cheirar a mofo. Derrick Green impinge seu estilo firme, grave, marcante e poucas vezes reconhecido, sempre fadado às inevitáveis comparações com fantasmas do passado. A excelente faixa-título, cadenciada, pesada e com um inspirado solo de Andreas Kisser, é outra que merece destaque. O guitarrista ainda intervém com boas evoluções em todo o andamento da música, cujo refrão sintetiza o tal conceito do disco. É importante frisar que Andreas, do ponto de visa da inventividade e dos arranjos, não se prende a formatos padronizados da música pesada, o que explica, para os mais ranzinzas, a livre circulação do músico nos mais variados palcos da música brasileira.

Talvez por conta disso mesmo “Kairos” não se prenda às raízes do thrash, tampouco busca referências batidas no regionalismo folclórico e estéril. É um disco de thrash metal, sim, com as sempre bem sacadas referências do Sepultura, mas de forma sutil. E se o conceito é a própria história do Sepultura, fica fácil identificar a coisa também no plano musical. Impossível iniciar a audição do CD sem bater cabeça com os riffs pesados e repetitivos à Helmet de “Spectrum”, que abre o disco num tom soturno. Ou na irmã gêmea dela, “Dialog”, outra pinçada do metal bate-estacas com a propriedade de quem esteve lá. “No One Will Stand” é um hardcore de abrir roda em show, com bateção de cabeça embutida, e a ótima “Just One Fix” guarda para o final um andamento de guitarra para fã de Slayer nenhum botar defeito. A mais tensa e urgente de todas é “Seethe”, na qual Andreas debulha a guitarra sem dó, com a concisão que a música, a menor do disco, exceto as vinhetas, exige.

Nas faixas bônus, a versão de “Firestater”, do Prodigy, soa bem melhor que a original, e, curiosamente, supera a de “Point Of No Returner”, do Ministry. Não cabem mais, depois desse disco, questionamentos do tipo “será que agora o Sepultura vai engrenar?”. Quinze anos depois de sua mais traumática mudança, o grupo, com essa formação, assim como nas anteriores, já vingou faz tempo, e tem em “Kairos” seu melhor momento desde o sucesso mundialmente consagrador de “Roots”.

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