Fazendo História

Suede
O belo fracassado?

Matéria que tratava da falta de sucesso na carreira da banda britânica Suede. Em 2004 ela vira a se desfazer. Publicado na Rock Press 52, de 2003.

suedeA imprensa britânica tem fama de estar sempre inventando uma nova grande sensação a cada semana. A pecha não é injusta, e muitas dessas bandas se tornam grandes sucessos mesmo, com a ajuda de jornalistas em todo o mundo, que desde a época do telégrafo já estavam antenados com as novidades londrinas. Outras não. Seriam elas as grandes perdedoras, ou estaria o esquema com um sério problema de funcionamento? A segunda alternativa parece ser a mais correta, mas no caso do Suede a primeira não chega a estar totalmente errada.

Em cerca de 13 anos de estrada o Suede, que ajudou a pavimentar a estrada para o estouro mundial do britpop, chega ao seu quinto álbum de carreira, em meio a um sem número de singles, coletâneas e EPs, como bem gosta e funciona o mercado inglês. É o apenas razoável “A New Morning”, que quebra uma incrível hipérbole crescente formada pelos seus quatro antecessores: “Suede” (93), “Dog Man Star” (94), “Coming Up” (96) e “Head Music” (99).

Desde seus primórdios o Suede funde a androginia do glam rock, a sensibilidade do pop/rock inglês, as guitarras pesadas, porém não exageradas, e (aí, sim) o exagero verborrágico e de postura, nas declarações do grupo, sobretudo do polêmico vocalista Brett Anderson. Além do mais, muitas das letras são verdadeiros folhetins melodramáticos, nos quais a performance de Brett é perfeita, encaixando-se em forma e conteúdo. Carismático, ele manipula muito bem os sentimentos de seus fãs, e de quem se atrever a interpretá-lo. Tal qual uma esfinge, cativa pelo enigma que representa.

Em abril de 92 completavam o grupo Richard Oakes (guitarra), Simon Gilbert (bateria) e Mat Osman (baixo). Depois de fazer vários shows que eram verdadeiras performances nos subúrbios londrinos (um deles com uma empolgada participação de Morrissey), devidamente flagrados pela imprensa local, o Suede apareceu na capa do semanário New Musical Express com o título “a melhor banda nova do Reino Unido”. E isso dois meses antes de colocar nas lojas seu primeiro single, “The Drowners”. Nesse momento, Londres passou a viver numa espécie de “Suedemania”. Depois seria a Inglaterra, a Europa, a América e o mundo, certo? Errado.

O segundo álbum, “Dog Man Star”, à época um vinil duplo, com 12 músicas, teve uma esplêndida aceitação na mídia inglesa, e marcou a entrada do guitarrista teen (17 anos) Richard Oakes, no lugar de um cansado Bernard Butler, logo após o lançamento do álbum. Ele só iria participar, como compositor, nos singles que preparariam o terceiro álbum, “Coming Up”. E o garoto não decepcionou, mantendo o pique e a extrema sensibilidade do grupo. O álbum também marca a estréia de um novo tecladista, Neil Codling, que ficaria no posto até 2000.

Só que a essa altura o Suede havia chegado a um limite de seu próprio sucesso, já deixara de ser a “next big thing”, mesmo na redação do NME, e, ao mesmo tempo, não tinha se tornado uma unanimidade mundial como o Oasis. O grande tempo entre o terceiro álbum e o quarto, quase três anos, preenchido por shows, singles e uma ótima coletânea, era a senha para se identificar um grande vácuo criativo e de empolgação de Brett Anderson e cia. Mas a resposta viria com “Head Music”, talvez o melhor álbum, se considerarmos todo o conjunto da obra, embora tenha sido recebido friamente pela mídia.

Mais três anos e o Suede reaparece com o apenas razoável “A New Morning”, cujo título já vem com cheiro de mudança, e do qual se destaca apenas uma música ou outra. É um álbum com algumas músicas muito boas, com o é tradição do grupo, e outras só para completar o CD, e é aí que se identifica uma piora, fruto de certa estagnação. Entre as mais belas (e não há adjetivo melhor para as coisas feitas pelo Suede) está a faixa de abertura, “Positivity”, com uma letra bem própria do grupo. Afinal, que mais escreveria “seu sorriso é seu cartão de crédito”, senão Brett Anderson? E isso numa baladinha altamente relaxante. Outra de arrepiar é a sugestiva “Beautiful Loser”, que mostra um flerte com alguém que insiste em agir da maneira mais difícil, mas que tem a admiração de Brett, em cima de um espantoso, porém simples trabalho de guitarras de Richard Oakes, num arranjo precioso. “Beautiful Loser” está no nível de granes sucessos do grupo, como a genial “Starcrazy”, “The Drowners”, “Animal Nitrate” e “Everything Will Flow”, só para citar alguns.

Em “Obsessions”, é a descontração que toma conta, onde até uma gaita entra na história, e Brett remete aos seus bons tempos numa interpretação refinadíssima. Excetuando-se essas três, que facilmente podem figurar num “best of” do Suede, o restante do álbum não emplaca. A rigor existem muitas canções intimistas em que dedilhados de violões, embora de muito bom gosto, com é de costume, “quebram” um pouco o irresistível sabor pop que o grupo sabe tão bem impingir, sobretudo em se tratando de guitarras. Em “Head Music”, por exemplo, essa seqüência de boas músicas, com um “punch”, e ao mesmo tempo, uma fluência pop irresistível, arrebatavam qualquer mortal. Essas músicas não chegam a ser ruins, na acepção da palavra, mas sim desmotivadoras do ouvinte, considerando “A New Morning” como um todo.

Apesar disso tudo, já que o álbum é a primeira “bola na trave” do Suede, “A New Morning” merece ser digerido em pequenas doses, de preferência entre pratos mais apetitosos, com “Head Music” e “Coming Up”, por exemplo. Que se sirva, então, o jantar completo.

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