O Homem Baile

Menos banda e mais eletrônico, Sisters Of Mercy aponta mudanças com a nova formação

Grupo se apresentou ontem no Circo Voador, no Rio. Repertório privilegiou fases mais recentes e as novas músicas.

Quando esteve no Brasil em 1990 o Sisters of Mercy não deixou o mesmo estrago que o Echo uns anos antes, mas fez história com dois shows que marcavam a última formação da banda antes da atual. Era a época do disco “Vision Thing”, que, de tantas guitarras acabou flertando com o hard rock e com o metal gótico que a banda iria influenciar dali pra frente. Daí a expectativa por um show deles agora, às vésperas de ser lançado um novo álbum, ser das melhores.

A cortina de fumaça era tão grande quando a banda subiu no palco que o vocalista Andrew Eldritch, o visionário mago dos anos 80, com seus tradicionais óculos escuros e a voz do fundo das trevas só pode ser visto lá pela quinta música. Mesmo com o público disposto, farto e sortido, o show só começou a empolgar em “Dominion”, o primeiro dos hits – se é que podemos chamar assim – que foi cantado em uníssono, ao menos no refrão. “This Corrosion” foi outra contemplada pela participação do público e fez do álbum “Floodland”, o segundo deles, o preferido da noite.

O problema é que o som da grande fase do Sisters era marcado por um baixo à frente da guitarra, que investia em evoluções minimalistas e poucos solos. No fundo, uma bateria eletrônica e a cavernosa e inigualável voz de Andrew Eldritch. No show de ontem, o que se viu foi que somente Eldritch restou. Sem pressão, a bateria não sortia o efeito de antes, e a formação, sem baixo, cujo som às vezes aparecia pré-gravado, ficou descaracterizada e fez as músicas – novas e antigas – ficarem muito assemelhadas entre si. Os dois guitarristas (Chris Catalyst e Ben Christo) tocam praticamente a mesma coisa o tempo todo, nenhum deles faz as vezes do baixo. E , no caso do Sisters, isso foi crucial.

Andrew também ignorou aquela que é a melhor fase do grupo, que se encerra justamente com o lançamento do primeiro disco, “First And Last And Always” – e que teve a faixa-título como encerramento, já no segundo bis. O melhor do Sisters vem dos EPs e compactos lançados aos montes antes de a banda assinar com a gravadora. Desse período, só três músicas abrilhantaram o set: a genial “Alice”, “Temple Of Love” e “Anaconda”, essas duas últimas em versões bem descaracterizadas. Talvez pela formação com duas guitarras ele tenha optado por fazer o set com ênfase nas músicas do “Vision Thing”, já com uma banda toda renovada e com dois guitarristas, um deles Tim Bricheno, do All About Eve. Por isso músicas como “When You Don’t See Me”, que tem um riff arrebatador, e “Denotation Boulevard”, outra que só mostrou intimidade com o público no refrão, ganharam destaque nos cerca de 90 minutos em que a banda esteve no palco.

As músicas novas seguem a linha que a formação permite, onde o Sisters aparece menos como banda e muito mais como “projeto eletrônico”, em que pese a quantidade de sons pré-gravados e soltados pelo tecladista Nurse. Ele chegou a utilizar uma seqüência de “Giving Ground”, música gravada na época em que, impossibilitado de usar o próprio nome por uma disputa judicial, o Sisters atendia por Sisterhood. Se na gravação do primeiro disco dessa fase Andrew não cuidar com carinho das guitarras, e, ainda, deixar o baixo de lado, periga o Sisters entrar no caminho da eletrônica repetitiva e estéril. O que, convenhamos, seria uma pena.

Tags desse texto:

Comentários enviados

Sem comentários nesse texto.

trackbacks

There is 1 blog linking to this post
  1. Rock em Geral | Marcos Bragatto » Blog Archive » Reconfigurado

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado