No Mundo do Rock

Stewart Copeland revira arquivo e monta documentário sobre a história de sucesso do Police

Première mundial aconteceu este ano, em Sundance. Íntegra da entrevista feita para a matéria publicada na Bizz 201, de maio de 2006. Fotos: Janette Beckman (p/b) e Divulgação.

Numa das cenas do filme, o Police tocando na Holanda, visto do palco

Numa das cenas do filme, o Police tocando na Holanda, visto do palco

O fã do Police mais atento já deve ter observado nos antigos vídeos do grupo que o baterista Stewart Copeland vivia com uma câmera nas mãos, amolando o dia-a-dia nada tranqüilo do trio. As imagens captadas naquela época finalmente podem ser vistas pelo grande público no documentário “Everyone Stares – The Police Inside Out”, que teve a première em janeiro, no Festival de Sundance. O filme é uma simples colagem das imagens feitas na época, sem roteiro ou narração de fundo, e deve ser lançado mundialmente em DVD e exibido em festivais de cinema pelo mundo afora.

O Police nasceu no embalo da primeira safra do punk, em Londres, em 1977, e logo se destacou por inserir a música negra à new wave que dominaria o mercado musical no início dos anos 80. Rotulado pela mídia como “reggae de branco” o trio atingiu sucesso em todo o mundo, inclusive no Brasil, onde tocou em 1981. Lançou apenas cinco álbuns: “Outlandos d’Amour” (78), “Reggatta de Blanc” (79), “Zenyatta Mondatta” (80), “Ghost In The Machine” (81) e “Synchronicity” (83), antes de se separar, em 85. Dizia-se, na época, que Stewart, fundador e baterista, vivia às turras com o baixista Sting, maior talento e vocalista. Em 86 ainda se tentou em vão um retorno, e em 2003, na cerimônia de admissão ao Rock’n’Roll Hall of Fame, em Nova Iorque, os três tocaram juntos por cerca de 20 minutos.

Fora do Police, Sting seguiu carreira solo de grande sucesso; Stewart Copeland se tornou um requisitado produtor de trilhas sonoras, além de volta e meia tocar com outros artistas, como recentemente fez numa versão capenga dos Doors; e o guitarrista Andy Summers voltou a trabalhar em diversos projetos, sem deixar de lado uma razoavelmente bem sucedida carreira solo. Conversamos por e-mail com Stewart Copeland, que destrinchou toda a história por trás do documentário e aproveitou, claro, para dar umas alfinetadas em Sting. E lá se vão mais de vinte anos…

Rock em Geral: Como apareceu a idéia de fazer um filme sobre os tempos do Police?

Stewart Copeland: Eu estava mexendo com um novo programa de computador chamado “Final Cut Pro” para edição de filmes. Estava pensando em algo para fazer com meu novo brinquedo quando me lembrei das horas de coisas filmadas que eu fiz com minha câmera super 8 na época do Police. Uma coisa me levou à outra.

RG: Por que você não fez isso antes?

Stewart: Antes não havia tecnologia disponível para fazer a edição sem grandes custos. Há uns anos eu tentei transferir o filme para o vídeo, mas foi um processo terrível. Foi só recentemente que as horas de filmagem pode caber dentro de um pequeno HD menor que uma casa.

RG: Como é o filme? É uma espécie de documentário?

Stewart: O filme é sobre guiar um barco do rock. Tínhamos acabado de emergir da pobreza total quando eu arrumei a câmera. Quase imediatamente a banda começou a aparecer e a viagem mais inacreditável começou. Começa com nós guardando nossos equipamentos em motéis baratos e termina com a banda tocando em estádios. Não há muita história ou análises no filme. O assunto não é exibido pela câmera como um documentário normal. Quem vê o filme é o personagem principal e os eventos aparecem na câmera. Quando você vê este filme você é o baterista numa banda e o seu nome é Stewart.

RG: Você escreveu um roteiro ou só colocou as cenas juntas, guiado por sua intuição e memória?

Stewart: O filme se escreveu sozinho. Ou, melhor, o material era tão subjetivo que só havia este jeito de mostrar esta história.

RG: Quantas horas de filmagem você usou para fazer o filme? E em quanto tempo trabalhou nesse material?

Stewart: Cinqüenta horas de filme, o que não parece muita coisa nessa era do vídeo, mas essa quantidade de material filmado como antigamente é muita coisa.

RG: Como era, naquela época, gravar as cenas e tocar bateria “ao mesmo tempo”? E como foi o processo agora, de editar todas essas cenas depois de 20 anos?

Stewart: O filme foi feito por dois caras diferentes. Foi filmado por um com uma cabeça de vinte e poucos anos e editado 20 anos depois por um (levemente) mais maduro, pai de família. Voltando àquela época, eu achava que era o Stanley Kubrick, e agora eu estou simplesmente surpreso com as filmagens.

RG: Que cenas você gostou mais? Por quê?

Stewart: Eu gosto quando as pessoas no filme falam para a câmera gritando o nome. Os fãs gritam para a câmera: “Stewart!” Os jornalistas apontam seus microfones para a câmera: “Sr. Copeland…” e muitos companheiros de banda gritam para a câmera: “Stewart!”. Como eu disse, quando você vê o filme, seu nome é Stewart.

Stewart prepara a banda para mais um take dos bastidoes do Police

Stewart prepara a banda para mais um take dos bastidoes do Police

RG: Como foi a première no festival de Sundance?

Stewart: Cheia, animal…

RG: Você usou material de outros vídeos do Police, como o “Police Around The World”, por exemplo? Ou no filme só tem cenas inéditas?

Stewart: É (quase) tudo original, gravado com a minha câmera.

RG: Sobre a trilha sonora, você usou as músicas do Police?

Stewart: A música é quase toda do Police. Muito disso é de material ao vivo “lobotomizado” que eu cortei e remontei em novas formas brutas. Eu cortei a bateria e o baixo dos shows ao vivo e adicionei overdubs em estúdio em todos os lugares errados. Há um interesse muito grande nessas versões, que eu chamo de “derangements”.

RG: O filme vai ser exibido nos cinemas ou só vai ser lançado em DVD?

Stewart: É mais para DVD. Alguns países mostraram interesse em lançamentos em cinema, mas o filme foi feito para DVD mesmo.

RG: Você pretende fazer novos filmes? Ainda há cenas que não foram utilizadas?

Stewart: Tem outros quinze minutos de filmagem desorganizada e outros dez de cenas ao vivo que estarão no DVD como bônus. Ao menos é o que eu espero, pois ainda estou trabalhando nas liberações legais.

RG: Eram comum, nos tempos do Police, as notícias sobre discussões entre você e o Sting. Sempre se comentava de momentos em que vocês chegavam às vias de fato. O que há de verdade nisso? Há algo no filme que explica melhor essa situação?

Stewart: Tem briga no filme. O Sting zoa o Andy, mas os dois estão de sacanagem. Eu não tenho nenhuma imagem da banda brigando de verdade. Em cada cena você pode ver que nós realmente gostávamos da companhia uns dos outros. Nós de fato nos envolvíamos em uma violência emocional gratuita, mas na maior parte das vezes era por pura diversão. Em qualquer banda que se preze existe uma tensão artística e nós não éramos diferentes. Mas na maior parte do tempo nós gostávamos um do outro.

RG: Na sua opinião, qual foi o principal motivo da separação do Police, depois de ter lançado “Synchronicity”, o disco de maior sucesso?

Stewart: Quando você chega aonde você queria ir, a viagem acaba.

RG: Como foi tocar junto com a banda de novo no Rock’n'roll Hall Of Fame? Vocês chegaram a pensar numa volta, ou numa turnê de reunião?

Stewart: Foi ótimo tocar com o Police durante vinte minutos. Foi uma só sombra de nossa glória do passado, mas muito legal ao mesmo tempo. Depois do show nós saímos do palco e não nos vimos outra vez por vários meses. Não houve papo de voltar com o Police. O Sting relaxou mais a cada hora que passava sem tocarmos no assunto de voltar com a banda.

RG: Como é a relação entre vocês três hoje? Vocês costumam se falar, mesmo por telefone?

Stewart: Nos damos bem, nos falamos regularmente por telefone e e-mail.

RG: Eles já viram o filme? O que acharam?

Stewart: O Andy adorou o filme porque ele é realmente uma estrela nele. As cenas com ele são as mais engraçadas. Ele foi ovacionado no festival de Sundance. O Sting tem uma fobia de se ver na tela, mas os filhos dele disseram que o filme é bom. Ele tem sido incentivador.

RG: Li numa revista que o Sting pretende tocar muitas músicas do Police na próxima turnê dele. O que você acha disso? Você acha que ele sente saudades da banda hoje, mais do que antes?

Stewart: Tenho certeza de que ele não sente nenhuma saudade do Police.

Até que eles eram amiguinhos, não eram?

Até que eles eram amiguinhos, não eram?

Tags desse texto: ,

Comentários enviados

Sem comentários nesse texto.

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado