O Homem Baile

Noite homérica

Após cinco anos, Epica volta ao Rio em grande estilo; no fechamento da turnê brasileira, grupo emblematizado pela vocalista Simone Simons apostou nas músicas do novo álbum e em sucessos da carreira. Fotos: Luciano Oliveira.

Simone Simons solta a voz pra valer, entre o baixista Yves Huts e (ao fundo) o tecladista Coen Janssen

Simone Simons solta a voz pra valer, entre o baixista Yves Huts e (ao fundo) o tecladista Coen Janssen

Um público estimado em duas mil pessoas compareceu ontem à noite, na Fundição Progresso, no Rio, para o fechamento da terceira turnê do Epica pelo Brasil. O grupo holandês se apresentou na quarta, em Porto Alegre; sexta, em Curitiba; e sábado, em São Paulo. Hoje segue para Buenos Aires em giro pela América do Sul. No show de ontem, em cerca de 1h45 o sexteto tocou 15 músicas, com um terço do repertório pinçado do último álbum, “Design Your Universe”. Até os morcegos que sobrevoaram o palco e a platéia contribuíram para o clima “true” da noite.

O guitarrista Isaan Delahaye deu mais consistência ao Epica

O guitarrista Isaan Delahaye deu mais consistência ao Epica

A banda gira em torno da vocalista Simone Simons, que posa de modelo bem torneada e esbanja talento tanto no alcance de notas mais altas como na variação de timbre ao longo de todo o repertório apresentado. Diferentemente do que acontece com outros grupos de heavy metal com mulheres à frente, a entrada de Simone sempre surpreende, mesmo em músicas já conhecidas do público. Ainda mais quando sua voz, de tom quase sempre angelical, duela com os grunhidos de Mark Jansen, que – ao que parece – fez muito bem em ter deixado o After Forerver (também da terra da Laranja Mecânica) para montar o Epica há cerca de oito anos. Os dois atualizam os grandes momentos do gênero do final dos anos 90, de bandas como Trail Of Tears (cuja vocalista, Helena Michaelsen, participou do Epica) e Theater Of Tragedy.

Acontece, por exemplo, em “Sensorium”, do álbum de estréia, “The Phamton Agony”, estranha no ninho em um início em que quatro músicas novas dão o tom matador da noite. “Unleashed”, por exemplo, discreta no CD, cresce muito ao vivo, com ênfase para a performance vocal de Simone, que nem precisaria dos coros pré-gravados que tentam reproduzir o clima “symphonic” criado em estúdio. Mas é em “Martyr Of The Free Word” que a banda mostra sua capacidade de criar um hit em potencial de brigar cabeça com cabeça com “Nemo”, do Nightwish. A lembrança é pertinente na medida em que Simone é mezzo soprano e iniciou carreira à sombra de Tarja Turunen, mas hoje incorpora uma pegada bem mais rock e não tão erudita quanto a da ex-vocalista da banda finlandesa. A veia pop da música, no entanto, é descartada pela entrada inoportuna (ao menos aqui) dos vocais de Jansen.

Simone Simons canta com o guitarrista Mark Jansen

Simone Simons canta com o guitarrista Mark Jansen

Conforme anunciado pela própria Simone em entrevista exclusiva ao Rock em Geral, músicas dos quatro álbuns do grupo entram no set, que tem ligeiras diferenças em relação ao tocado nas outras cidades - compare aqui. Para os cariocas a banda reservou “Mother of Light”, só tocada ontem em toda a turnê brasileira. Anunciada por Jansen como “muito pesada”, com variações de andamento, a música vê Simone incrementando variações vocais em trechos curtíssimos: vai do grave ao agudo em questão de segundos. Mas é na dramática “Tides of Time” que a vocalista se excede pra valer. A música, com boa parte levada só com teclado e vocal, é uma belíssima peça metal/erudito de raro bom gosto e se transforma no ponto mais emocionante da noite.

Embora acumule experiência, a banda é muito nova (Simone, por exemplo, tem 25 anos) e por vezes se mostra indecisa no palco. Daí a entrada do guitarrista Isaac Delahaye ter servido não só para acrescentar “punch” ao grupo, mas também certo know-how de palco que apenas Mark Jansen parece ter. Simone Simons é simpática, animada e promete “pagar de volta” com a voz todos os presentes que recebe (rosas, chapéu, bicho de pelúcia), e o faz com juros e correção. Mas a simpatia não se converte no carisma que a voz privilegiada anuncia, e talvez falte rodagem à moça – repita-se – com apenas 25 primaveras.

O feeling e a pegada da bela Simone

O feeling e a pegada da bela Simone

Outro ligeiro senão vai para músicas em que o grupo flerta com o prog metal, e, ao vivo, acabam causando certo enfado ao público – que, diga-se, deixou a desejar, cantando somente quando impulsionado por um dos integrantes da banda. Para defender temas longos, cheios de variações de andamento, é preciso tocar (tecnicamente) bem mais que eles tocam, e ter momentos bem mais inspirados do que os mostrados em “Kingdom Of Heaven”, que fechou o set, ou mesmo na bela “Consign to Oblivium”, que se sai melhor no disco do que sobre o palco. Daí a importância de Delahaye, que junto com Mark Jansen e o batera Arïen Van Weesenbeek têm tudo para chegar lá.

Reflexões que, para o público, empolgado até com o flerte na música árabe que incomodava no passado (caso de “Fools of Damnation”), não fazem o menor sentido. Tanto que até o Tierramystica, encarregado da fazer abertura, conseguiu a façanha de ser aplaudido ao tocar duas covers em um total de cinco músicas. O grupo se saiu melhor como animador de auditório do que mostrando seu trabalho, e – cara de pau – voltou no final para colher os aplausos de Simone e sua trupe. Oxalá fique somente as belas imagem e voz de Simone Simons na lembrança de todos.

Simone recebe inspiração celestial e Mark Jansen trata de deixar tudo mais agressivo

Simone recebe inspiração celestial e Mark Jansen trata de deixar tudo mais agressivo

Set list completo:

1- Samadhi
2- Resign to Surrender
3- Sensorium
4- Unleashed
5- Martyr Of The Free Word
6- Fools of Damnation
7- The Imperial March
8- Mother of Light
9- Cry For The Moon
10- Tides of Time
11- The Obsessive Devotion
12- Kingdom Of Heaven (A New Age Dawns, Part V)
Bis
13- Sancta Terra
14- Quietus
15- Consign to Oblivion (A New Age Dawns, Part III)

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Comentários enviados

Existem 6 comentários nesse texto.
  1. Gabriella em abril 12, 2010 às 14:06
    #1

    Não achei que a Tierramystica foi tão mal assim. É fato que o público que foi assistir ao show estava ansioso pela chegada da banda Epica, que querendo ou não, demorou para voltar ao Rio de Janeiro. Daí realmente fica difícil. O povo fica contando os minutos para o show começar e se esquece que tem outra banda tocando, parando apenas para olhar quando reconhece alguma musica, porque lhe é familiar. Acho que isso tudo deveria ser levado em conta também.

  2. Extremus Metal em abril 12, 2010 às 16:01
    #2

    Tá certo, o Epica detonou, ainda mais que todos sabem que a beleza da Simone arrebata uma legião de fãs nem tão interessados em metal… Mas o Tierramystica, mesmo desconhecido do grande público, conseguiu, sim, mostrar sua técnica, feeling, profissionalismo e carisma, heavy metal de qualidade digno de orgulho brasileiro!
    Pegaram carona nos agradecimentos do Epica… pode ser, mas como músicos e banda não ficam devendo nada pra ninguém.

  3. Marcos em abril 12, 2010 às 19:08
    #3

    O Tierramystica conseguiu me mostrar o que poucas bandas de abertura no mundo conseguiram, me deixar embasbacado com tamanha técnica e talento, super fiéis à plateia. Não a deixou fora de participação um minuto sequer de seu show de cinco músicas. O Epica? Eu nem preciso dizer, só que Delahaye simplesmente era o que faltava, o show foi espetacular, e eu tô com um feeling de que terei que esperar mais um “poucão” para vê-los novamente.

  4. Antônio Dias em abril 13, 2010 às 9:28
    #4

    O Marcos Bragatto é muito educado, isso sim! Porque o show do Tierramystica foi um porcaria! Os músicos são bons, o vocalista canta bem, mas a banda não se diferencia em nada a muitas que tem por aí. E a presença de palco do vocalista? Fazendo o público de idiota o tempo todo, piadas sem graça, constrangedor. Depois tem os Massacrations da vida e o pessoal acha ruim.

  5. Gabriella em abril 13, 2010 às 21:39
    #5

    Ainda sim o Tierramystica conseguiu me provar que mesmo não sendo o gênero que eu gosto muito, o metal brasileiro não está tão longe do exterior não.

  6. stephane julia em outubro 20, 2010 às 18:56
    #6

    Eu achei irada, não pude ir, mas acompanhei pela TV. Viva o heavy metal!

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