O Homem Baile

Rolling Stones traz a felicidade para de 1,2 milhão de brasileiros

Maior e definitivo show da história da banda aconteceu sem grandes incidentes em Copacabana. Brasil, Canadá, Estados Unidos e México viram a histórica apresentação pela TV, ao vivo. Fotos: Flávio Hopp.

A linha de frente dos Rolling Stones no palco pequeno

A linha de frente dos Rolling Stones no palco pequeno

Poderia ter sido um comício das Diretas Já ou a comemoração do penta. Mas foi um show dos Rolling Stones que deu números expressivos a um evento que, a despeito de todos os temores, aconteceu dentro da mais branda normalidade. Agressividade mesmo só na atitude da banda, que voltou a mostrar a usual vitalidade.

Antes, quanto muita gente ainda se dirigia à Copacabana – e o acesso nem foi tão demorado assim – o DJ Janot, um grão de areia naquele palcão, tocava os sucessos da mpb que lhe deram fama nos últimos tempos no Rio. Ele mexeu com a platéia ao tocar uma música do U2. O público reagiu num misto de apoio e revolta, já que o grupo de Bono decidiu tocar só em São Paulo. Com problemas no equipamento, que falhava sem parar, Janot acabou deixando o palco mais cedo. O AfroReggae bem que tentou, tocando sucessos de outros artistas – de John Lennon a Raul Seixas – mas a pouca qualidade artística do grupo impediu maiores progressões. Não fosse o trabalho social por eles desenvolvido, certamente não teriam o espaço que têm. Só mesmo o Titãs conseguiu levantar o público, com um repertório repleto de sucessos. Quando eles entram no palco, a notícia é que já havia 700 mil pessoas em Copacabana. O grupo levou a primeira música, “Flores”, inteirinha para ajustar o som, mas depois se garantiu, e muito bem, com “Bichos Escrotos”, “Aluga-se” (Raul de novo) e “Polícia”, entre outras.

Mick Jagger: duas horas sem parar

Mick Jagger: duas horas sem parar

Um vídeo bem simples com a tradicional língua que representa a banda envolvida em explosões, numa referência ao título do último álbum, “A Bigger Bang”, distraía o público até que os primeiros acordes de “Jumping Jack Flash” iniciaram o espetáculo. No palco, só os quatro Stones e o baixista Daryll Jones. Mesmo com o som baixo, um dos maiores riffs em todos os tempos levantou o público que continuou em êxtase nas duas seguintes: “It’s Only Rock’n’roll” e “You Got Me Rocking”, a essa altura com toda a bandaça no palco, incluindo tecladista, vocais de apoio e um naipe e metais usado alternadamente. Em “Let Me Down Slow”, a primeira do último disco, o rebolante Mick Jagger, que mal pára entre uma música e outra, desce pela primeira vez até a passarela montada no meio do público. Antes de “Rain Fall Down”, um funkão do novo repertório, Jagger cumprimenta paulistanos, baiano, gaúchos e cariocas, sempre lendo frases em português num monitor embutido junto às caixas de retorno.

O palco dessa turnê é grandioso como sempre, e possui até design semelhante aos usados nas anteriores, com pequenas coberturas individuais em acrílico transparente para bateria, teclados e amplificadores. O telão gigante montado atrás do palco é de altíssima definição, e quebrou o galho de muita gente que não conseguiu chegar tão perto. Já os efeitos especiais de outros tempos – fogos, labaredas, explosões, papel picado – foram abolidos. O que de certa forma só destaca a performance da banda propriamente dita. Ou, melhor, a de Mick Jagger, que com 62 anos não parou um segundo sequer, abusando de caras, bocas e do rebolado mais famoso do mundo. Quem tentou contabilizar quantas vezes ele o repete no show se embaralhou.

BANDA DESLIZA E VAI TOCAR NO MEIO DO PÚBLICO

Keith Richards cantou em duas músicas

Keith Richards cantou em duas músicas

Como ninguém é de ferro, Jagger descansa quando o grupo faz duas músicas cantadas por Keith Richards – a baladinha “This Place Is Empty” e ”Happy” – estrategicamente colocadas bem no meio do show. Só um descanso para Jagger, aliás, justifica a cantoria de Richards, que nunca foi um grande vocalista, e sua voz já inexiste há muitos anos. Antes de ele assumir os vocais, uma homenagem a Ray Charles, falecido em 2004, com “Night Time Is The Right Time”. Atitude muito justa por sinal, uma vez que os Stones começaram carreira imitando descaradamente a música americana da época. Mas quem arrasa cantando boa parte da música é a sensual Lisa Fischer, velha conhecida do público brasileiro, já que esteve com os Stones aqui em 1995 e 1998. O final da música é a deixa para a apresentação, uma a um, de toda a banda, sempre com destaque para o vovô Charlie Watts, que os 64 continua tocando com um vigor de garoto. Jagger já descansava nos bastidores quando Richards começou a cantar.

Mick Jagger volta tocando guitarra em “Miss You”, música na qual acontece a grande atração dessa turnê. Reunidos num pequeno palco, os quatro Stones e Daryll Jones são projetados, sem parar de tocar, sobre a passarela de 60 metros que cruza o público, e vão parar, literalmente, no meio da massa. O público vai ao delírio, no único momento do show em que ele pode se aproximar dos ídolos, sem as inconvenientes “áreas vips”. Lá eles tocam quatro músicas. Em “Honky Tonk Women” voltam, causando o mesmo estrago nas laterais da passarela. De volta ao palco principal, é a vez de uma suave batucada iniciar “Sympathy For The Devil” e a última parte do show. A essa altura, à exceção de Watts, eles já tocaram de roupa e guitarra várias vezes. Ron Wood praticamente usou um instrumento em cada música, incluindo uma guitarra havaiana, uma espécie de “guitarra sem braço”, onde ele toca slide guitar, sentado, em “Happy”.

O vovô Charlie Watts aguentou bem

O vovô Charlie Watts aguentou bem

As duas músicas finais são a esperada “Start Me Up” e “Brown Sugar”. Nesta o telão mostra trechos de um clipe na qual uma mulher gigante passeia por uma Nova Iorque futurista. Em outras turnês, esse artifício de mostrar cenas antigas da banda, ou mesmo trechos de videoclipes no telão, eram mais usados. Desta feita, só em algumas músicas isso aconteceu, como em “It’s Only Rock’n’roll”, por exemplo. Melhor para a multidão de fãs, que, se de longe só via Jagger e cia. em miniatura, pode vê-los no espetacular telão. O bis vem com “You Can’t Always Get What You Want”, um dos momentos mais emocionantes, com destaque para o soberbo naipe de metais. Jagger usa uma típica camiseta adquirida num camelô na porta do Copacabana Palace. E uma longa, porém indispensável versão para “Satisfaction” encerra o espetáculo, que teve exatas duas horas de duração. Como se não quisesse ir embora, Jagger passeia delirante pela passarela entre o público, esbanjando simpatia e gratidão.

A turnê de “A Bigger Bang” tem sido anunciada como a última dos Stones, até pelo avançar da idade de seus integrantes. Entretanto, a julgar pelo que se viu ontem em Copacabana, eles não vão deixar os palcos tão cedo. Primeiro porque, é evidente que eles gostam disso. Milionários, poderiam deitar na fama e curtir o fim da vida num paraíso fiscal, mas preferem compor, lançar disco e sair em turnê. E, depois, porque, na casa dos sessenta, ainda têm uma surpreendente vitalidade. Se, doravante, algum grupo vir ao Brasil, cobrar mais de duzentas pratas e tocar menos de duas horas, você pode ir lá exigir o dinheiro de volta. Quanto aos Stones, uma coisa é certa: logo, logo eles estarão de volta ao Brasil.

Set list completo

1- Jumping Jack Flash
2- It’s Only Rock’n’roll
3- You Got Me Rocking
4- Let Me Down Slow
5- Oh No Not You Again
6- Wild Horses
7- Rain Fall Down
8- Midnight Rambler
9- Night Time Is The Right Time
10- This Place Is Empty
11- Happy
12- Miss You
13– Rough Justice
14- Get Off Of My Cloud
15- Honky Tonk Women
16- Sympathy For The Devil
17- Start Me Up
18- Brown Sugar
19- You Can’t Always Get What You Want
20- Satisfaction

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