O Homem Baile

Nova partida

Em noite inspirada, Autoramas se encontra com si próprio no Festival Dosol, em Natal; ódio do Mechanics, crueza do Black Drawing Chalks e bom gosto do Superguidis se destacaram numa noite recheada de surf music. Fotos: Ricardo Pinto/Divulgação.

Gabriel Thomaz, Bacalhau e Flávia Curi detonaram a plateia ensandecida em Natal

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O cronômetro foi ligado às 15h30 em ponto no primeiro dia do Festival Dosol para que as dezoito (!) bandas programadas se mantivessem no padrão pré-estabelecido de meia hora para cada show. Uma exceção, no entanto, teve que ser aberta. Aos gritos de “Mais um! Mais um!” o público exigiu e conseguiu que o Autoramas voltasse ao palco para tocar outra música. O grupo protagonizou uma espécie de “momento Beatles” ao ser equivocadamente escalado para o palco menor do festival. O resultado foi uma superlotação do bem que resultou na maior interatividade conseguida por um artista na edição deste ano.

Mechanics: Márcio Jr. desejou uma noite péssima ao público, mas ofereceu o contrário

Mechanics: Márcio Jr. desejou uma noite péssima ao público, mas ofereceu o contrário

Quem esperava o show do álbum acústico não encontrou violões e se deparou com uma apresentação visceral. Na ótima “Você Sabe”, re-incluída no set, o público delirou cantando o refrão a plenos pulmões e pulando sem parar; na balada “A 300 Km Por Hora” coube ao líder do grupo, Gabriel Thomaz, puxar o coro; e até músicas como “Catchy Chorus” e “1, 2, 3, 4”, do Little Quail, foram resgatadas numa noite desde já histórica para o Dosol e que deve servir de marco para a retomada da trajetória do trio, interrompida pelo tal projeto acústico. Numa noite cercada de surf music por todos os lados, perigava o Autoramas perder o trem da história e ser atropelado pela “concorrência” que ele próprio ajudou a criar.

O local Camarones Orquestra Guitarrística que o diga. Aclamado com um dos destaques da cena local, mesmo sem ter um único álbum no mercado, já estava colhendo cenas para um DVD a ser lançado cobrindo a série de shows feito pelo Brasil este ano. Teve o público na mão e com o volume de som alto pacas dinamitou uma mistura de surf music de raiz e a do tipo “australiana”, tudo com muita pegada punk – um dos guitarristas parece ter saído do Ramones anteontem. Da Argentina, o Tormentos foi prejudicado ao tocar a clássica surf music depois da tsunami do Autoramas, e o trio paraibano Sex on the Beach mostrou virtuose típica do norte-americano The Mermen. Na abertura o instrumental do Hossegor deu mais sinais de classic rock do que e surf music ao público que ainda chegava à Rua Chile.

Movido pelo ódio

Como de hábito, o Móveis Coloniais de Acaju fez show acrobático para a multidão

Como de hábito, o Móveis Coloniais de Acaju fez show acrobático para a multidão

A produção apostou em nomes recorrentes em outros festivais espalhados pelo Brasil. Grupos como Móveis Coloniais de Acaju, que fez o último show da noite com grande participação do público (e olha que foi o segundo em Natal esse ano); Black Drawing Chalks, o distribuidor oficial de esporro à granel; Nevilton, que, uma vez escalado muito cedo, sofreu para animar uma platéia incipiente, mesmo com a usual boa performance; e Superguidis, incrivelmente melhor a cada novo show, são exemplos de que, na prática, um circuito nacional de festivais já está se estabelecendo. O brilho do quarteto é inegável, cada qual com segmento e “tamanho” bem definidos.

Mas surpresas ocorrem, mesmo com veteranos como o Mechanics. “Uma péssima noite pra vocês”, desejou o vocalista Márcio Jr. logo de cara. “Somos uma banda movida pelo ódio e pela vontade de morrer”, vociferou em seguida, num prenúncio do que estaria por vir. Depois de uma pá de tempo cantando em inglês, a banda goiana partiu para as letras em português no disco mais recente, “12 Arcanos”, de onde boa parte do repertório foi retirada. Conteúdo mais claro só nos temas, já que o som discorre livremente entre o stoner, doom metal e grunge pesadaço, num festival de riffs que desaguou na primeira abertura de roda no meio do público no sabadão, e isso antes das 18h!

Cena local fica devendo

Superguidis: cada vez melhor

Superguidis: cada vez melhor

Como novidade, o Vespas Mandarinas, que ainda não fez nem dez shows, se saiu muito bem. O grupo é formado por ex-integrantes e bandas como Forgotten Boys, Banzé e Ludov e aposta numa veia entre a pauleira e a canção colante, no que se sai muito bem em músicas como a ótima “Impróprio”. Três quartos dos membros canta – e muito bem – encorpando ainda mais o som. Pena que a banda não pode mostrar mais serviço, já que dividiu praticamente metade do tempo com Fábio Cascadura. Juntos, eles encerraram o show com “Rádio Blá”, do Lobão. O indie rock com um pé no pós/positive punk foi representado pelo Sweet Funny Adams. Só que o grupo, já no nome, é espécie de banda cover com músicas próprias. Cada uma das canções, quando é iniciada, parece com algo já conhecido. Exceção feita para “The Killing Moon”, porque essa é do Echo And The Bunnyman mesmo.

Afora o Camarones, que reúne a duplinha Anderson Foca & Ana Morena, responsáveis pelo Dosol, a cena de Natal deixou a desejar no primeiro dia do festival. Aposta vencida já na edição passada, o Calistoga praticamente repetiu o show de antes, esvaziado ainda mais pelo sanduíche do Tormentos com o Black Drawing Chalks. Bem inexperiente, embora formado por integrantes cascudos, o Decreto Final vai de metal, hardcore e classic rock, mas parece mais banda de amigos de final de semana. Já o Venice Under Water é até bem intencionada, mas precisa refinar referências e melhorar muito os vocais.

O show dos alinhados Tormentos foi esvaziado pela tsunami do Autoramas

O show dos alinhados Tormentos foi esvaziado pela tsunami do Autoramas

Banda chilena, a Humana vai de metal e suas tendências, mas a cantoria linear do vocalista não ajuda. Só não ficou mais deslocado que a Orquestra Contemporânea de Olinda, chamada para tocar o baile e deixar os numerosos fãs do Móveis Coloniais de Acaju num imerecido castigo. O Cabruera também teve a mesma função, mas não contou com um público tão grande assim; a essa altura o tráfico de cervejas era o objetivo para suprir uma inesperada falta do líquido precioso em temperatura adequada nos bares.

O Festival Dosol continua hoje. Saiba tudo aqui

Veja como foi o primeiro dia do festival

Veja como foi o show de Marky Ramone no festival

Veja como foi o terceiro dia do festival

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Comentários enviados

Existem 5 comentários nesse texto.
  1. Daniel em novembro 7, 2010 às 10:14
    #1

    Humana fez um puta show foda, e se você procurar nos google’s da vida, vai descobrir que HUMANA se escreve igual em espanhol e português…

  2. Marcos Bragatto em novembro 7, 2010 às 11:55
    #2

    Corrigido! Obrigado!

  3. Bruno Matos em novembro 7, 2010 às 14:53
    #3

    Camarones Orquestra Guitarrística tem um álbum lançado sim.

  4. Everson Andrade em novembro 8, 2010 às 9:59
    #4

    Discordo da sua opinião quando você diz que a Orquestra Contemporânea pareceu deslocada no festival. Não falo como fã, pois não sou nem um paga pau de banda alguma, mas apresentação deles foi exelente e o público interagiu plenamente com os caras. Talvez o público com quem você teve uma conversa não curtisse o som, mas a outra parte que também deveria ser ouvida falou que o dinheiro pago pelo festival já foi pago só com a apresentação da banda pernambucana.

    A crítica é positiva, e valorizei seu texto e sua opinião! Do KCT!

  5. janete clara em novembro 8, 2010 às 21:15
    #5

    Sei que o show mais Rock foi Autoramas!!! D+++++

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