Rock é Rock Mesmo

O rei da voz

Ronnie James Dio, com completos 55 anos, cantou por cravadas duas horas seguidas, sem economizar nos tons mais altos ou se furtar de soltar a voz por um minuto sequer. Um verdadeiro cantor de rock. Publicado originalmemnte no Dynamite o line.

Meus amigos, não é de hoje que eu venho dizendo. Lemmy é Deus. Ozzy é Pai. Bruce é o irmão mais velho. E Dio, portanto, é o padrasto. Mas o que eu vi na última sexta-feira sugere que uma revisão genealógica seja feita. Senão, vejamos.

Não é de hoje que grandes grupos do passado vêm tocar no Brasil. Considerados pejorativamente como dinossauros, os precursores do rock de hoje em dia arrebatam multidões a cada nova apresentação. Muitos até reclamam, mas se fôssemos fazer uma lista de todos que já estiveram por estas plagas, a rigor seria até mais fácil citar os que nunca vieram. Mas, à guisa da memória, prefiro a primeira lista: Page & Plant, Yes, Van Halen, Deep Purple, Black Sabbath, Kiss, Rush, Roger Waters, etc. Todas às vezes que essas bandas tocam por aqui (muitas já vieram mais de uma vez) nota-se, por parte da mídia especializada, atenção especial a alguns detalhes em suas respectivas coberturas: a) se a banda em questão possui músicas novas “tão boas” quantos aos clássicos; b) se os eventuais músicos substitutos em relação à formação original dão conta do recado; c) se o vocalista continua segurando a onda, com boa voz, etc; e d) se o repertório privilegia as músicas novas (caso existam) ou as antigas.

Essa não foi a primeira vez que Dio veio ao Brasil. Esteve uma vez como vocalista do Black Sabbath, na turnê do álbum “Dehumanizer”, outra participando da turnê do Deep Purple com orquestra, e com sua própria banda por duas outras vezes. Na primeira, numa turnê conjunta com Bruce Dickinson, que ainda se aventurava como artista solo, e Scorpions. O que é legal, mas decerto reduziu o set list do show. Na segunda vez, então, foi a primeira em que Dio pode fazer um show inteiro com sua própria banda para o público brasileiro. Era a turnê do razoável álbum “Magica”, e a banda de Dio tinha como atrações o baixista Jimmy Bain, que fora do Rainbow, e o baterista Simon Wright, ex-AC/DC. Essa galera (como diria o veterano locutor da Globo) fez um show até interessante, porém curto e com muitas músicas de “Magica”, o que não chegou a empolgar.

Dessa vez, por outro lado, Dio radicalizou. Para não dizer que ele não tocou nenhuma música nova, em todo o show de sexta rolou uma única representante do novo trabalho dele: a pesada “The Eyes”. Da banda que esteve na última turnê que passou pelo Brasil apenas Wright ainda estava lá, e a atração foi o veteraníssimo (e excelente, diga-se de passagem) baixista Rudy Sarzo, com um irreconhecível semblante rejuvenescido. Sarzo já toucou com Quiet Riot, Black Sabbath e Whitesnake, só para citar alguns nomes.

Mas o que chamou a atenção deste velho homem de imprensa foi um set list praticamente todo composto de clássicos das bandas pelas quais o baixinho passou: Black Sabbath (a segunda foi “The Sign Of The Southern Cross”, e o encerramento teve “Neon Nights”), Rainbow (as geniais “Long Live Rock’n'Roll” e “Man On The Silver Mountain”) e de sua própria carreira solo, com as não menos marcantes “Holy Diver” e “Rainbow In The Dark”. Não, meus amigos, isto aqui não é uma resenha de show. Acalmem-se, por favor.

Não, não é verdade. O que chamou a atenção deste colunista pra valer, foi o público. Sim, meus amigos, aquele combalido e criticado público do Rio de Janeiro estava em estado de graça. Antes, do lado de fora do shopping que abriga o Claro Hall, onde o show aconteceu, encontrei três produtores e batalhadores do heavy metal no Rio de Janeiro. Vilela, Paulo e Folena reclamavam do parco público heavy metal carioca, e apostavam que pouca gente estaria no show. Lá dentro, já no meio do set, pude constatar que, se não lotava a casa (que é realmente muito grande), o público não fazia feio. Entretanto, não foi a quantidade que chamou a atenção, mas sim a presença de uma garotada que ainda era bebê quando boa parte daquelas músicas, cantadas em uníssono, foi composta. Como eles tomaram conhecimento delas? Como viraram fãs de uma cara que tem idade para ser pai deles?

Minto, mais uma vez, meus caros. O que chamou a atenção deste locutor que vos fala foi a forma como Ronnie James Dio, com completos 55 anos de idade, cantou por cravadas duas horas seguidas, sem economizar nos tons mais altos ou se furtar de soltar a voz por um minuto sequer. Eu disse duas horas. Quem, querido leitor, novo ou velho, faz um show, hoje, com essa duração? Bom, o Living Colour fez, recentemente. Algum outro exemplo? São raros, ainda mais se consideramos os nossos queridos vocalistas de mais de meia idade. Com todo o respeito que o assunto merece, hoje Ian Gillan (o inventor e maior agudo do mundo), David Coverdale (o Mr. Feeling), Robert Plant (aposentado?), Ozzy (o eterno Pai), Geddy Lee (o voz de bruxa) e o esotérico Jon Anderson não chegam nem perto de Dio. O baixinho, hoje, é um autêntico cantor de rock (como diria Sérgio Vid), o verdadeiro Rei da Voz.

Não, meus amigos, o título que foi colocado lá em cima não é uma referência à afamada loja de eletrodomésticos que se tornou clássica no passado, muito antes do mala das Casas Bahia perguntar o quanto você quer pagar. Mas, sim, tenta mostrar o mérito muitas vezes subestimado de Ronnie James Dio, que, honra seja feita, têm defendido arduamente, e à sombra dos holofotes, rock’n'roll ao longo de sua carreira. Long Live Dio!

Até a próxima, e long live rock’n'roll!!!

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