Rock é Rock Mesmo

Eu quero minha MTV, não esta que aí está

Quem liga a MTV hoje, se depara não com um canal de música, mas de variedades. Mas nem sempre foi assim.

Meus amigos, como mudam as coisas. O que ontem era o máximo hoje pode não ser nada. Tendências, diriam uns; moda, reclamam outros; vivemos no mundo das celebridades, atestaria um terceiro incauto. Do jeito que esta prosa ruma, um inevitável saudosismo parece pairar na tela deste colunista. Justo eu, que, via de regra, não sou simpático a revivals oportunistas. Mas o fato é que, concordem ou não, já não se fazem mais MTVs como antigamente. Não que eu queira que tudo volte a ser como era, mas vale dar uma olhada pra trás para se ter uma idéia rasteira de como as coisas podem ser melhores num canal de televisão que se diz “de música”.

A bem da verdade, já há tempos estou para tocar no assunto. Eu não queria falar, mas agora vou dizer. Lia, e ainda leio, outros jornalistas descerem o sarrafo na MTV, em seus apresentadores (VJ é moderno demais até para um vestibulando da modernidade como eu), a programação, a estética enfim. Há mais de um ano ou dois venho lendo isso aos borbotões, sem nunca poder emitir eu próprio a minha opinião, simplesmente porque eu raramente assisto a MTV. E olha que, mesmo morando debaixo do Cristo, a super estrada da comunicação não me impede de ter um bom sinal. Lia a crítica, e ficava de checar mais tarde na programação da emissora, mas nunca o fazia. Tentava, mas não fazia. Meus amigos, acreditem: há uns três ou quatro anos eu não consigo ver a MTV. Tento, mas não consigo, sequer, dar uma olhadinha, só para emitir uma reles opinião. Eis a mais pura verdade: não dá mais pra ver MTV. (O Dream Theater novo é praticamente um tributo ao rock progressivo).

Mas, porém, entretanto, contudo, todavia, achava que era normal: eu é que estaria impaciente, ou focado em outras prioridades, mais interessado numa ou noutra pelada do brasileirão por pontos corridos. O tempo, sempre ele, se encarregou de sedimentar conceitos que se catalisaram, creio eu, na última semana. Quando o ícone do msn começou a piscar, vi um amigo comemorando as indicações do Autoramas para nada menos que cinco categorias no VMB 2005, a grande premiação do videoclipe nacional. Um feito e tanto para uma banda independente, que não paga jabá para aparecer na mídia. A vibração do amigo salseiro se justificava, só que eu, por não conseguir ver a MTV, jamais tinha visto o clipe de “Você Sabe”, o tal indicado, mesmo sabendo que a música é, realmente, um petardo excepcional. Me sentindo “out of scene” (né, Laura?) fui me colocar a par dos indicados. (Até o Gram já tem DVD).

Desisti de chegar a uma conclusão e fazer comentários. Ou, por outra, vale realçar alguma coisa, sim. Por exemplo, na categoria “melhor clipe independente”, há quatro dos melhores artistas do meio: Wander Wildner, Autoramas, Astronautas e Rock Rocket (este uma grande barbada, já que são “queridinhos da casa”). Na “revelação”, outro bom apanhado: F.UR.T.O., Leela, Black Alien e Nervoso. Já clipes como “A Maldição do Samba” (Marcelo D2) e “Semana Que Vem” (Pitty), que saíram de discos lançados há mais de dois anos, nem deveriam estar entre os indicados. E ver Ira! e Pitty indicados por “Eu Quero Sempre Mais” na categoria “melhor performance ao vivo” chega a ser ridículo. Sou do tempo que performance ao vivo era muito mais do que um violão, um banquinho e uma canção. Daqui há pouco vão premiar João Gilberto na categoria “carisma”. Isso sem falar no Nando Reis revivendo o pior do Titãs, e concorrendo a “melhor clipe pop”. O clipe deve ser muito bom mesmo, porque a música… O cantor… (E pensar que na sexta e sábado a MTV enlatou o Barão Vermelho num de seus “ao vivo”, graças às baixas vendagens do último disco da banda, que apesar de muito bom, foi um encalhe).

Mas falava da MTV. Não da premiação, que, honra seja feita, sempre causa certa polêmica. Se a memória não me falha, a emissora se instalou no Brasil em 1990, e deu um baile não só de agilidade e imagens na concorrência (as vinhetas da Globo pareciam coisa do século retrasado), mas de programação e, também, informação e conhecimento musical. De cara, dizimou os programas de clipes que as TVs convencionais apresentavam, que tiveram que se adaptar a um novo padrão. Era uma época em que, no Brasil, não havia Internet (como há hoje), nem tanta pirataria, e o jabá não era tão escancarado. Ou seja, as rádios mostravam os novos artistas. Pois a MTV pôs pra trás tudo isso e passou de ser a ponta de lança dos lançamentos internacionais por aqui. Muita gente viu, primeiro, determinado artista na TV, ao invés de ouvir no rádio, como acontecia até então. Particularmente no Rio, com o fim da Fluminense FM, em setembro de 1994, a MTV foi o que restou, uma espécie de salvação da lavoura. Era, também, uma emissora de rock e música pop, o que significa ter produtores e apresentadores “do ramo”, que tinham um razoável (caso da maioria) ou mesmo profundo (gente como Fábio Massari, Gastão Moreira e Zeca Camargo) conhecimento de causa. Não que fosse uma maravilha a MTV nessa época. Mas, olhando de longe, e em vista do que hoje se apresenta, pode até parecer que era. (Ouçam As I Lay Dying antes que a banda estoure).

Corta para 2005. Quem liga a MTV hoje, se depara não com um canal de música, mas de variedades. E repito. A MTV é, hoje, um canal de programas de auditório, não de música. Para conseguir assistir um videoclipe na emissora o telespectador tem que passar por uma verdadeira via crucis, e aturar competições entre fãs, bandas cover tocando ao vivo (!?), reality shows de gosto questionável com artistas idem, programas importados com personagens cuja realidade (o reality) nada tem a ver com a nossa, e assim por diante. Do final dos anos 90 pra cá, a emissora abriu espaço para o pior do pior da música brasileira, representado pelo jabá reinante que consagrou o sambrega e a bunda music. Mas isso não foi o bastante, era preciso bombardear a qualidade de toda a programação, talvez para atingir um público maior, e conseqüentemente idiotizado pela própria grade. Daí a contratação de apresentadores que, vamos e venhamos, são um verdadeiro desastre. É chato partir aqui para o pessoal, mas como não fazê-lo, se é aí que está boa parte do problema? Por exemplo, alguém consegue passar 10 segundos vendo a Sara (e outras bonitinhas) em ação? E o que Daniela Cicarelli, com inteligência de molusco e voz de Pato Donald faz ali? E, cúmulo dos absurdos, o que faz na emissora o tal de Rafa, que não consegue articular uma frase sequer, mesmo lendo tudo no teleprompter? É ou não é um absurdo? E nem queria dizer que o jornalismo da emissora praticamente faliu, confinado a um jornal diário de meia hora, que vai ao ar, pasmem, à meia noite, onde se salva, que se registre nos autos, Edgard Piccoli. (Massacration apresentando programa de metal é sacanagem)

Como lá nos States aconteceu decadência semelhante e os ianques criaram a MTV2, só para a exibição de vídeos musicais, corre o boato de que aqui logo o mesmo acontecerá. O que se espera é que a emissora planeje realmente uma programação de qualidade, mais voltada para a boa música e para a informação, e menos para as fórmulas de se fazer televisão comumente utilizadas no Brasil. Eu não queria falar. Mas falei.

Até a próxima, e long live rock’n’roll!!!

Tags desse texto:

Comentário

Seja o primeiro a comentar!

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado