Rock é Rock Mesmo

Prêmio Dynamite é retrato da fértil cena carioca

Os resultados do Prêmio Dynamite mostram que sem ter bons lugares para shows, programas de rádio ou TV, boas revistas especializadas e um grande selo independente, o Rio tem as melhores bandas do País. Publicado originalmente no Dynamite on line

Meus amigos, como é doce o sabor da vitória. E como é amargo o gosto da derrota. Uma vitória, o mais reles dos triunfos, deve ser saboreado lentamente a cada garfada. Já a derrota, o fracasso, costuma descer à força, engasgada, como erva de Santa Maria batida no liquidificador.

Explico. Na última quarta-feira, durante a entrega do Prêmio Dynamite, eu e todos os que lá estiveram viram a confirmação do óbvio. Das oito categorias principais, as que premiam as bandas, três troféus vieram para no Rio: melhor álbum punk/hardcore (Carbona), pop (Hill Valleys) e rap/hip hop/black music (BNegão). O prêmio Revelação, também foi arrebatado, e pela segunda vez consecutiva, por uma banda carioca, o Ramirez. E vamos evitar falar da baianinha Pitty, que teve sua carreira moldada na Cidade Maravilhosa e venceu na categoria álbum de rock, deixando em segundo o também carioca Autoramas. Sejamos francos, é ou não é uma vitória e tanto? Um autêntico “sapeca iá iá, diria Paulo César Vasconcelos.”

De outro lado, nas chamadas categorias “técnicas” ou “periféricas”, o Rio levou uma lavada. Na categoria melhor selo, o valoroso Midsummer Madness, único indicado, ficou com parcos 5,41%. Na categoria casa de shows alternativos, nem se somássemos os votos atribuídos à Casa da Matriz e ao Garage, chegaríamos perto do tricampeão Hangar 110, que teve mais de 31% dos votos. Em evento, nosso Ruído Festival amargou um modesto sexto lugar, e em melhor revista, a soma dos votos dos quatro indicados do Rio não chegam perto da Zero, a vencedora ela segunda vez consecutiva. Em programa de TV e em rádio, nem vale à pena citar o fiasco.

Se utilizarmos os resultados do Prêmio Dynamite como se fossem os de uma pesquisa, mesmo considerando que nenhum método científico foi utilizado, já que ela é uma votação via Internet, chegaremos a uma conclusão curta e grossa: mesmo sem ter bons lugares para shows, programas de rádio ou TV que apóiem as bandas novas, revistas especializadas e um grande selo independente, o Rio tem as melhores bandas do País.

Ao olhar para o resultado do prêmio desse ano calmamente, não pude deixar de lembrar de uma coluna que escrevi há uns dois meses. Aquele texto, inspirado numa troca de e-mails com Gabriel Thomaz, vocalista/guitarrista do Autoramas e um dos produtores do Ruído Festival, defendia exatamente o que o resultado do Prêmio veio demonstrar na semana passada. Aquela coluna (intitulada “O Grande Celeiro de Bandas do Rock Nacional”) dizia que as dificuldades encontradas pelas bandas cariocas as faziam tocar cada vez mais fora do Estado, o que de certo modo fortalecia a própria cena carioca. Mais, lá este colunista citava uma pá de bandas díspares entre si, mostrando a grande diversidade presente na cidade descoberta por Estácio de Sá. Entre elas, estavam Ramirez, Carbona e Hill Valleys, vencedores desse ano, e Leela, revelação do ano passado. Aliás, não é sintomático que, com tantas bandas novas pelo Brasil, o Rio tenha vencido por dois anos consecutivos nesta categoria? É curioso, mas, meio sem querer, aquele texto já anunciava o que seria o resultado do Prêmio Dynamite desse ano. Não que eu tenha perguntado ao Maluco da Praça, que teria profeticamente me antecipado os resultados, mas é que, tanto aquele texto, como os resultados do Prêmio, são o retrato do que acontece atualmente no rock independente carioca.

Lembro-me que, na ocasião em que aquela coluna foi publicada, repito, há cerca de dois meses, fui taxado por alguns colegas de “bairrista”, e até recebi alguns e-mails (fato raro para uma coluna pensante) reclamando mais ou menos com a mesma argumentação. Na época, retruquei que eu, morando no Rio e freqüentando aquilo que chamam de “cena”, só poderia mesmo retratar com precisão o que acontece aqui. E que, apesar de saber da existência de excelentes bandas em outros estados (Acústicos e Valvulados (RS), Forgotten Boys (SP), The Honkers (BA), Os Pedrero (ES), Faichecleres (PR), Valv (MG), MQN (GO) e Bugs (RN), só para citar algumas), não teria como destrinchar a tal “cena” de cada um deles, a menos que passasse sucessivas temporadas viajando. Ou seja, é natural que um jornalista enxergue o que se passa a seu redor, e que retrate isso em seu trabalho. O que não pode acontecer é a negação dos fatos.

Não consegui convencer os reclamantes, mas o resultados do Prêmio vieram depor a meu favor. Sim, porque concorreram bandas de todo o País, a votação também foi em nível nacional, e ultrapassou a barreira dos 66 mil votos, o que, de certa forma, dá a credibilidade ao que já havia sido descrito, aqui mesmo, antes. A lição que fica é a que nem sempre um texto relatando as virtudes de sua própria cidade deve ser considerado como uma atitude bairrista. Às vezes, pode ser o retrato dos fatos, ou, com sorte, a antecipação daquilo que está prestes a acontecer.

Por isso, meus amigos, me reservo no direito sagrado de degustar o prato da vitória, predileto daqueles que não se viram de costas para a realidade, que não manipulam fatos, mas escrevem somente aquele óbvio que só os basbaques se recusam a ver. Par estes, o destino reserva o amargo sabor da derrota.

Até a próxima, e long live rock’n'roll!!!

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