Fazendo História

Heavy metal para headbangers

Publicado em 1999, na Revista Rock Press.

O heavy metal é, sem dúvida, um dos estilos mais discriminados da história do rock. A crítica musical sempre tratou o metal como algo cru, limitado e de conteúdo estético desagradável. Um estilo primitivo, medieval. No entanto, depois que tomou de assalto as paradas musicais em todo o mundo, via o thrash californiano nos anos 80, é comum aparecer comentários na mídia de que o metal está esgotado, não se renova e deve acabar em poucos anos. Ao mesmo tempo, esses mesmos críticos apontam uma série de bandas novas como sendo o “futuro do metal”.

O fato de o Prodigy ter feito um show lotado no Metropolitan, no Rio, em agosto do ano passado, bastou para que essas mesmas pessoas se vangloriassem com certa pujança da “cena techno” que invadira a cidade. Pouco mais de três meses, Helloween e Iron Maiden lotaram os shows no Rio, em São Paulo e Curitiba, com todos os seus dogmas e poses. Como é de praxe, a leitura dos críticos foi basicamente a mesma. Entre palavras articuladas e textos bem escritos, predominaram as acusações de repetição dos “clichês” de um estilo que estaria com os dias contados, nada contribuindo para a música de nossa época.

Agora foi a vez do Metallica. Mesmo depois de ter “pegado leve” nos últimos álbuns, com mudanças em sua postura, fez um show perfeito e ultrapesado, com cerca de duas horas e meia de duração. No dia seguinte, nos jornais, maior importância foi dada a fatores secundários, como o reclame dos vizinhos por causa do barulho, por exemplo. Teve gente até que cobriu o show como se fosse uma resenha esportiva, trocando nomes de integrantes das bandas (James por Jason), e inventando outros (Derrick what?).

As mesmas pessoas que ciclicamente se repetem com esses textos, volta e meia associam bandas novas que fazem um som mais pesado com um gancho jornalístico qualquer, e mostram o que eles chamam de “novo metal”. Assim foi feito quando o Suicidal Tendencies cruzou seu hardcore violento com o metal, e nasceu o crossover, quando o Faith No More recebeu o mérito de ter criado o funk’o’metal (antes sugerido por bandas como Killing Joke e Red Hot Chilli Peppers), e quando o Helmet e o Prong desenvolveram o “metal bate-estacas”.

Agora a bola da vez dos críticos é o “alternative-metal”, ou “metal-adidas”. E a explicação é simples. Considerando que o techno é o futuro da música, esses vanguardeiros de plantão acreditam que qualquer tipo de som que resulte de uma mistura, receba, ou exerça influência da cena techno, é motivo suficiente para se indicar uma nova tendência. É óbvio que bandas como Korn, Coal Chamber, e um sem fim de outros nomes, nada ou pouco têm a ver com o heavy metal. O metal é um estilo que pressupõe atitude, estilo, visual regido por certos dogmas, peso, muito peso, solos, muitos solos e riffs repetidos em demasia. Não foi essa a semente que o Black Sabbath lançou, e não foi o próprio Sabbath vítima da incompreensão da mídia na época em que iniciou suas atividades?

Para o fã de heavy metal, pouco importa se a banda da qual ele é fã está fazendo um trabalho revolucionário ou não. Importa sim, se o grupo é fiel aos seus preceitos, se atinge o seu público, e mesmo que, de certa forma, se repita. A repetição, nesse caso, representa fidelidade, lealdade e compromisso em manter vivo a chama de um estilo que vive e sobrevive da paixão de seus fãs, ele estando ou não em evidência na mídia. Passam-se gerações, outras aparecem, bandas se dissolvem, outras despontam, eventos são cancelados, outros persistem, e assim por diante. Bruce Dickinson, um dos baluartes do metal, disse que “o heavy metal jamais se esgotará, pois possui um público fiel, que é quase como uma comunidade, e que mesmo quando o metal não está na mídia, esse público sustenta uma cena forte e duradoura”. E pensar que Jonathan Davies, vocalista do Korn, se recusou a subir no palco com Bruce, por considerar seu trabalho “muito metal”(!).

Por isso, uma imprensa séria e real, deve perder a pose, deixar seus CD players de lado, abandonar as cadeiras da redação e ir aos shows, ver a reação do público, dos fãs, das pessoas enfim, antes de sair por aí distorcendo conceitos, e, o que é pior, repetindo mentiras. Adaptando a máxima de Joãosinho Trinta, headbanger gosta é de heavy metal; quem gosta da vanguarda do metal é a crítica.

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