Fazendo História

In Flames
Na vanguarda do metal mundial

Entrevista com o baterista Daniel Svensson, a despeito do lançamento do álbum “Soundtrack To Your Scape”. Publicada na Dynamite número 73, de maio de 2004. Fotos: Divulgação.

inflamesFalar de In Flames é contar um pouco da história do death metal melódico, gênero que nasceu na Europa nórdica e fundiu, com um sucesso inicialmente pouco provável, a fúria e os gritos do death metal com a técnica e a melodia do metal melódico. Tudo começou com bandas como o At The Gates, grupo sueco que existiu entre 90 e 95, em Gotemburgo, e que deu origem ao termo “Gothenburg Sound”, que mais tarde seria chamado pela mídia européia (e de todo o mundo) de death metal melódico. Era a época de ouro do death sueco, representado por bandas ultrapesadas como Entombed e Dismember. Para estes, as guitarras melódicas eram ainda uma novidade, mas hoje a lista não tem fim: Children Of Bodom, Arch Enemy, Soilwork, Night In Gales, Dark Tranquillity e por aí vai.

Nessa época o In Flames era uma banda que se formara no finalzinho dos anos 80 pelo guitarrista Jesper Strömblad (ex-Cerimonial Oath), mas sofria com o entra e sai de integrantes, que jogavam suas fichas em outros grupos, como Dimmu Borgir e Gardenian. Como há males que vêm para o bem, a grande virada na carreira da banda aconteceu quando Björn Gelotte, que havia assumido a bateria, voltou para a guitarra, seu instrumento de origem, colocando Daniel Svensson nas baquetas. Isso aconteceu antes da gravação do álbum “Colony”, em 99, e até hoje completam a formação o baixista Peter Iwers e o carismático vocalista Anders Fridén. Antes, já haviam sido lançado os álbuns “Whoracle” (98), “The Jester Race” (95), ambos adorados pelos fãs, e “Lunar Strain” (94).

Mas o que viria depois é que marcaria época. Com “Colony”, pela primeira vez a banda quebrou a barreira e excursionou pelos Estados Unidos, fato raro para uma banda de death metal, num mercado americano tomado pelo nu-metal de Korn e adjacências. E ainda chegou ao fanático mercado japonês, o que aumentou a popularidade do In Flames em todo o mundo, inclusive no Brasil. Em 2000, Já com “Clayman” no mercado, a banda fez cerca de 150 shows, e tocou nos principais festivais europeus. E ainda, surpreendentemente, começava a galgar espaço nas paradas canadense, sueca e japonesa. No Japão foi gravado “Tokyo Showdown” (2001), o primeiro registro ao vivo da banda.

Outro marco aconteceria em 2002, com o lançamento de “Reroute To Remain”, mais um disco divisor de águas na carreira da banda. Alternando vocais limpos com os guturais, utilizando arranjos quebrados, afinações mais baixas em algumas músicas e muitos efeitos eletrônicos, o grupo deixou claro as influências adquiridas nas turnês pelos Estados Unidos, com bandas de nu-metal. Mas tudo, entretanto, sem deixar de lado o peso típico do death metal, e as guitarras limpas e melodiosas que marcaram o In Flames até então. Mudanças no logotipo e a adoção de uniformes nos shows foram outras características que levaram os fãs mais ortodoxos ao desespero. Mas que, sem dúvida, colocou a banda num passo à frente no heavy metal mundial.

Em março foi a vez de “Soundtrack To Your Scape” chegar às lojas, sendo que, antes dele, Anders Fridén lançou o disco de estréia do “Passenger”, intensificando a investida no nu-metal americano, mas com uma ênfase notadamente mais pop, mesmo sem perder o peso habitual. “Soundtrack…” deu ao In Flames a capa de importante publicações, como a Metal Hammer, por exemplo, além de tornar a banda ainda maior na Europa e em sua terra natal. Antes de iniciar uma gigantesca turnê que começaria em abril, e inclui Europa, Estados Unidos e, oxalá, o Brasil, o baterista Daniel Svensson conversou com a Dynamite por telefone, e nós tentamos entender como o In Flames está fazendo do seu peculiar death melódico a vanguarda do metal mundial.

Fale um pouco sobre como o novo disco, “Soundtrack To Your Scape”, foi gravado. Vocês trabalharam da mesma forma como fizeram com o “Reroute To Remain”?

Foi um pouco diferente desta vez. A bateria foi gravada no mesmo estúdio onde nós gravamos o “Reroute To Remain”. Depois nós fomos para um casarão na Dinamarca, levamos todo o nosso equipamento de gravação para lá é montamos dois estúdios. Gravamos baixo e vocais num deles e as guitarras e as partes eletrônicas no outro. Esta foi uma forma totalmente nova de trabalhar, e foi importante, porque em geral é muito chato ficar dentro de estúdios de gravação.

Quanto ao resultado final, o disco ficou melhor que o “Reroute To Remain”?

Nesse momento eu diria que ficou muito melhor, mas não é justo falar desse álbum agora, porque ele acabou de ser lançado e precisamos, nós e os fãs, ouvir mais vezes para termos uma opinião consolidada.

Você acha que este disco deve ter uma aceitação maior no mercado americano?

Eu não sei, vamos ver. Nós sempre tentamos atingir as pessoas, tanto quanto possível. Mas escrevemos as músicas que nós queremos tocar, que nós gostamos e das quais possamos nos orgulhar. Se as pessoas gostarem, é só um bônus.

Nos últimos anos tem havido uma grande separação entre o heavy metal feito na Europa e nos Estados Unidos. Nesse período vocês foram uma das primeiras bandas européias a fazer uma turnê americana. Como tem sido tocar lá e como você vê esta separação?

Nós tivemos a oportunidade de tocar nos States no verão de 99, e tivemos uma grande responsabilidade. A partir daí recebemos ofertas para fazer uma turnê como co-headliner com o Moonspell. Foi importante que bandas européias do nosso porte, que não somos uma banda tão grande, fizessem turnês nos Estados Unidos. Mas tudo aconteceu por causa do nosso trabalho, e estaremos fazendo tantas turnês lá quanto possível. É por isso que tocamos música, porque queremos tocar ao vivo, em frente a um público. E você não pode fazer mais de uma ou duas turnês européias por ano, então temos que tocar nos Estados Unidos.

Parece que nos Estados Unidos bandas que fazem um metal mais pesado como o In Flames não têm um grande sucesso, já que lá são as bandas de nu-metal que dominam. Você concorda com isso?

Sim, este tipo de música que nós tocamos é uma coisa nova para os fãs americanos.

Você acha que o público americano simplesmente não gosta do metal que se faz na Europa ou eles não gostam porque não conhecem?

Eu não diria que eles não gostam de música extrema, é melhor dizer que eles não estão acostumados com ela. E é por isso que muitas bandas européias estão quebrando essa barreira, porque elas estão ficando cada vez mais populares. Quando nós começarmos a fazer turnês por lá, foi estranho, pouca gente conhecia nossas músicas. O metal americano é muito diferente, mas acho que o público americano gosta do metal europeu também.

Você acha que essas bandas da Europa, quando elas fazem turnês pelos Estados Unidos, acabam adquirindo novas influências das bandas de nu-metal?

Isso não é impossível, você está sempre recebendo influências de coisas diferentes. Você aprende com pessoas que você encontra, músicas que ouve, mas eu diria que não é uma coisa intencional.

Desde “Reroute to Remain” o In Flames vem tentando colocar novos elementos na música, especialmente nos vocais e nos efeitos eletrônicos. Você acha que isso é um tipo de influência que vocês estão recebendo de bandas de nu-metal?

Não, quando nós escrevemos as novas músicas, nós não discutimos algo como “isto deve soar como esta ou aquela banda”. Escrevemos música de acordo com o nosso momento, não planejamos nossa sonoridade, vamos fazendo e investindo naquilo que achamos que está melhor.

Mas como você disse, às vezes, sem ser uma coisa intencional, isso pode acontecer…

Se não for intencional, talvez sim, mas não era o que estávamos falando. Estivemos fazendo muitas turnês com bandas diferentes, como Slipknot, Earth Crises, Skinlab, Iced Earth. É claro que recebemos influências de todos elas, mas não planejamos nem nos preocupamos com isso.

Mas você vê diferenças quando toca para o público americano?

Eles se parecem os mesmos em todo o lugar. Mas nós não nos importamos se os fãs americanos são iguais aos da América do Sul ou até mesmo do sul da Europa. Quando você está no palco não deve se importar com isso.

Mas de uma forma geral nessas turnês americanas o público já conhece o som de vocês, ou eles vão conhecendo durante o show?

É diferente. A maioria das pessoas conhece antes do show, mas tem sempre muitas pessoas que não nos conheciam ainda. Por isso é sempre interessante excursionar pelos Estados Unidos, sempre conhecemos um monte de pessoas novas, interessadas em conhecer novos tipos de música. É isso que a música desenvolve de legal entre as pessoas.

A partir do “Reroute To Remain” vocês mudaram o logo da banda, o design da capa, além de já virem usando uniformes desde 2000. Estes seriam outros sinais das novas influências na banda?

É mais que isso. Na verdade não queremos fazer como todas as bandas de metal fazem, que usam roupas pretas nos shows. Queremos trazer coisas diferentes para o metal, fugir do clichê “somos todos bandas de death metal, temos que ser maus e tocar com roupas pretas”. É por isso que usamos branco, tentamos fazer algo diferente. Quanto ao logo, mudamos no disco anterior para torná-lo mais legível. Ficou com mais estilo, mas é questão de gosto.

No último disco, na música “The Quiet Place”, a voz do Anders Fridén soa muito parecida com a de Jonathan Davies, do Korn. Você concorda, isso foi falado durante as gravações?

Eu não acho que soe como Jonathan Davies, tentamos sempre soar como nada feito até então, nunca tentamos copiar nada. É uma questão de opinião, se algumas pessoas acharam parecido, mas nunca procuramos isto, estamos sempre buscando novas formas de fazer o nosso tipo de música.

Ainda falando sobre o último álbum, há muitos arranjos vocais que soam mais melódicos e harmoniosos. Como é este desenvolvimento do Anders?

Acho que existem mais vocais limpos no “Soundtrack to Your Scape”. Eu toco bateria e tento me desenvolver meu modo e tocar a cada novo disco. Com o Anders, o instrumento dele é a voz e ele tentar sempre mudar também e colabora com novas idéias. Algumas músicas ficam melhores com vocais limpos, e em outras é melhor tê-lo gritando. A primeira música do disco, por exemplo, não tem nada de vocais limpos, é uma típica música de death metal. Então você pode desenvolver todas as partes de uma música, mesmo no death metal, depende de cada caso.

Você acha que, em certos momentos, o death metal ou mesmo a música pesada com um todo fica sem saída, e aí é preciso experimentar novos elementos?

Tem muitas bandas que fazem o mesmo som por quinze anos ou mais. Se elas gostam de fazer isso, tudo bem, mas nós não somos esse tipo de banda. Sempre queremos fazer coisas diferentes. Eu sei que muitas pessoas querem que nós façamos outro “Jester Race”, mas por que deveríamos? Nós já fizemos este álbum. Quando nos começarmos a nos repetir, acho que é a hora de parar. Além do mais, os fãs podem colocar o “Jester Race” para tocar quando quiserem.

Também há muitos teclados, samples e efeitos no In Flames dos dias de hoje. Vocês pretendem tocar ao vivo com um tecladista?

Nós temos todas estas partes de teclado e efeitos eletrônicos pré-gravados, e ao vivo é só eu apertar o play e começar a tocar. Não tem nada de especial, mas os fãs podem ficar tranqüilos que tudo o que aparece no disco vai ter no show também.

No set list da turnê vocês estão dando prioridade ao repertório do último álbum?

Agora que temos o álbum pronto, vai ser difícil fazermos um set list, cada um quer incluir uma coisa. Nas turnês em que somos a atração principal, conseguimos tocar 21, 22 músicas, em mais ou menos uma hora e meia. Devemos incluir umas seis músicas novas e as demais do material antigo. E também não são todas as pessoas que já ouviram o disco novo, e, como pagam o ingresso, temos que tocar as músicas antigas também.

Você poderia falar do Passenger, a banda paralela do Anders Fridén?

Eu ouvi este disco algumas vezes, acho que é realmente bom. Acho bom ter projetos paralelos quando você tem boas idéias que não se encaixam em sua banda. É para isso que eles servem.

Você acha que, de alguma forma o som do Passenger se assemelha ao do In Flames?

Não, não acho, são músicas compostas por pessoas diferentes. É uma banda muito dinâmica, a estrutura das músicas é até parecida, mas elas estão numa espécie de montagem diferente.

Você considera o In Flames uma espécie de fundador do death metal melódico?

Sim, entre outras bandas. Fomos uma das primeiras bandas que começou um estilo, mas antes havia o Grotesque e o At The Gates. Depois veio o In Flames. As bandas mais importantes nessa história são o At The Gates e o In Flames. As pessoas começaram a falar do “Gothenburg sound”, que identificava bandas que tocavam death metal de uma forma mais melódica. Só que isso cresceu tanto que fugiu do nosso controle.

A grande mídia hoje fala muito de bandas como The Hives, Backyard Babies, Hellacopters, mas não das bandas suecas de metal. Você acha que existe um certo preconceito com a música pesada?

Essas bandas pertencem às grandes gravadoras, e nós somos de uma gravadora independente. Lançamos um single há duas semanas na Suécia, e ele chegou ao segundo lugar na parada oficial de lá. Mas é difícil exibir o videoclipe, porque as pessoas acham que este tipo de música não é a ideal para ser tocada no mainstrean.

Você acha impossível uma banda de death metal como o In Flames assinar um contrato com uma major, e quebrar esta barreira?

Não acho impossível, mas é difícil, especialmente agora, quando o mercado está muito ruim, todas as gravadoras estão demitindo funcionários para economizar. Eles não estão assinando com ninguém, imagine com uma banda de death metal da Suécia!

Mas mesmo em gravadoras menores, bandas de metal vendem muito, na Europa e nos Estados Unidos…

Nós não vendemos muito nos Estados Unidos, mas muitas pessoas lá vão aos nossos shows, e isso é também uma coisa estranha sobre os Estados Unidos. Num dos shows da turnê americana, na qual éramos a atração principal, havia 5 mil pessoas, e na semana anterior, o Hed (PE) e uma outra banda de nu-metal, que juntas venderam umas 200 mil cópias, tocaram para umas 300 pessoas. Ou seja, você pode vender muito nos Estados Unidos, que não tem um grande público que vá ao show. Não vendemos muitos discos, mais muita gente vai aos nossos shows.

Quando uma banda de uma gravadora independente vende muito, logo uma major a contrata…

Sim, mas ainda precisamos vender mais para chamar a atenção de uma major. Precisamos traduzir o número de fãs que comparece aos shows em número de álbuns vendidos. E nossa gravadora tem uma estrutura pequena nos Estados Unidos. Mas estamos satisfeitos, porque sempre temos um bom público nos nossos shows.

Nesse contexto, você considera o In Flames uma banda média?

Depende, na Suécia somos uma banda bem grande, com uma música em segundo lugar nas paradas. Nos Estados Unidos ainda somos uma banda pequena.

Sobre as bandas que eu citei, você conhece essas bandas de longa data?

Eu não as conheço pessoalmente, mas nos encontramos às vezes. Acho o Hives bem legal, são caras bem novos tocando uma música diferente da feita por outras bandas. O Backyard Babies e o Hellacopters tocam uma música que parece que eu já ouvi antes.

Tags desse texto: ,

Comentários enviados

Apenas 1 comentários nesse texto.
  1. Henrique em julho 6, 2012 às 0:28
    #1

    Comecei a ouvir In Flames há pouco tempo. Ouvi várias músicas mais antigas deles. Quando ouvi o álbum Soundtrack to your Scape, logo estranhei, eu disse: “Cadê o gutural?” - mas mesmo assim, a qualidade da música continua a mesma de antigamente. Valêu pela entrevista!

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado