Rock é Rock Mesmo

Bandas pequenas devem tocar em lugar pequeno mesmo

O Franz Ferdinand é uma bandinha pequena que acabou de lançar o segundo disco, e ainda vai ter que ralar muito, comer muito angu para mostrar ao que veio. Por isso, é do tamanho do Circo Voador.

Meus amigos, notícias ruins e notícias boas. Se o U2 não vai tocar no Rio, a confirmação do show do Franz Ferdinand caiu como uma bomba, e na cidade não se fala em outra coisa. Tem gente que tá vibrando e não agüenta esperar. Tem gente que acha que o Circo Voador é pequeno para a banda. Tem gente reclamando que não vai conseguir entrar. Tem gente que sacou o talão de cheques. Ou o revólver. Gente, gente, gente.

Sou do tempo, vejam vocês, em que o nome Franz Ferdinand era algo a ser decorado porque poderia cair na prova. Foi a morte deste arquiduque que detonou o início da Primeira Guerra Mundial. Era preciso saber isso para se dar bem na escola. Hoje, na escola da música pop, é preciso saber muito mais, e muito mais de tudo, porque ontem o Franz Ferdinand não era nada, hoje é o máximo, e amanhã, ninguém sabe, mas provavelmente nada vai ser. A velocidade com qual uma banda sai do anonimato e vira uma espécie de unanimidade é brutal. Mas, acreditem, a coisa não era assim. O U2, por exemplo. No segundo disco deles, “October”, de 1981, eles ainda não eram nada. As coisas só começaram a acontecer no terceiro, “War” (83), e o grupo só virou banda gigante no “The Joshua Tree” (87). No Brasil, inclusive, os discos do grupo só passaram a ser lançados a partir de 1984, e eles já tinham quatro álbuns. O Police. Era uma banda conhecida como símbolo da new wave e do na época chamado de reggae branco. Tinha lá seus fãs e hits pontuais. Mas a banda só foi estourar a partir do quarto álbum, “Ghost In The Machine”, de 1981, e abraçou o sucesso com o espetacular “Synchronicity” (83). Os exemplos são da década de 80 de propósito.

Hoje, não. É tanta coisa no menu que a gente não sabe o que comer. Qualquer banda ali da esquina vira unanimidade antes mesmo de gravar um disco. É o que chamam pejorativamente de hype e tal, mas a coisa pode ser mais complexa. Quem começou com essa história toda foi o Strokes, que fez o nome a partir da Internet, e era tão conhecida mundo a fora que tocou, por exemplo, no palco principal do Reading Festival na véspera do lançamento do primeiro disco. Eu disse primeiro. E era um disco aguardadíssimo. (Aliás, como eles são ruins de palco, né?). Agora acontece coisa semelhante com o Arctic Monkeys, que acaba de lançar o primeiro álbum, mas já é uma grande unanimidade. Hoje os grupos ganham disco de ouro sem ter sequer um disco lançado. Que tempos são esses, hein?

Falei, falei, falei, mas não disse o que queria. Onde quero chegar é no Franz Ferdinand. E não preciso nem ficar aqui explicando isso ou aquilo da banda, afinal todo mundo sabe, todo mundo já ouviu, vai cair na prova. Mas não era assim no início de 2004. No longínquo ano de 2004. Na época, como editor da Revista Dynamite, pautei para uma das correspondentes na Inglaterra uma materinha apresentando umas bandas britânicas que incluía o Franz Ferdinand como destaque. Fui bombardeado pelo dono da revista e até por um colaborador, que acharam um absurdo ficar dando espaço para “bandinhas pop que não vão dar em nada” em detrimento de outros artistas que eles julgavam mais importantes. Hoje é bom olhar para trás, e em meio a essa badalação em torno da banda, saber que a primeira vez em que eles apareceram na mídia impressa no Brasil foi pelas mãos deste que vos escreve.

Mas não era isso que eu queria falar. O que eu quero deixar claro é que o Franz Ferdinand é uma bandinha pequena. Eis a mais absoluta das verdades: trata-se de uma banda pequena que acabou de lançar o segundo disco, e que ainda vai ter que ralar muito, comer muito angu para mostrar ao que veio. Por isso, não me espanta que esses escoceses descolados venham tocar no Rio, no Circo Voador, uma casa com capacidade para, nesse dia, 2500 pessoas. É esse mesmo o tamanho do Franz Ferdinand. O que me assusta, é que grupos novos, com um, dois discos no mercado, toquem em casas enormes como o Claro Hall, proporcionando aquele cenário lamentável de poucos apinhados à frente do palco. Banda grande, lugar grande; banda pequena, lugar pequeno. Cada coisa no seu lugar, como versa o anedotário popular.

Já disse, também, que uma banda de abertura para um show de um medalhão como U2 é uma grande bobagem. Porque simplesmente ninguém vai lá para ver banda de abertura. E mesmo que uns incautos se prestem a este serviço, vão dar com os burros n’água, dada as proporções de um evento como esse, sobretudo no Brasil. Aliás, pela bagunça generalizada já na venda e ingressos, dá para se ter uma idéia. Por isso, o show do Franz Ferdinand propriamente dito vai ser mesmo no Circo, até porque o repertório apresentado num show só deles deve ser maior do que o de um de abertura. Ao menos é o que esperam os fãs do U2. Outra bobagem, por falar nisso, é o grupo não tocar também em outras cidades, mesmo porque eles pretendem ficar no Rio até o Carnaval. Tem produtor por aí que não tá sabendo ganha dinheiro, não.

Mas vamos voltar a falar do hype. Uma das coisas mais nefastas no mundo da música é o culto do novo pelo novo. A banda de hoje é melhor que a de ontem e pior que a de amanhã, tudo vira muito de um minuto a outro. É isso que, como dizia o grande Luiz Calanca, faz um jornalista matar o rock de segunda a sábado para no domingo apresentar a sua salvação numa nova bandinha. Só que hoje é de minuto a minuto, e aí a coisa degringola. No entanto, é preciso ter cuidado, porque no meio desse bololô todo pode ter bandas legais e que podem crescer com o tempo. Não dá pra rechaçar tudo, só é preciso dar tempo ao tempo. E é justamente este tempo que querem nos subtrair, tudo tem que ser rápido. Por isso, vamos ao Franz Ferdinand no Circo, sim. Quem sabe no futuro, a banda cresça e tal qual o Rush, ainda toque no Maracanã. Se não crescer, sem problemas também. O Circo vai continuar ali.

Até a próxima, e long live rock’n’roll!!!

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