No Mundo do Rock

Com músicas cativantes, Stellabella constrói a síntese do rock dos anos 90

Depois de via sacra no underground, grupo carioca chega ao primeiro disco contratado por uma gravadora. Líder do Detonautas cantou numa das faixas do CD e faz a ponte entre a banda e o mainstream. Fotos: Divulgação.

Diego Laje, China e André Stella: power trio com repertório de músicas colantes

Diego Laje, China e André Stella: power trio com repertório de músicas colantes

Não é de hoje que um tiro carioca vem tocando em tudo o que é lugar e chamando a atenção daqueles que circulam pelo underground. Com um repertório escorado em canções colantes, melódicas e ao mesmo tempo barulhentas, o Stellabella abre o leque da riqueza musical dos anos 90 para extrair uma música de contornos próprios, mas com sólidas referências que engrandecem o resultado final, apresentado no disco de estréia.

Antes do longo caminho até o CD ganhar vida, no entanto, é preciso lembrar que a banda, formado por André Stella (guitarra e vocal), China (baixo) e o argentino Diego Laje (bateria), nasceu justamente quando a década referência para eles acabou, em 2000. André e China eram amigos de longa data e conhecerem o forasteiro Diego, que veio ao Brasil para… tocar bateria. Rapidamente o trio se entrosou e apareceu tocando um punhado de boas músicas, todas compostas por André Stella. Depois de ganhar uma projeção maior, com apresentações em São Paulo, Minas Gerais e até em Natal, no festival Dosol, e da gravação de vários CD demo, 2007 viu o primeiro disco do grupo, “Alguém”, produzido por Fábio Henriques e lançado por conta própria.

O disco foi parar na mão de Tico Santa Cruz, o líder dos Detonautas, conhecido da banda na estrada, que logo encaminhou a bagaça para a gravadora Coqueiro Verde. O resultado é o recente relançamento do CD, com nova capa, e, dessa vez, levando como título o nome da banda. De quebra, a participação de Tico na faixa “Alguém”, a preferida do vocalista, mesmo sabendo que o som das duas bandas – Detonautas e Stellabella - pouco tem a ver. Nessa entrevista, feita por e-mail, o trio conta mais de sua história, e como pretende, enfim, decolar de vez no rock nacional. Confira:

Rock em Geral: Como surgiu o nome qual o significado dele? Os “eles” dobrados querem dizer alguma coisa?

André Stella: O nome foi idéia minha, não queria que significasse algo específico, queria que soasse bem e que fosse mais universal. Stella apareceu primeiro, é um nome que sempre gostei. Depois procurei algo para juntar com ele e apareceu o Bella. Os dois “eles” no Bella foram para combinar com os dois de Stella. Então eu escrevi no papel para ver como ficava. Além de ter soado bem, agradou aos olhos também. Pronto, tinha achado o que eu queria.

RG: Qual é o background musical de vocês?

André: Comecei a tocar violão com 12 anos e logo passei para a guitarra. Desde pequeno eu sempre ouvi rock e pop, por causa do meu irmão mais velho. Na primeira banda que entrei só tocava guitarra e fazia backing vocal. Foi na segunda que eu comecei a cantar também. Depois formei um power trio, mas não durou muito. Cheguei a tocar guitarra em alguns shows do Beach Lizards, grande banda do underground carioca dos anos 90, e também gravei algumas guitarras no segundo disco deles, o “Spinal Chords”. Em 2000 formei o Stellabella.

Diego Laje: Comecei a tocar alucinado pelas batidas do Stewart Copeland, do Police, e enlouqueci ouvindo Tony Williams tocando com Miles Davis, quando decidi levar a coisa a sério e estudei feito um louco, inclusive percussão clássica. Minha vinda ao Brasil foi precisamente para estudar música e percussão. Sempre gostei da vida dentro do estúdio e gravei mais de 20 discos de diferentes gêneros e artistas.

China: Sou formado em harmonia pela Musiarte/RJ e trabalhei em vários estúdios como músico, arranjador, produtor e técnico de som. Trabalhei alguns anos junto com Roberto Menescal e o pessoal da Bossacucanova, onde chegamos a fazer um CD com músicas do Elvis Presley em bossa nova. Trabalhei em vários CDs nesses anos: Marcos Valle, Osvaldo Montenegro, Roberto Menescal… Mas sempre fui rockeiro, não adianta!

RG: Faça uma análise das diferenças entre as duas versões do CD:

André: Quando finalizamos esse CD nós fizemos alguns CDRs e distribuímos para amigos e jornalistas. Passado um tempo resolvemos lançar o CD de forma independente, em 2007, e prensamos 1000 cópias. Nessa versão o CD se chamava “Alguém” e tinha 14 faixas + 2 versões acústicas (de “Algum Sentido” e “A Escolha”). Agora em 2008 o CD foi relançado pela Coqueiro Verde e leva o nome da banda. O CD foi remasterizado, ganhou capa e arte novas, teve a participação do Tico Santa Cruz e possui 12 faixas + 1 versão acústica, da música “Às Vezes”, gravada especialmente para o relançamento do CD.

RG: Por que resolveram mudar a arte da capa? E o título?

André: Foi idéia da gravadora, para diferenciar do CD independente que lançamos em 2007.

RG: A música do Stellabella remete a muita coisa que se fez nos anos 90, mas o Nirvana parece ser a referência mais forte. Fale sobre isso:

André: Com certeza a década de 90 e o Nirvana em particular são uma grande influência para nós, mas também temos coisas dos anos 80 no nosso som. Misturamos grunge, punk rock, indie rock e muita coisa do rock inglês também. Nirvana, Foo Fighters, Placebo, Smashing Pumpkins, Stone Temple Pilots, The Jam, The Smiths, Hüsker Dü e The Police são grandes influências no nosso trabalho.

RG: Em relação ao novo rock feito depois da virada da década, parece que ele não atingiu vocês. Vocês não curtem essas bandas? Preferem os anos 90 mesmo?

André: As bandas da década de 80 e 90 eram mais criativas. Também via mais sinceridade na proposta e no trabalho delas. Mas têm várias bandas “novas” que gostamos, como Strokes, The Vines e Bloc Party.

RG: “Me Arriscar” é a mais “nirvânica” em todo o CD. É certo dizer que ela foi inspirada em Cobain e cia?

André: Com toda certeza. O Nirvana, de mestre Kurt Cobain, sempre foi e sempre será uma grande fonte de inspiração para mim. “Me Arriscar”, “Alguém” e “Farsa” são músicas realmente inspiradas no Nirvana.

Capa de 'Stellabella', a nova versão do disco de estréia da banda

Capa de 'Stellabella', a nova versão do disco de estréia da banda

RG: As partes mais melódicas das músicas, de outro lado, parecem vir do britpop de Oasis e afins. O rock inglês também pauta o som do Stellabella?

André: Sem dúvida o rock inglês tem uma grande influência no nosso som, principalmente nas melodias. Não só o britpop, mas também as bandas dos anos 80, como The Smiths e The Cure, e algumas bandas mais antigas, como The Jam e Buzzcocks.

RG: André, você é fã confesso de Iron Maiden, mas sua banda nada tem a ver com heavy metal. Como é isso?

André: Amo Iron Maiden, conheci os caras, tenho autógrafos e fotos com todos eles. Assim como amo o Nirvana e conheci o Kurt Cobain. Tenho um gosto musical que vai de Beatles a Sepultura. Curto heavy metal, punk rock, grunge, indie rock, enfim, música boa e de qualidade. E no Stellabella tento juntar isso tudo. Acho que tem um pouco de cada um desses estilos no nosso som.

RG: André, você escreve todas as letras. Em geral, são histórias que aconteceram ou é tudo ficção?

André: Posso dizer que praticamente todas as letras falam de coisas que já aconteceram e que acontecem comigo. Falo de como me sinto, das minhas neuras e de coisas que já passei. Sempre tento ser o mais sincero possível nas letras que escrevo.

RG: As letras falam muito de relacionamento, do cotidiano de uma pessoa comum. Você acha que esse tipo de assunto possui o apelo encontrado na parte musical do Stellabella? Uma coisa se encaixa com a outra?

André: O som do Stellabella tem uma pegada forte e no palco tocamos com muita energia. Nas letras eu falo do que eu sei falar. Falo de relacionamentos e do cotidiano das pessoas porque me sinto à vontade para falar sobre esses assuntos. Nunca vou falar sobre algo que eu não me identifique ou que eu não domine. No final das contas, acho que uma coisa acabou completando a outra e foi isso que deu uma cara ao nosso som e definiu nosso estilo.

RG: “Às Vezes” é uma das mais pop do disco, tem vocação radiofônica. Ela foi feita para isso? Foi por isso que ela ganhou uma versão acústica?

André: Acho que todas nossas músicas têm um apelo pop, e “Às Vezes” é uma delas. A idéia de se fazer uma versão acústica para ela veio da gravadora. Gostamos muito de como ela ficou. Acho que realçou mais a melodia e a letra da música, sem contar que a versão original é muito mais pesada e isso acabou deixando essa versão acústica bem interessante.

RG: “Algum Sentido” é uma música de grande apelo dramático. Fale como essa música nasceu e como chegou a esse arranjo final:

André: “Algum Sentido” é uma de minhas favoritas e realmente ela tem um grande apelo dramático e uma grande carga emocional, principalmente pela letra. Ao vivo, por causa da interpretação, essa característica se torna ainda mais evidente. A primeira versão de “Algum Sentido” tinha um andamento mais rápido, mais acelerado. Quando fomos gravá-la, o Fábio Henriques deu a idéia de desdobrar o andamento dela e torná-la mais cadenciada. Ficou perfeito, porque esse novo andamento se encaixou mais com o teor dramático e melancólico da letra.

RG: Num mercado dominado pelas bandas emo, fica difícil expressar sentimentos sem soar dramático demais ou piegas?

André: Sinceramente, quando eu escrevo não penso nisso. E falar de sentimentos sempre foi um tema recorrente em bandas de rock e de pop.

Diego: Acho que fica difícil sim, mas também acho que quem sabe ouvir sabe diferenciar. Palavras e sentimentos simples tornam-se poesia de primeira qualidade se forem tratados com carinho e inteligência.

RG: Como rolou de o Tico Santa Cruz participar em “Alguém”? Detonautas e Stellabella têm a ver?

André: Conhecemos o Tico Santa Cruz, Fabinho (Fábio Brasil, baterista) e toda galera do Detonautas desde 2001, quando tocamos juntos pela primeira vez aqui no Rio. Eles sempre nos deram muita força e foi o Tico que levou nosso CD independente para o Von Kilzer (A&R da Coqueiro Verde) ouvir. Ele gostou e então fomos contratados. O Tico sempre nos disse que gostava da música “Alguém”, e um dia até apareceu em um show da gente e deu uma canja, subindo ao palco e cantando a música comigo. Quando fizemos o convite para ele cantar no CD, ele topou na hora. Apesar de não fazermos um som muito parecido, acho que Detonautas e Stellabella têm a ver, sim. Somos mais ou menos da mesma geração, temos muitas influências musicais em comum e todas as vezes que abrimos algum show para eles nós vemos que muitos de seus fãs acabam se identificando com o nosso som, com a nossa proposta.

RG: Como tá o momento atual da banda, com um CD na mão e uma gravadora dando apoio?

Diego: Estamos sem dúvida no melhor momento da banda, o investimento é modesto, mas a agenda está cada vez melhor. A banda tem mais exposição e estamos nos divertindo muito mais!

RG: Como vocês estão se virando nessa crise do CD e do mercado fonográfico?

Diego: O rock tem uma parcela pequena do mercado fonográfico brasileiro. Com a contração do mercado, o rock sofre mais ainda e o retorno financeiro já não é mais o mesmo, por isto se procura investir pouco, ter um retorno rápido e depois partir para outra. Temos a sorte de estar numa gravadora e contar com um empresário que pensam na gente como uma banda de carreira. A estratégia é percorrer o caminho aos poucos, confiando na qualidade do som e num resultado a longo prazo, tocar muito, se divertir bastante, pensar no negócio mas sem perder a ternura jamais!

RG: Como esse repertório já é bem antigo, vocês devem ter músicas novas. Algum novo direcionamento musical ou de conteúdo?

André: Já temos muito material inédito, daria até para gravarmos um CD duplo! Mas vamos começar a pensar nisso só no ano que vem, quando pretendemos gravar nosso novo trabalho. Nossa identidade e as características principais do nosso som continuam lá, mas temos algumas novidades. Mas isso é surpresa!

André Stella, no centro: A década de 90 e o Nirvana em particular são uma grande influência para nós. Misturamos grunge, punk rock, indie rock e muita coisa do rock inglês também

André Stella, no centro: A década de 90 e o Nirvana em particular são uma grande influência para nós. Misturamos grunge, punk rock, indie rock e muita coisa do rock inglês também

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