Rock é Rock Mesmo

Toda banda tem seu limite; o rock, jamais

Nenhum grupo de rock consegue manter o mesmo padrão de qualidade durante todo o tempo, todos eles têm seus limites. O rock, entretanto, tem vocação para a vanguarda e jamais cai em decadência. Publicado originalmente no Dynamite on line.

Todo fã de rock já deve ter ficado intrigado com uma dúvida como essa: como pode uma banda lançar um, dois, três álbuns tão bons e em seguida gravar verdadeiros fiascos, com músicas ruins e pouco inspiradas? Parece que não, mas esse fato é tão comum que é fácil encontrar depoimentos do tipo “gosto do Metallica antigo” , ou “do Iron Maiden fase Paul D’ianno” , ou ainda “do U2 antes do ‘Pop’” . Por que será que as bandas, de uma forma geral, oscilam tanto, e fazem, num determinado período de sua existência, discos tão bons, e, numa outra fase, trabalhos tão ruins?

Várias teses já foram levantadas sobre o tema, sobretudo em portas de show e mesas de bar. Uns defendem que o principal defeito das bandas de rock é continuar existindo, ou, depois que acabam, voltar à ativa. Outros associam a queda de qualidade ao avançar da idade dos integrantes, e alguns apontam o sucesso como o destruidor da criatividade que a banda detinha.

Eu também não poderia ficar de fora, até porque já sei há muito tempo qual é a razão disso tudo. Cada banda, sentencio, tem o seu limite criativo. Um ponto em que todos os músicos já se esgotaram enquanto grupo, e a partir do qual a tal química que tanto é citada nas entrevistas deixa de existir. Desse ponto em diante, a banda começa a fazer trabalhos ruins ou termina. Alguns dos integrantes, entretanto, podem até partir para outros trabalhos e conseguir grande sucesso. Vejam o caso do Sting, por exemplo, deixou o Police para ser um grande popstar, e fazer um trabalho de qualidade, pelo menos até atingir seu próprio limite. Eric Clapton então, nem se fala, foi sempre criativo em todas as bandas pelas quais passou e também, até um certo ponto, em sua carreira solo.

Entretanto, antes de entrar em exemplos práticos e didáticos, há uma questão: o que faz um disco ser considerado bom e atingir o sucesso? Óbvio que em primeiro lugar vem a qualidade musical do trabalho, a capacidade que as músicas têm de cativar o ouvinte. Mas isso, além de subjetivo, é muito efêmero, já que depende da época, do tipo de público ao qual a música é direcionada, da mídia envolvida, que tem o poder de formar opinião, e, sobretudo, de quem ouve. Por exemplo, que qualidade musical tem o primeiro disco do Sex Pistols? Nenhuma. Mas dentro do contexto político e social no qual foi lançado, é considerado até hoje (e assino embaixo) um dos mais importantes da história do rock.

Nenhum ser humano continua sendo para sempre a mesma pessoa. Todos querem sempre se renovar, melhorar, evoluir. E assim desejam que o mundo seja, inclusive o mundo do rock . Assim, ninguém quer que uma banda se repita. Pense num álbum clássico de sua banda preferida. Se ela lançasse vários álbuns iguais àquele você iria gostar? Claro que não. Se o Smiths, por exemplo, lançasse vários discos iguais ao “The Queen is Dead” seria taxado de repetitivo e perderia o crédito, certo? Claro que existem versões mais radicais desse modo de agir, sobretudo na imprensa musical britânica (e parte da brasileira) que estão sempre à cata da coisa novíssima, porque a nova já estaria velha. Pois os músicos também se cansam de suas próprias músicas. É comum ouvir comentários do tipo “não agüentávamos mais tocar essa música todas as noites” , ao final de uma turnê. Eles também têm essa necessidade de mudança e de renovação, é uma coisa intrínseca ao ser humano. Agora, o porque de eles não conseguirem manter o nível para sempre, é o que vou explicar agora, através de exemplos.

Toda banda tem, repito, o seu limite criativo. O Iron Maiden, por exemplo. Depois de estabilizada a formação com as entradas de Bruce Dickinson e do batera Nico McBrian, a banda desandou a fazer excelentes álbuns, numa seqüência matadora, desde 1982, com “The Number Of The Beast”, até 1988, com “Seventh Son Of a Seventh Son”. Mas, aos poucos, o som do grupo foi tendendo para o rock progressivo, com músicas mais longas e extremamente técnicas, atingindo o limite no “Seventh Son…”. Tanto que depois o grande guitarrista Adrian Smith pulou fora, a banda tentou se reinventar, e jamais foi a mesma, vivendo de altos e baixos, ainda mais com a saída de Bruce. Esse foi o limite para a banda. Daí o retorno com o álbum “Brave New World”, em 2000, com a formação dessa época (acrescida de um dispensável Janick Gears) ter sido tão espetacular e rara. O disco está certamente entre os melhores da banda, fato raro em se tratando de um “retorno”.

Outro exemplo? O Metallica. Formado por músicos extremamente técnicos, o grupo lançou três álbuns matadores, até chegar ao vinil duplo “…And Justice For All”, um disco com músicas longas e, algumas, muito chatas, dado o exagero técnico extraído durante as gravações. Era o limite da banda, que a partir daí teve que se reinventar, e jamais foi a mesma. Mais um, só para fugir do metal: o Police. Era sabido entre qualquer um ligado no mundo da música pop que mais cedo ou mais tarde o trio pós-punk que reinventou o reggae na música pop e foi um dos precursores da new wave iria se desfazer. Afinal, as brigas entre eles chegavam literalmente às vias de fato. Mas o término da banda só aconteceu depois do álbum “Synchronicity”, de 1983, em clássico até hoje. Era o limite do grupo. A partir daí Sting foi tocar jazz e virou um popstar, Stewart Copeland passou a produzir discos, e Andy Summers voltou, agora rico, a fazer seus discos experimentais.

É difícil escapar desse limite dentro do rock, e poucas bandas conseguem. Uma delas, o Black Sabbath, é o exemplo mais raro. Com a formação original, o grupo lançou nada menos que seis álbuns impecáveis, todos perfeitos. Nenhuma outra banda jamais atingiu tal marca. E depois desse limite, o grupo passou a viver de altos (alguns muito bons, com Dio) e baixos. Não é a toa que o Black Sabbath inventou o heavy metal e mudou definitivamente a cara do rock.

Mas a grande contradição esta aí. As bandas têm seus limites, começam, ascendem, entram em decadência, e acabam. O rock, embora seja formado por essas bandas, jamais segue a mesma trilha. Para felicidade geral da juventude, o rock tem vocação para a vanguarda, e, como um todo, está sempre novo, se renovando e se repartindo em tendências mil, e uma delas sempre vai estar viva na mídia e no nosso cotidiano. Ainda bem, né?

Até a próxima, e long live rock’n'roll!!!

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