Rock é Rock Mesmo

A marca registrada dessa década

Josh Homme inventou o formato antibanda, distribuiu sua assinatura em vários segmentos do rock contemporâneo e assegura, desde já, o nome entre os melhores dos anos 00.

Meus amigos, o tempo passa, o tempo voa e daqui a pouco já vai ter gente escolhendo os melhores de 2009. O final do ano já bate à nossa porta, de modo que anteontem vi na TV o título “O Natal da reforma”, para uma matéria sobre pessoas que, com o fim definitivo da crise marolinha, decidiu fazer obra em casa antes de 2010 chegar. Conheço gente que começa a fazer esse tipo de lista já em janeiro, e não me refiro somente ao meu amigo Moderninho de Plantão. E confesso eu que, para não ser traído pela memória, toda vez que percebo algo de muito bom, guardo lá no meu arquivo de melhores no word. Quando lembro, né?

Disse isso porque, não satisfeito com a antecipação do tempo, que por sua vez já anda rápido pra dedéu, vou apontar, desde já, o nome da década. Sim, o cara que – entre outras façanhas – vai entrar para a história como aquele que sintetizou os anos 00. Estou falando – vocês devem saber – de Josh Homme. Vejam que, na hora de escrever o nome de um grupo, logo após o dele, dentro de um parênteses ou usando outro artifício qualquer, já fico na dúvida. Poderia colocar Queens Of The Stone Age, Them Crooked Vultures, Mastodon, Arctic Monkeys, Desert Sessions, Eagles Of Death Metal, Kyuss, Mondo Generator, Screaming Trees e por aí a fora. Só por essa tola indecisão já dá para de ter uma idéia do que estou falando.

Quando o Rock In Rio de 2001 foi confirmado, lembro muito bem de uma matéria da Folha que, já no título, trazia a dúvida. “Queens of what?” Era o questionamento que o jornal fazia para explicar que bandas novas eram aquelas que vinham sendo anunciadas para um festival em geral caracterizado por lotear sua escalação com notórios medalhões. Diferentemente dos leitores da Folha, a julgar pela suposição jornalística dela própria, eu já sabia o que era o QOTSA justamente porque mantinha um olhar sobre aquilo que, desde meados da década passada, vinha sendo chamado de stoner rock (ou metal). Modestamente, já havia explicado na saudosa Rock Press o bê-a-bá da coisa toda, e também investiguei o stoner por lá mesmo. Foi, aliás, com o perdão da citação sobre mim mesmo, a partir da análise de um dos álbuns do grupo, “Songs For The Deaf”, que se iniciou esta Rock é Rock Mesmo, ainda no site da Revista Dynamite – lembram da vizinhança estéril?

Josh Homme, inventor do QOSTA, ajudou a criar o subgênero stoner rock, mas sua contribuição mais importante foi também a mais sutil. Josh inventou a antibanda. Ou, por outra, um conceito segundo o qual uma banda de rock deve incluir integrantes “não fixos”, descompromisso, infidelidade e promiscuidade musical. Um total desapego àquilo que, no passado, era pré-requisito. A única coisa que resta, numa banda, segundo o “modus operandi” de Homme, é ele próprio. Sim, porque onde quer que ele se meta, seja com quem for ou fazendo o quer que faça, a única coisa facilmente identificável é a sua assinatura, com tinta mais ou menos espessa, em todo o trabalho ou em parte dele.

Vejam o caso do Arctic Monkeys. Já discorri sobre o tema, e não é mistério para ninguém que grande parte do novo disco dos inglesinhos ganhou uma sonoridade típica do guitarrista Josh Homme. Ainda que dividida a produção de “Humbug” com um parceiro de longa data do grupo, Josh deixou sua marca. Outro. Não sei se os amigos já ouviram o som do Them Crooked Vultures, mas o grupo, formado por Josh, Dave Grohl, John Paul Jones (sim, o célebre baixista do Led Zeppelin) e um anônimo, pertence ao nosso herói já no nome, algo como “eles, as criaturas tortas”, numa tradução das mais livres. O som – que é o que interessa -, poderosíssimo, não deixa de explicitar que há um Josh Homme metido ali no meio.

Mas falava da antibanda e de promiscuidade musical. Sim, Josh não quer saber de ler por aí que seu grupo, ou qualquer outro nome que se dê a uma turba musical em que ele esteja no meio, é formado por fulano, cicrano e beltrano. Ele quer é gente pacas, tantas pessoas quantas achar necessário ter para fazer a música que ele quer, do jeito que ele quer, e, sobretudo, se divertir. Josh é, no melhor dos sentidos, um grande fanfarrão. Mas também um sujeito que tem, num mundo pop cada vez mais regido pela Lei de Lavoisier, uma – repito – assinatura. É como se fosse uma espécie de “selo de qualidade” do INMETRO: se tem Josh Homme no meio, por correr atrás que coisa ruim não é.

Não é que Homme tenha criado a sonoridade dos anos 00, mesmo porque, num mundo tão diverso como o contemporâneo, isso sequer existe. Não existiu nem nas últimas duas décadas, e, com o advento da internet, essa diversidade se ampliou para um horizonte inatingível a olho nu. Mas o cara está metido em quase tudo que tem relevância criativa neste século, mesmo quando se junta a veteranos do naipe de John Paul Jones. Eu não enrubesço a face para colocar o Queens Of The Stone Age no topo de muitas das listas de melhores da década, por antecipação, desde, ao menos, o tal “Songs For The Deaf”.

O leitor de longa data há de ter, entretanto, suas preferências. Sim, porque não é possível que dez anos de música pop, uma década inteirinha, se resuma a um cara só. E há, sim, outros de comportamento parecido, como o decalcador Jack White e seu sem número de projetos; o genial Peter Tägtgren, mais amiúde, guitarrista e produtor que, assim como Andy Sneap, está por trás do melhor e mais inventivo da música extrema contemporânea; mesmo Dave Grohl, parceiro de Homme; ou ainda medalhões que estão ainda servindo de referência há séculos, como U2, Green Day, Coldplay, e, porque não, até o AC/DC, o grupo da moda. Mas nenhum deles meus amigos, criou o formato antibanda como Josh Homme, sem abrir mão de sua fiel assinatura.

Até a próxima, e long live rock’n’roll!!!

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