O Homem Baile

Batendo palma pra maluco tocar

Em show de lançamento, Cidadão Instigado toca a íntegra de “Uhuuu”, o novo álbum, e conduz o público a mais dúvidas do que certezas. Na abertura, Júpiter Maçã se esforça para reviver sucessos e aponta para nova fase. Foto: Reprodução/ internet.

cidadaoinstigadoQuando fez o anúncio do show de lançamento do novo álbum, “Uhuuu”, o chefão Fernando Catatau não estava para brincadeira e colocou o Cidadão Instigado para tocar simplesmente a íntegra do repertório do CD. A festa aconteceu na madrugada de hoje, no Circo Voador, no Rio, e teve como abertura/convidado especial Júpiter Maçã. Sabem aquela história de “se cercar vira hospício e se cobrir com uma lona vira circo”? Pois foi exatamente as duas coisas que aconteceram, numa noite em que o público demorou, mas chegou para emocionar Catatau no final.

À frente de um palco decorado para o lançamento do disco, com direito a cubos iluminados do lado direito com as letras do título do disco/show, o Cidadão Instigado encara o desafio de reproduzir, ao vivo, um conjunto de músicas criadas basicamente em estúdio, com todos os recursos que Catatau e seus amigos sabem muito bem extrair de lá. E o quinteto se sai muito bem, seja nos teclados, ora calcados no brega nos 70, ora no exagero oitentista, nas guitarras muito bem tocadas por Catatau, ou ainda em batidas acústicas e eletrônicas sacadas pelo polivalente Clayton Martin. O som do grupo preza pela estranheza, e é aí que está o pulo do gato para se entender o Cidadão Instigado – ou, na impossibilidade disso, conviver com ele.

Não é qualquer guitarrista, vivo ou morto, que encerra uma música calcada na surf music misturada com punk, citando os acordes iniciais de “Europa”, de Carlos Santana. Nem que termina o show (e o disco), com uma peça de rock progressivo de sua fase mais pop, lembrando até o Asia nos anos 80. Foi o que o Catatau fez, respectivamente, em “Calma!”, já no bis, e em “O Cabeção”. E não foi só isso. Os teclados remontam o brega na épica “Deus é Uma Viagem”, como se uma orquestra de churrascaria fosse base para um cantor de segunda linha. Catatau não canta bem, tem dicção sofrível e sotaque carregadíssimo, mas nada disso atrapalha o conjunto da obra – ao contrário, contribui para o imã de estranheza que leva os fãs à banda.

Não seria exagero afirmar que o Cidadão Instigado habita a corda banda entre o mau gosto e o inusitado, o démodé e a vanguarda, o ordinário e o absurdo. O bom e o ruim de mãos dadas, brigando o tempo todo num roteiro de final surpreendentemente feliz. Se “Doido” tem teclados inspirados, a música é de vexar o fã de Odair José; “Dói”, por sua vez, lembra o instrumental vago do Azimuth, e mesmo turbinada pela potência do som ao vivo, levaria facilmente o troféu abacaxi do Velho Guerreiro; e “Como as Luzes”, no colo do rei Roberto Carlos, nos anos 70, teria virado sucesso nacional. Com o Cidadão, fica no tal limiar entre o bom e o mau gosto. No meio do tiroteio, o público se mostra indeciso: enquanto parte se apinha no gargarejo, outra metade vai saindo aos poucos.

Mas tem o lado bom, de fácil assimilação, justamente quando a resposta da platéia é mais intensa. A saturada “Homem Velho”, por exemplo, se arrisca pelos anos 80 de um jeito bem próprio, e “Escolher Pra Quê”, também conhecida como “Uhuuu” – esta sim – é hit de berço pop e agradável, com início, meio e fim. Tanto que foi repetida no final, com solos turbinados, em um inesperado e bem-vindo segundo bis. Curioso ver como, em meio a tanta inventividade, Fernando Catatau, guitarrista de mão cheia, consegue seguir tão bem manipulando teclados que são indissociáveis do som hoje proposto pelo Cidadão Instigado. Detalhes que fizeram da noite aquelas em que o queixo caído deixa todo mundo sem saber o que dizer quando chegar em casa.

Na abertura, Júpiter Maçã deu uma geral em sua carreira de altos e baixos, e acertou ao tocar muitas músicas de “A Sétima Efervescência”, seu disco referência. O problema é que ele, hoje, não consegue nem de longe reproduzir os tons vocais ali encontrados, a ponto de deixar certas passagens irreconhecíveis em “Querida Superhist” e “Essência Interior”. Diferentemente do Cidadão Instigado, a banda de Júpiter não reproduz a força das músicas registradas em disco. Exceto, claro, no chatíssimo flerte com a bossa nova, que qualha o repertório do show, caso de “Welcome to The Shade”.

Júpiter tem carisma, o público conhece suas músicas e isso anima o show. Empolgado, apresenta até uma nova, “Cerebral Sex”, no bis, que, assim como uma outra inserida no meio do set, resgata a batida anos 80 trazida pelas banda do novo rock. Mas no fim das contas o que vale mesmo é a ótima “Beatle George”, com Júpiter tocando slide guitar, e a inigualável “Lugar do Caralho”, seu maior hit, ao lado da ausente “Mis Lexotan 6 MG Garota”.

Set list completo Cidadão Instigado:

1- O Nada
2- Contando Estrelas
3- Doido
4- Dói
5- Escolher Pra Quê
6- Como as Luzes
7- Ovelhinhas
8- A Radiação Na Terra
9- Deus é Uma Viagem
10- Homem Velho
11- O Cabeção
Bis
12- Os Urubus Só Pensam em te Comer
13- O pobre dos Dentes de Ouro
14- Calma!
Bis
15- Te Encontra Logo…
16- Escolher Pra Quê

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Comentários enviados

Existem 3 comentários nesse texto.
  1. Melo em outubro 26, 2009 às 15:29
    #1

    O show foi incrível!
    Apenas isso, quem viu, viu.

  2. Lobão, o outro em novembro 27, 2009 às 15:19
    #2

    O título correto é “Beatle George”. E o show do Júpiter foi melhor do que o do Cidadão Instigado, na minha humilde opinião. Na verdade, não foram shows arrebatadores, mas foram bons shows.
    Júpiter poderia ao invés de tocar “welcome to the shade”, tocar “head-head” do mesmo disco e que funcionaria muito melhor ao vivo.

  3. Marcos Bragatto em novembro 28, 2009 às 17:56
    #3

    Claro, Lobão! Corrigido, obrigado!

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