No Mundo do Rock

A eclética surf music do Dead Rocks faz bonito no exterior

Com apenas quatro anos de vida, grupo do interior de São Paulo já arrisca carreira internacional. Fotos: Divulgação.

Billie The Tiki, Johnny Crash e Marky Wildstone

Billie The Tiki, Johnny Crash e Marky Wildstone

A cidade de São Carlos pode não ter praia, mas é de lá que vem um trio instrumental que está dando o que falar, e não só aqui no Brasil. Os elegantes Johnny Crash (guitarra), Frank Funk (baixo) e Marky Wildstone (bateria) formaram o The Dead Rocks e fizeram o primeiro show em maio de 2002. O grupo foi destaque no Campeonato Mineiro de Surf, o principal evento voltado para a surf music e música instrumental do Brasil, em 2004 e 2005. Nesse mesmo ano o trio não pensou duas vezes: com “Brazilian International Surfs”, o primeiro álbum, debaixo do braço, partiu para a Europa com a cara e a coragem, onde fez 29 shows em 30 dias.

A musica do Dead Rocks se caracteriza por incorporar as referências mais diversas, muitas vezes vindas de fora do gênero ou mesmo do rock propriamente dito. No disco de estréia, há versões – algo comum na surf music – para músicas de artistas como Candeia e Cartola, e ainda referências na parte musical ao blues e ao funk de raiz. Não é a toa que Phil Dirt, o Papa da surf music mundial tem despejado elogios ao combo paulista.

Depois da turnê européia Billie The Tiki assumiu o baixo e o trio prepara “Tiki Twist”, um EP com quatro músicas novas. Conversamos com o Marky Wildstone, que nos contou um pouco de como a música do Dead Rocks é criada, das aventuras no primeiro mundo, o que eles esperam de uma banda brasileira essencialmente instrumental, e o que mais São Carlos pode apresentar para o rock nacional.

Rock em Geral: Por que decidiram tocar surf music totalmente instrumental? Vocês vêem viabilidade comercial nesse tipo de som?

Marky Wildstone: Não saberia te dizer o porquê dessa escolha, acho que foi um caminho natural dentro de nossas vidas. A partir do momento em que tivemos mais contato com esse estilo de música a coisa fluiu naturalmente. Sim, nós vemos uma viabilidade comercial para esse estilo de música, sem dúvida nenhuma, principalmente na área de cinema, televisão e novas tecnologias de mídia (games, sites, CD-Rom), e, é claro, na área de espetáculos, já que um show de surf music quando bem feito pode se transformar num espetáculo de primeira linha.

RG: Vocês trocaram de baixista recentemente. Por quê?

Marky: A mudança de baixista foi apenas por questão de prioridade em que a banda pode ser encarada para cada um de nós. O ex-baixista não conseguia mais levar a banda como prioridade dentro da vida dele enquanto o Johnny e eu estávamos cada vez mais pilhados a levar apenas a banda como atividade principal em nossas vidas.

RG: O disco “International Brazilian Surfs” teve lançamento no exterior? Como ele foi recebido?

Marky: Ele foi lançado apenas de forma independente aqui no Brasil, a banda que lançou, fechamos apenas contrato de distribuição com a Monstro Discos e conseqüentemente com a Tratore. Durante nossos shows da Europa vendemos quase 500 CDs em apenas um mês, e só nos shows. Recebemos boas críticas do pessoal por e-mail e em sites especializados. O disco foi muito bem recebido pelo Phil Dirt, que deu quatro estrelas numa resenha no site dele.

RG: De que outros lançamentos o Dead Rocks já participou?

Marky: Apenas de um 7 polegadas que saiu pela Mondo 77 Records, de Campinas, com mais três bandas brasileiras: Autoramas, Psicotrópicos Deluxe e Superstereosurf. Tem um 7 polegadas em vinil a sair na França, mas que por problemas financeiros da gravadora foi adiado por tempo indeterminado.

RG: Na surf music em geral há muitos covers de clássicos da música internacional, mas vocês optaram por fazer também versões de música brasileira (Candeia, Cartola). Conte o porquê dessa opção:

Marky: Acho que isso não é nenhuma grande novidade, faz parte da cultura brasileira usar ritmos e estilos artísticos mundiais sem perder a identidade nacional. Foi assim com os tropicalistas e mais cedo com os modernistas e sua antropofagia. Mesmo na surf music a banda The Pops já tinha feito isso nos anos 60, e o Estrume’n tal resolveu fazer agora. O nosso resultado é bem diferente e pretendemos dar continuidade a essa idéia.

RG: De onde/como vocês conhecem o trabalho desses artistas?

Marky: Somos músicos, não somos rockeiros. Esse estereótipo de que rockeiro não curte samba e não conhece música brasileira não se encaixa no nosso caso. Ouvimos de tudo desde muito cedo, de modas de viola caipira a drum’n’bass, de canções populares a músicos eruditos de vanguarda, de Juca Chaves a Flo Menezes e Aphex Twin, sem preconceito. É claro que quando vamos trabalhar com o The Dead Rocks existem objetivos muito bem focados, mas a nossa formação musical é bem ampla.

RG: Já fizeram alguma outra versão de músicos da mpb?

Marky: Ainda não, temos um projeto milionário arquivado que um dia vamos realizá-lo. Estamos trabalhando em algo para o disco novo, mas não dá pra adiantar nada porque não tem nada certo.

RG: Como vocês escolhem as músicas para fazerem as versões, incluindo as estrangeiras?

Marky: Alguém chega com a idéia, aí fazemos alguns testes para ver até que ponto vale a pena trabalhar na canção e até que ponto ela tem em sua essência o formato instrumental de surf music. Se ficar legal, trabalhamos no arranjo. Mas para a gente que toca surf music e ouve bastante música instrumental, quando ouvimos qualquer música já imaginamos como ela ficaria só com o instrumental e uma batida mais twist.

Johnny Crash detonando na Bélgica

Johnny Crash detonando na Bélgica

RG: Apesar das versões soarem familiares quando se escuta pela primeira vez, as músicas próprias costumam ser melhores, caso de “Crash, Crash And Crash Again”, “Dead Can Surf” e “Banana Hit”. Fale um pouco sobre essas músicas e de como vocês compõem:

Marky: A maioria absoluta das músicas começa através de riffs que o Johnny Crash traz para os ensaios, a partir daí trabalhamos em cima do arranjo durante horas e horas, às vezes dias ou até semanas até chegarmos num formato que nos agrade. Tentamos achar certas influências que o som remete e voltamos a escutar alguns clássicos para ver o que podemos melhorar nas músicas, pequenas introduções, finais, interlúdios. O processo de composição é basicamente trabalho árduo no estúdio, sempre com o volume altíssimo.

RG: Percebe-se também elementos do rock tradicional e da soul music no som de vocês. Você concorda? Como puxaram para esse lado?

Marky: Como disse anteriormente escutamos de tudo, é inevitável que elementos de outros estilos transpassem para a nossa música. Johnny é um guitarrista de rock praticamente completo, conhece tudo de rock’n‘roll e blues, temos a experiência de nossas bandas anteriores, de rock, punk rock, folk, blues, groove, psicodelia, pop, etc.

RG: Vocês fizeram uma turnê pela Europa no ano passado. Conte por quais países passaram, quantos shows fizeram, etc…

Marky: Fizemos um total de 29 shows em um mês, passando por quatro países: França, Alemanha, Bélgica e Itália. Foram quase 12 mil quilômetros de estrada e muito frio.

RG: Vocês conseguiram se bancar só com a turnê?

Marky: Conseguimos nos bancar só com a turnê, investimos nas passagens, mas o resto foi tudo bancando pelos shows e pela venda de merchandise. O trabalho foi muito sério e exige uma grande dedicação por parte de todos e um grande amor pelo que se faz, praticamente passamos um mês só respirando a banda, show, hotel, van, estrada, show, hotel, van, estrada, e assim por diante. Diria que foi uma viagem estritamente profissional, tivemos um dia de folga em um mês.

RG: Sobre os shows, quais vocês consideram os mais legais e por quê?

Marky: Acho que os melhores shows foram o de Paris e o de Dijon. No de Paris porque o show foi com uma banda punk, então estava lotado de punks e a casa praticamente não cabia mais ninguém. Foi incrível a receptividade do público, o que nos surpreendeu bastante. Em Dijon, uma cidade do interior, também foi uma noite inesquecível, com uma banda de abertura de psichobilly ótima e um clima bem selvagem.

RG: Por que vocês se vestem de terno para tocar surf music?

Marky: Porque músicos de surf music devem estar limpos, barbeados, bem vestidos e cheirosos, sempre foi assim, desde o começo dos anos 60. Apenas seguimos a linha das primeiras bandas de surf music da história, The Ventures, Surfaris e outras. É uma forma de respeitar o público, demonstrar profissionalismo e fazer da apresentação um espetáculo.

RG: Qual foi a maior platéia para que vocês já tocaram?

Marky: Acho que em um festival na Itália, umas 1500 pessoas, mas não sei dizer com precisão. Teve shows e festas aqui do interior paulista que passaram desse número, se não me engano.

RG: Como anda a cena rock em São Carlos?

Marky: A cena é bem devagar por aqui, mas nunca parou. Tem as bandas Tarja Preta e Carrão de Gás (hard rock), McQuade (indie), Bifidus Ativus (punk rock), Gagged (hardcore) e a Blues de Ville (blues). Atualmente tem três lugares bons para se fazer shows, o Satori, o Armazém e o Fábrica do Som. Mas é muito difícil trabalhar profissionalmente com música no interior, a maioria dos nossos shows é fora daqui. Mas a cena não para. Sempre tem alguém começando e alguém parando, tudo a passo de tartaruga.

RG: O Brasil é um país com muitas praias, mas a nossa surf music parece divorciada do surf. Como juntar as duas coisas?

Marky: Você tocou num assunto realmente interessante, estamos trabalhando e pensando nisso desde o começo do ano, estamos em contato com várias revistas e empresas de surf wear e estamos com um produtor no litoral paulista trabalhando com isso. A idéia é mostrar pra galera do litoral a surf music como opção musical de entretenimento, cultura e lazer e ver o que acontece. Tem que aparecer, mas tem que ser natural, acredito que é mais uma questão de desconhecimento. Fizemos um show em Caraguatatuba no mês passado, num campeonato de surf, e a galera se amarrou muito.

RG: Vocês pretendem lançar já um segundo disco? Como estão as gravações?

Johnny é um guitarrista de rock praticamente completo, conhece tudo de rock’n‘roll e blues, temos a experiência de nossas bandas anteriores, de rock, punk rock, folk, blues, groove, psicodelia, pop, etc

Johnny é um guitarrista de rock praticamente completo, conhece tudo de rock’n‘roll e blues, temos a experiência de nossas bandas anteriores, de rock, punk rock, folk, blues, groove, psicodelia, pop, etc

Marky: Pretendemos lançar um segundo disco em fevereiro ou março de 2007, segundo nosso cronograma. Temos quase 20 músicas novas e estamos selecionando e trabalhando nas melhores, gravamos cinco delas há três meses e quatro vão sair num vinil pela monstro discos. A que sobrou deve entrar no disco. Devemos entrar em estúdio no final de outubro, começo de novembro para já gravar o disco novo inteiro. Acho que não vai ter grande surpresa, não, o som continua o mesmo, o que mudou foi nossa experiência sobre gravações “vintage”, nosso equipamento está melhor e achamos um estúdio bem maneiro em São Carlos. Acho que com o EP que vamos lançar já vai dar pra ter uma boa amostra do que será o disco novo.

RG: Por que um EP e não um álbum completo?

Marky: Em primeiro lugar porque realmente gostávamos da cultura do vinil, em segundo para já lançar alguma coisa nova antes do segundo disco, para dar aquela respirada. Muita gente na Europa pedia vinil pra gente e até hoje escrevem para saber se saiu alguma coisa em vinil. “Tiki Twist” sai em vinil no final de agosto, começo de setembro, pela Monstro. As músicas são “Tiki Twist”, “El Bongo”, “L’Espion Invisible en Vacances” e “Center Of The Universe”, essa última já pode ser ouvida no myspace.com

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