Fazendo História

The Offspring
O retorno de um dos ícones dos anos 90

Em outubro de 2003 o criador, editor e dono da Revista Dynamite, André “Pomba”Cagni, veio ao Rio para cobrirmos o Free Jazz (atual Tim Festival). Quando íamos para o hotel onde as bandas estavam, em Copacabana, para entrevistar o Super Furry Animals, nos foi dada a missão de seguir direto para a sede da Sony, onde, de uma tacada só ouviríamos o novo disco do Offspring em primeira mão, para, na seqüência, entrevistar Dexter Holland, num telefone com viva voz, com pauta feita entre uma coisa e outra. O resultado foi essa matéria exclusiva, capa da Dynamite número 68, de dezembro de 2003. Foto: Divulgação.

offspringEm 1994 a música pop vivia o rescaldo no grunge - Kurt Cobain acabara de meter uma bala na cabeça, e o mundo conhecia “Come Out And Play”, o hit de uma banda de uma gravadora independente que não parava de crescer nos Estados Unidos. Era o Offspring, que ao lado de nomes como Green Day, Pennywise e NOFX mostrava uma nova cara para o punk rock, o que mais tarde ficaria conhecido pelo indigesto termo poppy punk. “Smash”, o álbum que trazia “Come Out And Play”, chegou a vender mais de 11 milhões de cópias mundo afora, recorde absoluto para uma gravadora independente, a Epitaph, além de ter chegado ao 4o lugar na parada da Billboard.

De lá pra cá muita coisa mudou. Desde 1996 o Offspring é artista da Columbia/Sony, o mercado americano abriu espaçou para a saturação do nu-metal, vide o sucesso de bandas como Limp Bizkit e Linkin’ Park, o novo rock de White Stripes e de Nova Iorque mostra a cara, e o mundo do rock muda a passos largos com os avanços da Internet.

Depois de três anos sem lançar nada no mercado o Offspring volta à carga com o álbum “Splinter”, o sexto da carreira. Com produção do veterano Brendan O’Brian (Pearl Jam, Rage Against The Machine), o álbum marcou a saída do baterista Ron Welty, substituído nas gravações por Josh Freese (Vandals), e em definitivo por Atom Willard (ex-Rocket From The Crypt). Os amigos de longa data Jim Lindberg (Pennywise) e Jack Grisham (TSOL) participaram das gravações, fazendo backing vocals em algumas músicas.

A Dynamite teve acesso ao material que estará no disco, que tem lançamento no Brasil previsto para o dia 1o de dezembro. De quebra, bateu um papo, por telefone, com Dexter Holland, vocalista, líder do grupo e, nas horas vagas, PHD em microbiologia - completam a banda Noodles (guitarra) e Greg K. (baixo). Dexter comenta algumas músicas novas, fala do rock que se faz na atualidade nos Estados Unidos, explica (ainda) os motivos que levaram o Offspring a trocar a indie Epitaph pela major Sony, e como quase a banda roubou o título “Chinese Democracy” de Axl Rose. Confira abaixo os principais trechos:

Você considera “Splinter” um típico disco do Offspring?

Não acho que seja essa a palavra correta. Acho que o novo álbum soa como Offspring, e o nosso sotaque entrega que é um álbum de carreira, mas eu queria fazer esse disco um pouco diferente, queria que ele soasse um pouco mais… Talvez a palavra certa seja direto, ou simples, ou algo parecido. Foi esse o caminho que nós tentamos seguir neste disco.

“Hit That” parece ser o primeiro single do disco. Vocês já imaginam como será o videoclipe para esta música?

Sim, vai ser nosso primeiro single, mas só agora nós começamos a pensar no que vai ser o videoclipe, e eu acho que será alguma coisa realmente diferente de antes. A começar pela banda, provavelmente nós não vamos aparecer nele. Deve ser algo bem forte, como coisas que vemos do Radiohead e do White Stripes.

Houve alguma influência de música brasileira ou latina para compor a música “Spare Me The Details”?

Você achou que soou ou pouco latino, né? É, um pouco sim, eu adoro música latina, sou interessado em cultura espanhola, afinal moro em Los Angeles, uma cidade que tem muita influência da cultura mexicana. E isso aparece em algumas músicas nossas. Sei lá, “Pretty Fly”, nas primeiras gravações, e outras, têm essa influência latina. Até mesmo em “Spare Me The Details”, que é uma música diferente porque tem violões. Nós nunca fizemos uma música como esta antes. Você poderia dizer que violões pegam mal, como estar sentados num acampamento em volta de uma fogueira, mas não é esse tipo de som que fizemos, e sim algo diferente que resolvemos tentar.

Por que “The Worst Hangover Ever” tem um jeito de ska? Você costuma curar suas ressacas ouvindo ska?

(Risos) Há algo no ska, reggae, nesse tipo de música que determina o jeito que as letras devem ser escritas. E “Hangover…” é o tipo de música, sei lá, que pulsa na sua cabeça como uma dor de cabeça.

O que há por trás da música “When You’re In Prision”? É uma versão de uma música antiga?

Não, eu escrevi esta música há algum tempo, talvez há cinco anos, e eu pensava: por que fiz esta música selvagem, ela é tão bizarra… Então deixei de lado por um tempo. E neste disco, eu pensei que poderia incluir uma música que soasse como se fosse dos anos 1930, e nós a gravamos. Brendan (O’Brian, produtor) nos ajudou a fazer com que ela soasse assim, e ficou uma versão muito forte. Enquanto gravávamos olhamos uns para os outros e percebemos a força da música. Então decidimos colocá-la no disco, e em geral as pessoas acham graça dela.

“Rage Against Myself” tem uma influência da cena nu-metal?

Queríamos ter uma música pesada, e é esse o jeito da letra dessa música, mas eu diria que ela é mais rock, está mais para Stone Temple Pilots do que para as bandas de nu-metal.

Você considera que o boom do nu-metal está passando e novas bandas estão surgindo?

Eu acho que as coisas estão começando a mudar aqui nos Estados Unidos, novas bandas estão começando a ganhar força. As pessoas estão ouvindo muito mais The Strokes e bandas diferentes que estão surgindo. Acho que isso é bom, é tempo para se mudar de novo.

Você gosta de bandas de nu-metal?

Acho que o Deftones é legal, o Korn é uma boa banda, acho que definitivamente há bandas boas, mas é uma questão de estilo. Estas bandas tiveram influências diferentes das que eu tive quando eu comecei a ter banda.

Como você vê o crescimento do emocore nos Estados Unidos, já que no Brasil esta cena é muito forte?

Está crescendo cada vez mais por aqui também. Eu gosto porque é uma espécie de punk, mas na verdade é muito melodioso nos versos e na maioria das partes. Há muitas bandas boas, é uma música muito potente e tem muitas bandas seguindo este caminho aqui, o que eu acho legal.

Vocês sempre escreveram as letras das músicas com muito humor. Já sofreram qualquer tipo de pressão, até pessoais, para fazer algo com conteúdo social e político?

Eu não diria pressão, nós escrevemos sobre o que quisermos escrever. Em todos os álbuns, o “Americana”, por exemplo, é quase todo com temas sociais, como “The Kids Are All Right”, e a música “Americana”. Nós incorporamos isto em várias de nossas músicas. Eu acho que há isto neste álbum também, em músicas como “The Noose” e “Neocon”. Muitas vezes são letras pessoais, mas em muitas outras são sociais. Eu em geral não me interesso em temas políticos, não sinto que deva ir tanto por este caminho, mas acho que ter letras de conteúdo social é importante, mesmo a música “Hit That” tem letra com certa importância.

O que há de verdade no fato de que vocês iam colocar o nome do álbum de “Chinese Democracy”, só para mexer com Axl Rose? Vocês realmente pensaram em fazer isso ou foi só uma brincadeira?

Nós realmente pensamos em fazer isto, quero dizer, é engraçado, todo mundo sabe que o Guns N’Roses dizia que o novo disco deles iria se chamar “Chinese Democracy”, isso nos últimos dez (!) anos, tanto que soou como uma brincadeira. Então pensamos, não seria engraçado se nós roubássemos o título do álbum? As pessoas levaram muito a sério, eu não pensei que isso iria causar essa comoção, com pessoas da imprensa ligando, advogados ligando, putos com isso. Mas legalmente você não pode registrar e ter direitos autorais sobre o título de um álbum que ainda não foi lançado, estão estávamos livres para usar este título, se nós realmente quiséssemos. Chegamos a pensar seriamente, mas no fim das contas resolvemos dar o nosso próprio título, e devolvemos o deles.

O que realmente aconteceu quando o Offspring deixou a Epitaph, já que nós nunca tivemos a oportunidade de ouvir isso da própria banda?

Oh, meu Deus, se você tivesse me perguntado isto sete anos antes…

É que no Brasil o punk é muito forte, e muitas pessoas aqui chamaram vocês de traidores, mas nós sabemos que vocês têm outra versão para esta história…

Quando uma banda se dá muito bem numa gravadora independente, ela sempre vai para uma grande gravadora, de uma forma ou de outra. Isso aconteceu com o Nine Inch Nails, com o Beck, com todo mundo. Foi importante para nós tentar ficar na gravadora independente, era importante para nós naquele momento porque éramos todos amigos, e foi o que fizemos, ficamos no selo durante todo o álbum (“Smash”), coisa que ninguém tinha feito antes. Mas chegou uma hora em que nós crescemos muito rapidamente e o selo estava tentando crescer, mas era diferente, éramos muito maiores que a gravadora. Eles estavam tentando nos acompanhar, sempre fazendo tudo certo, da forma que nós esperávamos, mas nós não podíamos nos contentar só com aquele patamar. Uma das coisas que incomodava é que nem tínhamos uma distribuição para a América do Sul. Ainda assim tentamos ficar e ser legais com eles, e foi o que fizemos, ficamos na Epitaph durante todo o álbum. E depois disso, nós conversamos sobre fazer mais, e eles não tinham como fazer tudo que nós precisávamos, então era a hora de mudarmos. Eu estou totalmente satisfeito por ter feito isto, acho que foi a melhor coisa para nós e para as pessoas que querem ouvir a nossa música.

Em 1994 o sucesso de “Come Out And Play” era uma grande surpresa por ser uma sensação mundial, vinda de uma gravadora independente. Como esse sucesso afetou você, pessoalmente, naquela época?

Nós mesmos não esperávamos que isso acontecesse tão rápido. Gostávamos das músicas e torcíamos para que as pessoas gostassem também, mas não tínhamos idéia de que aquilo tudo iria acontecer. Na verdade ficamos meio assustados, porque ficamos muito populares muito rápido. Foi logo depois de isso acontecer com Kurt Cobain e Eddie Vedder, e eles tiveram problemas ao lidar com toda a fama e o sucesso rápido. Não quero dizer que somos tão grandes como as bandas deles, mas isto foi uma coisa que nos assustou e decidimos dar um passo atrás. Não fizemos todas as entrevistas para a TV, capas de revistas, decidimos tentar ficar calmos e no underground, tanto quanto possível. E acho que é justamente por isso que nós ainda estamos aqui. Gostamos de fazer música e isso ainda é divertido para nós.

“Pretty Fly (For a White Guy)” é uma brincadeira sobre os rappers brancos. Como foi ter Vanilla Ice cantando com você no palco?

Foi ótimo, na verdade a música não era só sobre rappers, mas sobre qualquer pessoa branca que tentasse se comportar daquela maneira. E eu usei uma linha sobre o Vanilla Ice porque, sabe com é, as pessoas acham que Ice Cube é um cara cool, e Vanilla Ice não tão cool (risos). Então o chamamos para subir no palco e cantar uma parte da música conosco, e ele concordou, levou tudo na esportiva. Eu acho que você acaba respeitando mais uma pessoa quando ela não fica puta com uma brincadeira que você fez. Por isso foi muito legal. Claro que ele mudou, tem uma banda muito pesada agora. Foi tudo muito divertido.

Sobre a sua gravadora, a Nitro, ainda está na ativa? Há bandas novas sendo lançadas?

Claro, temos muitas bandas novas. Alguém conhece a banda AFI no Brasil?

Eu já ouvi falar.

Eles estão indo muito bem agora, estão na minha gravadora já há cinco álbuns e agora estão crescendo. Eu achei umas bandas novas, como uma banda americana chamada Rufio, ela está excursionando muito, já estiveram no Japão, e espero que eles possam ir ao Brasil. Acho que vamos levá-los para tocar conosco na nossa próxima turnê por aí.

Você tem previsão para quando estes shows vão acontecer?

Eu gostaria que fosse o mais rápido possível. Tentamos tocar na América do Sul sempre que podemos, na turnê do “Conspiracy Of One” nós não fomos, mas acho que tocaremos de novo por aí já no ano que vem, na turnê do “Splinter”.

O que você se lembra dos shows no Brasil, além de todos terem os ingressos esgotados?

As pessoas aí são muito entusiasmadas, e no show elas enlouquecem mesmo. É muito empolgante fazer parte deste show, ver as pessoas cantando animadas. Eles também te seguem no hotel, em qualquer lugar que você vá, é uma loucura, tipo Beatles ou algo parecido (risos).

CONHEÇA AS MÚSICAS QUE ESTÃO EM “SPLINTER”

Dexter Holland justificou o nome do disco pelo fato de outros álbuns da banda com um nome simples (como “Americana” e “Smash”) terem obtido sucesso. É um disco de fácil assimilação, e a voz de Dexter continua sendo a maior e mais facilmente reconhecível característica do Offspring.

offspringsplinter1- “Neocon”: é quase uma introdução que começa com uma bateria marcial e palavras de ordem. Prepara o novo disco do Offspring. “Nunca perderemos para você”, diz a letra. A julgar por ela, parece que o disco deve ser bem pesado;

2- “The Noose”: um pouco mais acelerada que a primeira. Intercala momentos mais cadenciados com outros mais rápidos;

3- “Long Way Home”: essa tem tudo para ser o novo single, pelo menos até a chegada da próxima. Tem um “hey” entre os versos que empolga logo de cara, assim como o refrão, de fácil assimilação;

4- “Hit That”: novo single do Offspring, é feita sob medida para estourar nas rádios. Tem até uns efeitos pré-gravados que ficam na cabeça por horas, marcando um ritmo bem suave que logo deságua num refrão mais que colante. Para Dexter, tem “versos hip hop e refrão punk”;

5- “Rage Against Myself”: Começa lenta e logo aparece um poderoso riff, quase heavy metal. Apesar de diminuir a “pegada” em alguns momentos, no geral mantém o peso;

6- “(Can’t Get My) Head Around You”: volta com um ritmo ideal para se pogar durante um show. Com guitarras colantes, junto com a voz de Dexter, esta música é típica do Offspring. Tem até uma “paradinha” no meio para recuperar o fôlego;

7- “The Worst Hangover Ever”: como de costume, um skazinho marca presença num disco do Offspring, sempre com bom humor e muito balanço, quase reggae. Candidata a single;

8- “Never Gonna Find Me”: traz o repertório de volta ao típico som do Offspring, é acelerada e lembra outros hits do grupo na década passada;

9- “Lightning Rod”: outra típica da banda, com boas bases de guitarra;

10- “Spare Me The Details”: uma inusitada baladinha, com clima latino e violões, mas sem “ser piegas”, segundo Dexter. Agora, que serve para ser tocada num luau, com palmas e tudo, isso serve;

11- “Da Hui”: a mais punk rock do disco, rápida e urgente. Tem um clipe prometido com cenas gravadas no Havaí;

12- “When You’re In Prision”: pelo título e pelo jeito que Dexter canta, com uma introdução de disco arranhado, parece ser uma cover de Johnny Cash, mas a música é da banda. Fecha o disco com cara de “ghost track”.

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