O Homem Baile

Patti Smith dá lição de rock na segunda noite do Tim Festival

Musa do punk rock despeja energia e reverência à atitude rock; Yeah Yeah Yeahs mostra a força do novo underground sem depender da vocalista Karen O. Fotos: Alexandre Schneider/Divulgação Tim Festival (Patti Smith) e Publius Vergilius/Divulgação Tim festival (Yeah Yeah Yeahs).

Patti Smith fez do rock o destaque da segunda noite do Tim Festival

Patti Smith fez do rock o destaque da segunda noite do Tim Festival

A carreira de Patti Smith, embora incensada a torto e a direito, não chega a ser algo fenomenal. Por isso talvez a apresentação dela nesta edição do Tim Festival não fosse tão badalada assim. Um erro que a essa altura a grande mídia já deve estar a corrigir. A veterana cantora adentrou o palco principal do festival, ontem, trajando um blazer com gravata desatada sobre um jeans surrado e um par de coturnos típico do punk rock. Ela mal acabara de fazer o derradeiro show do CBGBs, em Nova Iorque, e estava ali, gritando, pisando duro e cuspindo no chão. Punk, ora bolas.

Patti mostrou com quantos rocks se faz um punk de verdade

Patti mostrou com quantos rocks se faz um punk de verdade

Enfim começava o Tim Festival desse ano, com uma americana mulher macho de quase 60 anos e os primeiros acordes de “Gimme Shelter”, dos Stones, regravado por meio mundo. Patti não tem uma discografia intensa, mas é dona de clássicos e de versões que lhe são bem próprias, e aí a escolha do repertório foi fundamental, em cada música e na seqüência em que elas foram apresentadas. Em todas a cantora inseria versos – palavras de ordem mesmo – que mexiam com o público, como se a música em si já não o fizesse. Em “Gimme Shelter” o apelo era de paz e gentileza. Mas não faltaram falas mais incisivas, como em “Southern Cross”, dedicada aos que perderam as vidas por causa de “governos incompetentes”, ou, claro, “People Have The Power”, que ganhou um discurso em favor do meio-ambiente e contra as grandes corporações – e isso num festival bancado pela TIM. A música foi introduzida com um apelo da cantora para que todos votassem, hoje, pensando num governo para servir o povo, não o contrário.

Patti Smith e o inseparável Lenny Kaye

Patti Smith e o inseparável Lenny Kaye

Se esse tipo de falação mexeu com a platéia, está longe de ser o ponto alto do show que resgatou o rock de verdade no Tim Festival. Patti Smith ganhou o público com aquilo que o rock tem de mais genuíno e precioso: a atitude, o jeito rocker de ser. Não que tenha adotado discursos oportunistas, sinceros até, mas pela postura com que ela e sua banda, por vezes complementada por um roadie, tiveram no palco. Era o rock de verdade, em músicas leves ou pesadas, lentas ou rápidas. Em “Free Money”, por exemplo, a coisa toda degringolou para uma euforia interativada entre público e banda que só o rock é capaz de proporcionar. E pensar que a grande maioria que queria ver o Yeah Yeah Yeahs acabou se rendendo à moça. Inesperadamente “Rock’n’roll Nigger” foi incluída no set e desaguou numa performance irretocável, com os solos mais que perfeitos (não só nessa música) do lendário guitarrista Lenny Kaye, e com Patti possessa.

Se músicas meio obscuras se transformaram em verdadeiros canhões do rock, o que dizer de “Gloria”, que encerrou o show; da excepcional “Because The Night”; e da suave “Kimberly”? Só mesmo a destruição das cordas da guitarra, a dedo uma por uma, e o momento mágico, em que ela empunha a guitarra em nome da revolução, contra tudo e contra todos, para explicar o inexplicável, o imponderável, o rock e sua incontrolável e irresistível atitude. Tudo simbolizado naquela magricela veterana que um dia viu o punk rock nascer.

Karen O se esconde atrás da máscara...

Karen O se esconde atrás da máscara...

Ficou ruim para o Yeah Yeah Yeahs. Mas como que ser patrício de cidade com Patti Smith fosse salvaguarda, o trio sujão de Nova Iorque não se intimidou e mandou ver. Os olhos estavam focados na vocalista Karen O e sua extravagante indumentária, mas é preciso fazer constar nos autos que o batera Brian Chase tem técnica e pegada espetaculares, e que o guitarrista Nicolas Zinner é quem deveria ser o cabeça do negócio todo. Eles foram ajudados por um roadie dublê de baixista e efeitos diversos, o que só serviu para conferir maior peso o show. A banda em si nem precisaria da extravagância da vocalista esquisitinha, por suas próprias qualidades, mas se ela tem algo a acrescentar a tudo isso, como não aproveitar?
Assim devem pensar todos na banda, enquanto Karen mostra a língua, cai no chão, rebola as nádegas pouco convidativas, tira máscara, põe peruca, engole o microfone… Parece até que a música praticada pela banda é ruim. Longe disso, o show é recheado de distorção e esporro. Músicas como “Honey Bear”, por exemplo, levam o público – nem tão grande, é verdade - a uma catarse coletiva. Ok que às vezes os gritos das fãs faz lembrar o público de Alanis Morissette, mas a vida é assim. No final, “Y Control” quebra tudo, e os músicos deixam o palco à Sonic Youth, com guitarras fazendo barulho sozinhas.

... E depois tenta ouvir a platéia

... E depois tenta ouvir a platéia

Antes de tudo, no Lab, o tal do Bonde do Rolê fez algo que reside entre o lamentável e o constrangedor. Se o funk de morro propagado no Rio já é de péssimo gosto, a coisa fica pior quando branquelos de Curitiba tentam imitar e faturar em cima e um hype vexatório. Deize Tigrona, coitada, ainda pegou carona num veículo onde a motorista deveria ser ela própria. No palco principal um mal escalado Mombojó fez de tudo para angariar novos fãs, mas se saiu muito mal. Só no final, com o hit “Deixe-se Acreditar” e uma boa releitura de Tom Zé para “Realismo Consciente” é que a coisa empolgou pra valer. Se está virando regra escalar uma banda de Recife identificada com o mangue beat, vale registrar que o Mundo Livre se saiu melhor no ano passado abrindo para o Stokes do que o Mombojó, este ano, para o Yeah Yeah Yeahs.

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