Black Sabbath
Classic Albums
Paranoid
(ST2)
O produtor gritou dentro do estúdio dizendo que precisava de mais uns três ou quarto minutos de música para fechar o disco. Mesmo sendo a mola criativa, o guitarrista teve dificuldades, já que boa parte das músicas de sua banda eram longas e cheias de solos. Não teve alternativa senão mostrar um riff simples e pequeno, ainda sem melodia para se transformar verdadeiramente numa canção. Como não havia tempo, eis que o vocalista começa a cantarolar algo sem nexo e a música que faltava simplesmente aparece, fica pronta e é gravada em menos de 20 minutos. O produtor era Roger Bain, o guitarrista Tony Iommi, o vocalista Ozzy Osbourne, a banda Black Sabbath e a música, “Paranoid”, deu título ao segundo álbum do grupo e se transformou num dos maiores emblemas do heavy metal em todos os tempos.
A história não é inédita (Ozzy a descreve em sua autobiografia), mas vê-la contada pelos quatro integrantes originais do Sabbath é o que há de melhor na série “Classic Albums”. É possível ver, em outra passagem, Iommi tocando cada riff de cada música em close, com as pontas nos dedos que foram esmagadas por uma prensa hidráulica quando ele ainda trabalhava como operário no subúrbio de Birmingham, na Inglaterra, onde o grupo nasceu. O guitarrista diz que se inspirou em Django Reinhardt, o guitarrista de jazz do início do século passado que perdeu a mobilidade dos dedos da mão esquerda depois de um incêndio, e teve que desenvolver uma técnica própria. Será que o canhoto Tony Iommi seria um guitarrista tão inventivo, considerado o maior criador de riffs da história do rock, se o tal acidente tivesse sido evitado?
É uma pena que todos os integrantes (além de Ozzy e Iommi, o baixista Geezer Butler e o baterista Bill Ward) tenham sido entrevistados separadamente, mas a edição do programa lhe empresta uma homogeneidade excepcional. É curioso que todos tenham dado aproximadamente a mesma versão das histórias. Ponto pacífico, por exemplo, é que sempre Iommi vinha com um riff, Ozzy cantarolava uma melodia e Butler, vidrado em temas ligados ao ocultismo, colocava a letra em seguida. Na maioria das vezes o processo demorava mais do que aconteceu com “Paranoid”, mas as “músicas brotavam do nada”, como diz o guitarrista. Tanto que, ao entrar em estúdio precocemente para gravar o segundo disco, poucos meses depois da estreia (com o não menos sensacional “Black Sabbath”), tudo foi resolvido à toque de caixa. O intervalo entre os álbuns (algo inimaginável hoje) é de quatro meses.
“Paranoid” (o disco) era para se chamar “War Pigs”, mas um executivo da gravadora não queria um título que mantivesse a guerra na cabeça dos americanos, num período marcado pela tragédia do Vietnã. E, quando ele ouviu “Paranoid”, percebeu que tinha um single nato nas mãos. Resultado: a música tornou o grupo ainda mais popular, mesmo com a crítica da época cuspindo cobras e lagartos contra o som “básico, duro, cru e primário”. Roger Bain não participa do DVD e coube ao engenheiro de som Tony Allom separar trechos de músicas e relembrar histórias como a de um teclado misterioso encontrado em “Planet Caravan”, do qual ele nem se lembrava. Allom se emociona ao ver as fitas de rolo originais, com anotações feitas por ele na época.
O único músico que participa - com boas intervenções, diga-se – é Henry Rollins, mas há vários jornalistas e pesquisadores que fornecem o contexto histórico indispensável a um programa como esse. Um deles mostra como, em todas as oito faixas, o tema da guerra e da imbecilidade humana ante ao belicismo vigente realça bem mais que o “satanismo” embutido desde sempre no contexto temático do Sabbath. “Iron Man”, por exemplo, é sobre guerras; “Electric Funeral” fala do temor mundial da bomba atômica; e até “Fairies Wear Boots”, cuja letra nasceu de uma “viagem de LSD”, segundo Ozzy, traz as botas do exército à tona. Outro mito quebrado era de que os quatros eram músicos de jazz, o que lhes daria maior legitimidade. Perguntados pelas influências na época, eles citam, além do jazz, Beatles, Cream e The Shadows.
O DVD também mostra, de forma sutil, que, embora “Paranoid” talvez seja o álbum mais representativo do Black Sabbath, a “coisa mágica” que acontecia na hora de compor e gravar permaneceria – ao menos - nos próximos quatro discos do grupo – “Master Of Reality”, “Volume 4”, “Sabbath Bloody Sabbath” e “Sabotage”. E que seu o legado permeia o rock e a música pop em todas as épocas e lugares.
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Ótima resenha. Apesar de crescer ouvindo Paranoid (o album), na minha opinião Master of Reality e Vol 4. mostram um Sabbath perfeito…cheio de inspiração e preenchendo a lacuna do peso deixada pelo Led Zeppelin e Deep Purple…eu agradeço!
Bela resenha… O disco é sensacional, a biografia do Ozzy também, e me deu muita vontade de ver o classic albums do Paranoid!