O Homem Baile

O punk não está morto

No dia destinado à música pesada, o Festival DoSol recebeu um público jovem em Natal, disposto a ter lições com o Exploited, criador do movimento “punk’s not dead”, e a se divertir em rodas de pogo sem perder a consciência com Devotos e Confronto. Foto: Rebeca Correia/Divulgação DoSol

exploited-1Com uma paisagem decorada por muitas camisetas pretas, o domingão do Festival DoSol, em Natal, foi marcado por uma programação voltada para bandas de heavy metal – em seus segmentos mais variados – e punk rock/hardcore. O destaque maior foi a apresentação do grupo britânico Exploited, ícone do renascimento do punk no início dos anos 80, que apresentou uma indelével vitalidade. Devotos (ex- do Ódio) e Confronto não ficaram atrás e mobilizaram o público com shows contagiantes.

Não é qualquer dia que se vê um símbolo vivo do rock, carregando no peito sua própria imagem. Pois quem se acostumou a reconhecer a caveira moicano do Exploited no imaginário coletivo do rock, pôde ver, ontem à noite, em carne e osso, a cabeça que lhe deu origem. Quando Wattie subiu no palco para encerrar um dia em que treze bandas se apresentaram, trouxe com ele toda a história do punk mundial, que certamente não seria a mesma sem a interferência do Exploited. Por isso o início com “Let’s Start a War (Said Maggie One Day)” tratou de colocar os pingos nos is. Além da origem do hardcore em si, através do movimento “punk’s not dead”, Wattie trouxe para Natal as cusparadas refutadas por John Lydon em todos esses anos.

E também um repertório consagrado por clássicos que transformam o Exploited, hoje, numa banda de classic punk – se é que cabe o maneirismo. Entre mais de 20 músicas, sempre anunciadas sob um sotaque terrível do vocalista, “War”, logo no início, “Alternative” e “Sex And Violence” foram as que resultaram em grande interação com o público, que girava em rodas de pogo sem parar. A última com participação de fãs que subiram no placo após o chamado do batera Wullie Buchan, no bis. Nada que superasse o carisma de Wattie, que anda sem parar de um lado a outro e mantém a tradição de bater com o microfone na cabeça e jogá-lo no chão quando acaba o show. Possesso, o público enlouquecia a cada nova música.

Seguramente o Devotos não existiria não fosse o Exploited, e o grupo de Recife tem em comum com o britânico um punhado de bons hits – mais até, por estas plagas – capazes de criar rodas de pogo sem parar. A colante “Eu Tenho Pressa” e “Futuro Inseguro”, de conteúdo simples e direto que o digam. Canibal está muito bem, comunicativo e fazendo o grupo dialogar com a platéia, em que pese a timidez do guitarrista Neilton, que se esconde atrás de um boné e fica quase o tempo todo de costas para a platéia. Houve tempo para um bis, depois da obrigatória “Punk, Rock Hardcore, Alto Zé do Pinho”.

Sem o Exploited também não teríamos o Confronto, do Rio, outro que proporcionou cenas de diversão explícita. Cada vez mais o crossover hardcore/metal cabeçudo do grupo, com letras de conteúdo social, aponta para a música extrema, cortesia do guitarrista Maximiliano, vidrado em referências como o Slayer do auge do thrash metal. O Confronto tem um público fiel em Natal, e o vocalista Felipe Chehuan sabe muito bem comandar a massa. Em “Abolição”, por exemplo, ele garante a diversão ao transformar a turma do gargarejo em front de combate. Um showzaço que só reforça a vocação do grupo para conquistar novos adeptos, nesta que foi apenas a segunda vinda a Natal.

O heavy metal não foi citado só pelo Confronto, mas suas mil e uma ramificações vieram ao DoSol na tarde de ontem, arrastando um diverso público cuja soma deve ter superado os três mil pagantes. Desde o hard rock de coreografias ensaiadas e trejeitos repetitivos do Comando Etílico, passando pelo retorno do metal tradicional do Deadly Fate e pela modernidade pesada do goianiense Mugo, até chegar no metal extremo do paulistano “Nervochaos”, que toca sem a presença de Deus, havia de tudo um pouco no domingo de sol. Buscando algo de diferente, Natal tem as parentes Calistoga e Distro, ambas descendentes de um ancestral emocore, mas que não querem carregar a herança maldita.

A primeira apresenta a performance à Incubus, acrescida de roupas cheias de pulgas que fazem todos pular de modo desconexo, sem parar. O grupo precisa urgentemente rever seus conceitos – e se ver no espelho – de modo a aprender a hora de dar um passo atrás para acertar dois adiante. Já o Distro, rico pela presença de dois guitarristas/vocalistas, achou seu caminho. As passagens de guitarra e as composições do grupo são boas, e só tendem a melhorar com o tempo. Para o show ficar bom, só falta parar com esse negócio de ficar afinando guitarra entre todas as músicas.

Na série banda nova que tende a crescer, as locais I.T.E.P. (hardcore com metal), Fliperama (bubblegum) e Dr. Carnage (“estilo brucutu”) encaram o desafio de tocar para quase ninguém como abertura num festival de renome nacional. Até o norueguês Pulverhund, que tem no batera um brasileiro torcedor do Corinthians, fez bem a sua parte depois de cair de pára quedas na Ribeira. A banda pode não ser essa coca-cola toda, mas ao menos o baixista/vocalista é a cara do líder do Queens Of The Stone Age, Josh Homme.

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Comentários enviados

Apenas 1 comentários nesse texto.
  1. Adelvan em novembro 10, 2009 às 11:07
    #1

    Excelente como sempre a resenha, Bragatto. “Tocam sem a presença de Deus” foi ótimo.

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