Quarenta e cinco mil cariocas estão começando a semana mais felizes. Eles passaram a virada de domingo para segunda vendo Paul McCartney desfilar um repertório de grandes canções no Engenhão. E vibraram, cantaram, se emocionaram. Ao todo, foram 36 músicas (incluindo citações), sendo 23 dos Beatles, em 2h35 de espetáculo. As mesmas que foram tocadas nos últimos shows em Lima, no Peru, e Santiago, no Chile. Poucas foram as mudanças no set list em relação aos shows de Porto Alegre e de São Paulo, realizados em novembro do ano passado, e o roteiro também foi o mesmo bolado para a “Up And Coming Tour”, incluindo – claro - a banda, composta somente por Paul e outros quatro integrantes. No primeiro grande evento do Engenhão, os esquemas de acesso montados pela Prefeitura e pelas concessionárias funcionaram bem.

Depois de passar pela América do Sul e deixar o Rio fora do curso no ano passado, Paul McCartney sabia que estava devendo. Afinal, foi com um dos shows realizados no Maracanã, em 1990 que ele entrou pra o Guinness – até hoje é o recorde de público com 180 mil pessoas na plateia. Talvez até por isso procurou interagir conversando com o público (muito mais do que nos outros shows), sempre ajudado por uma cola presa estrategicamente no placo. “Olá Rio! E Aí, cariocas?”, foi a primeira intervenção, já antes de iniciar a terceira música, “All My Loving”. Em quase em todos os intervalos entre as músicas Paul parava para agradecer, falar alguma coisa e ser aplaudido. “Oh, yeah” foi o bordão preferido da noite.

O início foi com a simplérrima “Hello, Goodbye”, uma das que não entraram nos shows brasileiros de 2010, que simboliza bem o que acontece na maioria das músicas do set. Afora os telões gigantes nas laterais e no fundo do palco, a produção é das mais simples, assim como boa parte das músicas que, hoje, pelo conjunto da obra, e deixando de lado predicados históricos, podem ser chamadas de rock contemporâneo. Pesa nisso a escolha dos músicos, todos tarimbados e experts, mas na medida certa. O tecladista Paul Wickens se vira para cobrir os arranjos originais sacando todo o tipo de efeitos pré-gravados, e dessa vez a dancinha do preciso batera Abe Laboriel foi anunciada oficialmente por Paul, na sugestiva “Dance Tonight”.

Mas cabe à dupla de guitarristas o papel principal na banda. Rusty Anderson é o encarregado de assumir a maior parte dos solos, e ele faz isso de maneira enxuta, na medida certa. Brilha em “Something”, que começa discreta e cresce de maneira surpreendente; faz uso de slide guitar (aquele dedal) em várias músicas, incluindo “Band On The Run”; e estraçalha em “Let It Be”. Seu parceiro, Brain Ray, é mais contido, mas não menos eficiente. Ele chega assumir o baixo para que Paul toque guitarra em algumas músicas, e faz das suas em “Letting Go” e no final, em “Helter Skelter”, num dos momentos mais pesados do set. Paul, de seu lado, parece até exímio guitarrista, ao esmerilhar na citação de Foxy Lady”, de Jimmy Hendrix, e no final exuberante com os três guitarristas “duelando” em “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, numa suruba instrumental das boas.

O que conta no show de um Beatle (vamos abolir o “ex”), não custa repetir, é o repertório de excelentes canções, grande parte consagrada em todo o mundo e que hoje faz parte do imaginário musical coletivo planetário. Não há quem não consiga assoviar, por exemplo, em “And I Lover Her”, um dos momentos em que o público mais aplaudiu. Ou mesmo em “Band On The Run”, que, embora tenha sotaque progressivo, faz a plateia explodir na parte em que o título/verso é citado, numa outra grande amostra de interação banda/público. Apesar de fazer parte de um roteiro ensaiado, Paul se emociona ao citar John Lennon em “Here Today” (chega embargar a voz) e George Harrison em “Something”, outra das aplaudidas com emoção.

O público faz a parte dele se supera. Além dos balões (dessa vez coloridos, não só brancos) lançados ao ar, em “A Day In The Life/Give Peace A Chance”, milhares de cartazes como o monossílabo “NA” foram erguidos em “Hey Jude”, deixando Paul McCartney com águas nos olhos – saque o primeiro lenço quem não deixou as lágrimas escorrerem. A música veio depois de “Live And Let Die”, repleta de explosões e fogos de artifício disparados por trás do palco. “Day Tripper” e seu riff poderoso é destaque no primeiro bis, mas a melhor parte cabe a “Helter Skelter”, cujo título já sugere uma porralouquice muito bem defendida pela dupla de guitarristas. Se o show – e de quebra o mundo, com 24 horas de atraso – acabasse ali, estaria tudo bem. Mas ainda faltava alguma coisa do álbum mais importante do mundo, e “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, emendada com “The End”, fez a noite de 45 mil pessoas comuns, em pleno subúrbio carioca, se completar.

Paul McCartney volta a se apresentar no Estádio Olímpico João Havelange, o Engenhão, hoje, às 21h30. Os ingressos estão esgotados. Clique aqui para saber todos os detalhes dos shows do Rio.

Set list completo:

1- Hello, Goodbye
2- Jet
3- All My Loving
4- Letting Go
5- Drive My Car
6- Sing the Changes
7- Let Me Roll It/Foxy Lady
8- The Long and Winding Road
9- 1985
10- Let ‘Em In
11- I’ve Just Seen a Face
12- And I Love Her
13- Blackbird
14- Here Today
15- Dance Tonight
16- Mrs Vandebilt
17- Eleanor Rigby
18- Something
19- Band on the Run
20- Ob-La-Di, Ob-La-Da
21- Back in the U.S.S.R.
22- I’ve Got a Feeling
23- Paperback Writer
24- A Day In The Life/Give Peace A Chance
25- Let It Be
26- Live and Let Die
27- Hey Jude
Bis
28- Day Tripper
29- Lady Madonna
30- Get Back
Bis
31- Yesterday
32- Helter Skelter
33- Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band/The End

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